Ronaldo reforçou o estoque de cerveja no freezer do seu bar. Triunfo do Bahia no domingo, certeza de mais movimento nas suas mesas a partir do fim da tarde de segunda. "Esse Tressor Moreno é qualidade. Vai ser o craque do Baiano. Só falta arranjar o parceiro certo para o Gladiador lá na frente" - Robertinho chegou com sede para resenha. Com 19 anos, tem o otimismo dos jovens, mesmo que tivesse só 9 no último título tricolor. "Se prepara aí, Naldinho, que você vai ter que trocar o nome do bar porque estou sentindo que o Baêa vai longe na Copa do Brasil".
O bar Duas Estrelas ganhou o nome 20 anos atrás, exatamente quando Ronaldo, o filho, substitui Ronaldo, o pai, como titular atrás do balcão. Foi o próprio velho que sugeriu trocar de Campeão para Duas Estrelas. O pai era radicalmente tricolor. Nas paredes, era uma fila de ladrilhos brancos, outra vermelha, outra branca, outra azul. Tinha emoldurado um pôster dos campeões de 1959 - mandou fazer um colorido dos campeões de 1988. Foi o presente para o filho quando passar a administração do bar. O velho ensinou: "Nosso bar é para o torcedor do Baêa. Torcedor do outro nem precisa vir aqui. O nosso pessoal basta pra lotar o lugar", disse, na época, Naldão, que, agora com mais de 80 anos, quase não ia ao bar, mas ainda frequentava as arquibancadas de Pituaçu.
Foi Jadson, o científico, que baixou a bola de Robertinho. "Rapaz, tá muito cedo para falar de título. A melhor defesa do Baiano é do Bahia de Feira, o melhor ataque do Atlético de Alagoinhas. Os dois estão no grupo do Baêa. E ainda tem o Conquista que fez o mesmo número de pontos que nós". O bancário Jadson tinha sempre os números na ponta da língua. Mas Robertinho, motoboy, não estava vendo sabedoria nos números.
"O Baêa engrenou: vai atropelar e ser campeão do grupo. Quer apostar?". Jadson abriu um sorrisão e deu um gole na cerveja. Não apostava contra seu time. E estava deliciado com uma ideia. "A gente vai ficar atrás do xará de Feira e vai eliminar o Vitorinha na semifinal. Para eles não serem vice de novo" - falou alto para o bar inteiro ouvir.
O professor se animou. "Esse roteiro é show. A gente faz esse leão virar gatinho lá dentro do Barradão. Está na hora de cortar essa juba. Eles já caíram para a segunda; só está faltando perder a pose no Baiano", disse o veterano, já aposentado, mas com a confiança dos jovens. "O time ainda está precisando de um zagueirão de categoria, tipo Roberto Rebouças, e um atacante para botar Souza ou Robert na cara do gol. Eles são artilheiros e o menino Rafael é muito menino", argumentou o professor. Naldinho pegou logo mais duas cervejas para a mesa de três. Sabia que vinha polêmica por aí e a resenha ia longe. E é para isso que servem os bares.
Oscar Valporto é editor executivo e escreve às terças-feiras no
Correio* - coluna publicada na versão impressa do Jornal do dia 15 de março de 2011
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