Um desembargador do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 18ª Região, em Goiânia, criticou, na frente de diversas pessoas, as roupas que uma advogada usava durante uma audiência e disse que se recusaria a ouvir a sustentação oral dela.
Em um vídeo que circula pela internet, o desembargador Eugênio Cesário aparece afirmando que a advogada "tem que estar à altura na forma e na aparência com o exercício dessa atividade". Ao final da gravação, ele afirma: "A senhora vem fazer uma sustentação oral de camiseta?" e "Se for para fazer, eu saio".
A controvérsia, que ocorreu nesta quarta, só terminou quando um advogado emprestou seu terno para a profissional, que usava vestido com ombros à mostra.
Em um comunicado, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) repudiou a atitude do desembargador. Já o TRT da 18ª Região, também por meio de nota, lamentou o ocorrido, que classificou como "incidente isolado".
De acordo com o advogado Lucas Jabur, de 28 anos, que gravou a cena e enviou as imagens ao EXTRA, a mulher só conseguiu fazer a sustentação oral perante os magistrados depois de vestir o paletó emprestado.
— Mas isso ocorreu depois que ela ouviu muitas coisas do doutor Eugênio. Ela saiu chorando da tribuna. Os advogados ficaram bem exaltados e ficaram a favor dela, mas não tinham muito o que fazer por estarem diante de autoridades — contou Lucas, ressaltando que o desembargador não podia ter agido daquela forma.
Ainda segundo a nota, o TRT acredita na "manutenção das boas relações mantidas com a nobre classe dos advogados ao longo dos seus quase 27 anos de existência, sempre pautadas pelo mútuo respeito às prerrogativas próprias do exercício das relevantes funções igualmente indispensáveis à administração da justiça".
No vídeo, o desembargador aparece criticando enfaticamente a roupa da advogada, que fica de pé na tribuna, apenas ouvindo. "Podem discordar, mas nós temos um decoro forense a cumprir. Tem que estar à altura na forma e na aparência com o exercício dessa atividade e a senhora vem fazer sustentação oral de camiseta?", reclama ele.
Pouco depois, Cesário pergunta a opinião dos demais. É quando a desembargadora Iara Teixeira Rios argumenta que a advogada não estava de camiseta, mas, sim, de vestido. "Se o doutor Eugênio se recusa a participar, eu acho que nós podemos adiar", diz ela.
A OAB salientou, por meio das comissões da Mulher Advogada (CMA), Especial de Valorização da Mulher (CEVM) e Especial da Voluntária Advogada (CEVA), que "o repúdio se estende ao tom autoritário proferido pelo magistrado, sobretudo diante de uma jovem advogada mulher". "Os tribunais de Justiça também não são ambiente para comportamentos antidemocráticos como os do referido desembargador", acrescentou o comunicado.
— Ela estava muito bem vestida. O máximo que aparecia era o ombro, não existia má adequação. O próprio estatuto diz que o advogado deve se portar adequadamente. O problema é que ela só não estava usando um terno (feminino). E não é a primeira fez que acontece isso — disse o advogado que gravou o episódio.
Leia o comunicado completo do TRT da 18ª Região:
"Quanto ao ocorrido com a advogada na 2ª Turma de Julgamento, o Tribunal Regional do Trabalho da 18a. Região lamenta e entende ser um incidente isolado, acreditando na manutenção das boas relações mantidas com a nobre classe dos advogados ao longo dos seus quase 27 anos de existência, sempre pautadas pelo mútuo respeito às prerrogativas próprias do exercício das relevantes funções igualmente indispensáveis à administração da justiça".
Confira abaixo, na íntegra, a nota de repúdio da OAB (assinada por Samara Carvalho e Silva, presidente em exercício da CMA; Kátia Paiva, presidente da CEVM; e Eliane Simonini, presidente da CEVA):
"As comissões da Mulher Advogada (CMA), Especial de Valorização da Mulher (CEVM) e Especial da Voluntária Advogada (CEVA) da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção de Goiás tomaram conhecimento, pelas mídias sociais, onde circulam vídeo e relatos de presentes aos fatos, que uma advogada foi severamente agravada por um magistrado do colegiado do Tribunal Regional do Trabalho da 18a Região, na tarde desta quinta-feira (17), em razão da vestimenta que usava, e também impedida de subir à Tribuna, para cumprir seu dever profissional.
A CMA repudia o preconceito estampado na fala do desembargador Eugênio Cesário que, inclusive, ameaçou sair do recinto se a advogada daquele modo permanecesse.
Salientamos que o repúdio se estende ao tom autoritário proferido pelo magistrado, sobretudo diante de uma jovem advogada mulher, visto que os tribunais de Justiça também não são ambiente para comportamentos antidemocráticos como os do referido desembargador.
A Constituição Federal já tem quase 30 anos e nela está previsto tanto o direito de acesso ao judiciário, como a necessidade da advocacia para a defesa do jurisdicionado. De modo que o preconceito não é condizente com o dever do Poder Judiciário pela prestação jurisdicional.
Impedir a advogada de cobrir os braços com a beca e de fazer voz da Tribuna fere direitos jusfundamentais, prerrogativas funcionais da advocacia e a competência da Ordem dos Advogados do Brasil para disciplinar questões de vestimenta em espaço forense, como já advertiu o Conselho Nacional de Justiça.
A CMA afirma ainda que está requerendo providências à Direção da OAB-GO no sentido de apurar os fatos e tomar medidas por justiça e coação de novas afrontas às advogadas goianas".
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Redação iBahia
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