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No rádio, músicas que pediam ajuda de Deus. Nos rostos, lágrimas que não paravam de cair. Crianças tiveram que ser carregadas no colo. A água não parava de entrar pelas casas e moradores carregavam os móveis e roupas para lugares altos. Esse foi o dia dos moradores de bairros da região metropolitana. Uma noite que deveria ser de descanso tornou-se tormento na vida de muitas pessoas. A chuva que devastou o Rio de Janeiro e região metropolitana chegou à Bahia. A cidade mais atingida foi Lauro de Freitas. Ruas inteiras ficaram cobertas de água barrenta e lixo, impedindo que carros e pedestres circulassem pelo local. A av. Luiz Tarquinho e o bairro Chafariz foram os locais mais castigados. “Eu moro aqui há sete anos. Toda vez que chove é a mesma coisa”, reclamou Ângela Maria. Quem tentou fugir do trânsito da Estrada do Coco para pegar uma via alternativa, passou por momentos difíceis. Em vários pontos da estrada, o rio Ipitanga transbordou e criou uma grande piscina pelos locais onde os carros passam. Agentes de trânsito tentaram controlar o fluxo de carros, sem sucesso. Próximo as faculdades Unibahia e Unime era impossível passar. Pedestres se arriscaram e passaram andando pela água, mas os carros tiveram que ser rebocados. Apenas caminhões e ônibus conseguiam passar pelo local. No meio de muita chuva e transtornos, a prefeita do município Moema Gramacho apareceu com dois seguranças para tirar fotos das ruas e casas alagadas. Quando questionada sobre as obras prometidas em sua candidatura, ela disse: “Nossa cidade está em estado de alerta. Não existe nada que possa segurar essa quantidade de água. Veja o Rio de Janeiro”. Quando avistou alguns moradores, a prefeita dirigiu-se até o local e, muito nervosa, pediu desculpas pelos transtornos, alegando mais uma vez que obra nenhuma seguraria essa quantidade de chuva. “Os moradores devem sair das áreas de risco e procurar informações sobre a bolsa aluguel o mais rápido possível”, avisou Moema. No meio das águas da Luiz Tarquinho, uma estofaria e outras lojas foram invadidas pela chuva. Os donos estavam na porta desesperados com o material que estava sendo desperdiçado. “Aqui não tem rede de esgoto ou boca de lobo. Nossa mercadoria está toda ali misturada com a água. Só tem um rio nesta rua e ele não dá vazão para a quantidade de águas. Nunca vimos uma obra aqui, a prefeita só promete e não cumpre”, ressaltou Ângela Maria, dona da estofaria.
Chafariz Outro lugar muito atingido pelas águas foi o bairro Chafariz, também conhecido como “Bostolândia”. “Toda vez que chove isso aqui alaga. A prefeita veio aqui na época de eleição pedir voto e fez várias promessas. Ela disse que ia fazer obras em 2007, estamos em 2010 e nada. Até agora temos um esgoto aberto”, disse Josinete de Sena, moradora ha 15 anos do local. A água do esgoto se misturou com a chuva, era possível encontrar fezes boiando dentro das casas. “Eu não dormi, na última madrugada. Fui trabalhar cedo e me ligaram desesperados dizendo que minha casa estava sendo inundada. Fiquei preocupada com meus cinco filhos. Pelo visto, esta noite será de desespero”, ressaltou Raquel Santos, 29 anos. Em todas as casas os móveis estavam em cima dos tijolos e a marca da enchente chegava ao meio da parede. Alguns moradores tiveram que jogar seus eletrodomésticos fora. Colchões boiavam no fundo das casas. A maior preocupação de todos era com a chuva que ainda estava por vir. “Não sabemos como será a chuva desta noite, não vamos conseguir dormir. Vamos torcer para que as cobras que ficam no lago aqui perto não saiam junto com a água, como aconteceu há alguns anos”, dizia Valquíria Santos, 34 anos, quase chorando. No meio de muita lama e água, as crianças brincavam com lixo e areia. Como o local fica em um vale, todo o lixo da parte mais alta desce e se acumula na porta das casas. Muitas vezes, o peso destes objetos prejudica a estrutura das casas, como é o caso de dona Maria Lúcia, 40 anos. Segundo ela, a Defesa Civil esteve em sua residência e condenou o imóvel. “Eles pediram para sairmos daqui, mas vou para onde? Minha geladeira, que paguei em várias parcelas, está dentro da água, estou perdendo tudo” São muitos dramas e tristezas vividos pelos moradores da comunidade, muitos deles com filhos pequenos que não têm para onde ir, ficam sofrendo sem uma solução. “Aqui não tem ninguém para recolher o lixo, temos que levar para a rua de cima. Muitas vezes essa sujeira volta todinha pelos ralos e pias quando está chovendo. Por isso somos conhecidos como moradores de “Bostolândia”, reclamou Josinete de Sena. “Sempre entra água nas casas, eu tenho um filho pequeno com problemas respiratórios. Tive que levá-lo para a casa de amigos”, comentou Antônia Cláudia, 34 anos.