A Justiça do Trabalho afirmou que existe vínculo empregatício entre um motorista e a Uber, em decisão da 33ª Vara do Trabalho, em Belo Horizonte (MG), nesta segunda-feira (13). Com isso, a empresa teria que pagar benefícios trabalhistas como férias, 13º salário e horas-extras, entre outros. A decisão é retroativa, ou seja, a Uber teria que arcar com esses valores referentes ao período em que o trabalhador esteve ligado a ela.
O autor da ação é o motorista Leonardo Silva Ferreira, 39 anos, que trabalhou na Uber de fevereiro de 2015 até dezembro do mesmo ano, quando foi desligado. Ele ganhava entre R$ 4 mil a R$ 7 mil por mês. Ele entrou na Justiça porque, como a Uber não o reconhecia como empregado, não recebia os benefícios da CLT.
Ferreira foi taxista por 10 anos e trabalhou ainda como motorista executivo antes de passar para a Uber. Atualmente ele trabalha em um concorrente da empresa, o Cabify, que atua em algumas capitais do Brasil - ainda não está disponível em Salvador. A Uber informou em nota que vai recorrer da decisão e que um juiz da 37ª Vara do Trabalho da mesma cidade determinou "exatamente o oposto" em janeiro deste ano. "Já existe precedente judicial que confirma o fato de que não há relação de subordinação da Uber sobre seus parceiros", diz o texto.
Benefícios
Pela decisão, a Uber terá que pagar horas extras, adicional noturno, recolher FGTS, pagar férias e 13º salário proporcionais, aviso prédio, feriados trabalhados e outras multas previstas em lei. O juiz Márcio Toledo Gonçalves diz em sua decisão que a "uberização" se trata de uma "tentativa de autonomização dos contratos de trabalho e na utilização de inovações disruptivas nas formas de produção". Para ele, esse é "um fenômeno que descreve a emergência de um novo padrão de organização do trabalho a partir dos avanços da tecnologia", com "potencial de se generalizar para todos os setores da atividade econômica".
Para ele, a relação entre Ferreira e Uber tem os requisitos para definir um vínculo de trabalho, segundo a lei brasileira: relação entre empresa e pessoa física; pessoalidade (já que só o motorista pode dirigir); onerosidade (a empresa faz a remuneração); não eventualidade ou habitualidade (não há prestação de serviço apenas às vezes); subordinação (cabe aos motoristas seguirem as regras da Uber). A Uber argumentou em sua defesa que é uma empresa que explora uma plataforma tecnológica que faz a intermediação entre usuários do app e motoristas "independentes". Veja como o juiz rebateu argumentos da Uber sobre as características do vínculo empregatício:
1) Pessoalidade
Para a Uber: Não há pessoalidade, já que os usuários podem ser atendidos por qualquer motorista da plataforma.
Para o juiz: "Não se pode confundir a pessoalidade marcante da relação motorista-Uber com a impessoalidade da relação usuário-motorista. Assim, da mesma forma que, na maioria das vezes, não podemos escolher qual cozinheiro irá preparar nosso prato em um restaurante ou qual vendedor ira nos atender em uma loja de sapatos, não é dado ao usuário do aplicativo indicar qual motorista o transportará".
2) Onerosidade
Para a Uber: Segundo a empresa, não houve nenhum tipo de remuneração da sua parte para o motorista - pelo contrário, ele quem pagou para usar a intermediação do aplicativo.
Para o juiz: "Os demonstrativos de pagamento jungidos aos autos pelo demandante revelam que os pagamentos realizados pelos usuários são feitos para a ré, que retira o seu percentual e retém o restante, repassando-o aos motoristas somente ao final de cada semana. Isso demonstra que a reclamada não apenas faz a intermediação dos negócios entre passageiros e condutores, mas, ao contrário, recebe por cada serviço realizado e, posteriormente, paga o trabalhador".
3) Não eventualidade
Para a Uber: Não há dias ou horários obrigatórios para os motoristas, ressalta a empresa. O condutor trabalha quando e se quiser. A não-eventualidade também só poderia ser aplicado a colaboradores com função relacionada com a atividade-fim da empresa. Não seria o caso da Uber, já que ela é se caracteriza como uma empresa de tecnologia e Ferreira é motorista.
Para o juiz: "Se fosse apenas uma empresa de tecnologia não fariam sentido os robustos investimentos em carros autônomos que têm sido realizados pela companhia, como notoriamente tem divulgado os veículos de comunicação (... ) Por qualquer ângulo que se analise a matéria, é inconteste a estreita correspondência entre o labor do reclamante (função de motorista) com as atividades normais da reclamada (serviços de transporte), sendo certo, por conseguinte, deduzir a não eventualidade da prestação dos serviços”.
4) Subordinação
Para a Uber: Os motoristas têm independência para usar o aplicativo quando e onde quiserem, escolher os horários em que trabalham e prestar os serviços como quiserem.
Para o juiz: "O fornecimento de ‘balinhas’, água, o jeito de se vestir ou de se portar, apesar de não serem formalmente obrigatórios, afiguram-se essenciais para que o trabalhador consiga boas avaliações e, permaneça ‘parceiro’ da reclamada, com autorização de acesso a plataforma (...) O autor estava submisso a ordens sobre o modo de desenvolver a prestação dos serviços e a controles contínuos. Além disso, estava sujeito à aplicação de sanções disciplinares caso incidisse em comportamentos que a ré julgasse inadequados ou praticasse infrações das regras por ela estipuladas".
Leia a íntegra da nota da Uber
A Uber vai recorrer da decisão da 33ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, já que 37ª Vara do Trabalho da mesma cidade, no dia 31 de janeiro de 2017, determinou exatamente o oposto - ausência de vínculo empregatício entre a Uber e um de seus motoristas parceiros. Já existe precedente judicial que confirma o fato de que não há relação de subordinação da Uber sobre seus parceiros.
Os pontos levados em consideração são a atividade da Uber como empresa de tecnologia, a liberdade para que o motorista parceiro escolha suas horas online, sem qualquer imposição por parte da Uber, a liberdade para não aceitar e cancelar viagens e a relação não-exclusiva entre o motorista parceiro e a Uber, que permite que os mesmos prestem o serviço de transporte individual de passageiros também por meio de outras plataformas.
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Redação iBahia
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