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Entrevista: Fabrício Boliveira fala sobre Faroeste Caboclo

Ator baiano conta ainda sobre como foi trabalhar com Isis Valverde e Marcos Paulo e reflete sobre a discriminação racial

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28/05/2013 às 17:35 • Atualizada em 02/09/2022 às 7:02 - há XX semanas
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Fabrício Boliveira falou sobre Faroeste Caboclo e contou novidades
Depois de sete anos morando no Rio de Janeiro, Fabrício Boliveira já tem o gingado carioca e o sotaque - puxando o 's' - o denuncia. Mas o baiano não nega sua formação. A base que teve de teatro foi toda em Salvador, na Universidade Federal da Bahia, que acabou interrompida por conta da sua primeira novela: Sinhá Moça, em 2006. De lá para cá, Fabrício chega ao seu primeiro protagonista no cinema: João de Santo Cristo, no filme 'Faroeste Caboclo', que estreia na quarta-feira (29) nos cinemas brasileiros. Veja também: Com estreia adiantada, Faroeste Caboclo leva amor e sangue para os cinemas Em entrevista ao iBahia, Fabrício falou sobre a gravação do filme, contou como foi trabalhar com Isis Valverde, que viveu Maria Lúcia, e o ator e diretor Marcos Paulo, que faz uma pequena participação no filme, como o senador, pai de Maria Lúcia. Fabrício também refletiu sobre ser ator e levantou algumas questões que fez a partir do filme, principalmente sobre a discriminação racial. "Eu brinco que essa história tem um pouco da história de Édipo. Pro João é revelado que ele (sendo) pobre, negro e nordestino, deve morar naquela miséria sem água nenhuma. Ele foge do destino e parece que o destino dele vai buscá-lo em algum lugar. E eu posso chamar esse destino de sociedade", disse Fabrício sobre seu personagem. Os novos projetos do ator incluem teatro e outros dois filmes, também diretamente relacionados à música. Fabrício vai integrar o elenco do filme sobre Planet Hemp e outro sobre Milton Nascimento. Confira a entrevista completa: iBahia - Qual a relação que você tem com a música Faroeste Caboclo, de Renato Russo? Fabrício Boliveira - Com 15 anos de idade, que é o período onde a gente tem acesso a esse grito do Renato Russo, e que ele serve de válvula de escape para todos os anseios e desejos da adolescência. Eu tinha uma namorada que cantava muito Legião, andava toda de preto e maquiagem. Eu tinha 15 e ela tinha 20. Era uma história que poderia parecer mais Eduardo e Mônica (risos). Ela cantava muito a música do Faroeste Caboclo e eu sempre pedia pra ela cantar o momento da volta da Maria Lúcia com a Winchester (a arma), porque eu achava que era de uma emoção e um momento de reviravolta dentro da história. Eu ficava muito sensibilizado. Conheci a música através dessa menina que chama Mirela daqui de Salvador e que me abriu esse universo do Renato. Hoje eu sou fã, gosto muito das letras. Acho que é nosso grande poeta brasileiro contemporâneo. Tive acesso há uns dois dias aos escritos originais da música e eu estou em um instante de muita emoção. A gente vê dentro daquela cabecinha de 17 anos, escrevendo uma letra tão profunda. Eu até brinco que o João é um alter-ego do Renato Russo, que é um trovador solitário, que desce sozinho tentando levar seus ideais.
Fabrício como João de Santo Cristo, em Faroeste Caboclo
iBahia - Vocês chegaram a morar durante o período de preparação em Brasília, não é? Como foi viver naquele cenário?FB - A gente chegou 15 dias antes de filmar e ficamos quase três meses morando em Brasília. Foi maravilhoso. Tudo que a gente estava estudando começou a virar concreto. A coisa do tédio e do vazio de Brasília, das construções de Brasília, da exclusão de Brasília, da beleza do céu de Brasília, das pessoas que dentro disso tudo se afinam muito. Eu era muito querido e cuidado pelas pessoas. Era um trabalho quase antropológico, de você adentrar uma nova cultura e entender e falar dela. O Juliano (filho do Renato Russo) foi a base pra mim. Foi o cara que foi me apresentando tudo, quem seria esse João, quem seria esse Jeremias. Então eu acho que eu pude adentrar um pouco da cultura brasiliense. iBahia - Como foi trabalhar com Isis Valverde? FB - Isis eu já conhecia pessoalmente, a gente trabalhou na mesma novela, Sinhá Moça, mas não contracenamos juntos na época. Foi ótimo. Eu já conhecia o trabalho dela e virou uma parceira. Ela é um atriz intuitiva como eu nunca vi na vida. Ela age às vezes sem saber porque ela tá fazendo aquilo e leva a cena para outro lugar. E você pergunta: 'bicho, como ela conseguiu isso?' e nem ela sabe. Foi um prazerzaço trabalhar com ela. iBahia - E o ator e diretor Marcos Paulo, que faleceu em novembro de 2012, também fez uma participação importante no filme. Você teve maior contato com ele? FB - Eu não tinha contato nenhum com o Marcos Paulo, só tive diretamente em uma cena. Foi um cara super querido. A gente construiu aquela cena e conversamos muito ali, naquele instante. Então fiquei muito feliz de ver um ator e diretor com o tempo que ele tinha de trabalho se abrindo para discutir com um cara que ele nunca tinha visto. Acho que provavelmente ele não conhecia meu trabalho. Foi super bonito o encontro com ele. Era um cara admirável. Ele descobriu durante o processo do filme que estava com câncer e não falou para ninguém. Depois a gente descobriu e ele disse: 'quero continuar a fazer o meu trabalho'. No fim ele venceu o câncer, mas morreu por outra doença. Foi maravilhoso ver essa luta e a importância que a arte tem para uma pessoa. Foi bom experienciar isso de perto.
Fabrício na novela Sinha Moça, de 2006
iBahia - É impressão ou dá para notar um pouco do personagem Django (do filme Django Livre) no João de Santo Cristo? FB - O Django foi feito depois que a gente já tinha filmado o 'Faroeste Caboclo' e estreou antes. Eu acho que dialoga total com o Faroeste não só por ter um protagonista negro, mas de entender a situação do negro. Aquela cena do Django com a roupa azul, cheia de babados, e as pessoas questionando: 'quem é esse cara que está em cima do cavalo?' Isso é um pouco do que eu vivo hoje. Eu sempre sou questionado sobre o que eu faço da vida. No Rio de Janeiro eu sou parado em todas as blitz e todos os policiais me perguntam: 'o que você faz da vida, negão?' Então é igual a história do Django. É uma história que a gente ainda não conseguiu mudar no Brasil. iBahia - Sobre os novos projetos, você vai continuar entre o cinema e a música com os filmes sobre Planet Hemp e um sobre Milton Nascimento, não é? Como é essa parceria entre música e cinema? FB - Acho que música adentra diretamente ao sentimento, né? Na história tem a leitura, o visual, mas a música acho que entra em um lugar onde a audição está menos viciada, ou talvez menos crítica, então acho que adentra ao sentimento. E construir uma história já sabendo que as pessoas já estão tocadas por conta da música ou por conta daquele cantor, é maravilhoso. Eu sou um ator que gosta de trabalhar com histórias sensíveis. Se a sensibilidade já está garantida, há espaço para mim para trazer outras questões. Eu acho que trabalhar com música pode ser por aí. iBahia - Ainda sobre os próximos trabalhos, você estava cotado para o elenco sobre o filme da banda Calypso. Você vai participar do filme? FB - Eu não estou nesse elenco do filme do Calypso. É porque eu sou muito amigo do diretor, que é o Caco Souza, já trabalhei com ele no filme '400 contra 1'. Então como ele ia dirigir o filme, ele disse: 'você vai fazer, você vai fazer!'. Aí o Caco me convidou primeiramente para fazer o filme, mas não falou em personagem. E eu tinha visto um show do Calypso lá em Recife e eu mandei uma mensagem para ele: 'quero fazer a Joelma' (risos). Ele disse: 'Você não pode fazer a Joelma!'. Só que aí não rolou e ele já ia rodar agora em janeiro e eu já estava comprometido com outras coisas. Acho que eu e o Caco temos outras histórias. Ele tem um roteiro maravilhoso que é da Gabriela Leite, sobre aquele movimento das putas do Rio de Janeiro, esqueci o nome...
Fabrício Boliveira ao lado da atriz Érika Januza na série de TV da Globo Subúrbia
iBahia - É o Daspu? FB - Perfeito! É a fundadora do Daspu, chama Gabriela Leite e ela tem um roteiro de um filme. E o Caco é que vai ser o diretor esse filme. Então a minha história com o Caco deve voltar aí. É que tem questão né? Tem lugar pra gente movimentar e abrir possibilidades de novas opiniões e deixar o trabalho mais complexo. Quem tá assistindo tem que se colocar dentro da história, usar a razão, se questionar, e ao mesmo tempo se distanciar. Sinto muita falta dos filmes do Glauber Rocha por conta disso. Porque tem a nossa vibe brasileira, tem a nossa coisa tropical, mas ao mesmo tempo abre muitas questões políticas, principalmente as políticas pessoais, sobre escolhas, por exemplo. iBahia - E novela está nos próximos planos? FB - Novela por enquanto não. Tô esperando um bom convite, mas o cinema tem me abraçado muito. Tô me sentindo muito confortável com a possibilidade de fazer cinema. O Subúrbia (a série de TV) foi um trabalho muito interessante pra mim, que foi lindo e eu pude me colocar muito como ator. Luiz Fernando (Carvalho) criou um cenário enorme e falou: 'brinquem!' E a gente brincou e curtiu tudo. Mas por enquanto só cinema e teatro.

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