Os chineses devem dar dor de cabeça este ano ao governo brasileiro. Desde 11 de dezembro, a China tem o direito de ser reconhecida pelos membros da Organização Mundial do Comércio (OMC) como economia de mercado. Mas empresas brasileiras de diferentes setores ainda se consideram prejudicadas pelos preços baixos dos produtos chineses e pressionam o governo do presidente Michel Temer a não conceder tal condição ao país asiático.
Os especialistas em relações internacionais, contudo, avaliam que o governo chinês deverá exigir do Brasil esse reconhecimento — seja por seu poder de investimentos ou pelo fato de ser o maior parceiro comercial do país.
Sem regras trabalhistas
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) é contra o reconhecimento imediato da China, alegando que subsídios mantêm os preços dos produtos chineses ainda artificialmente baixos (dumping).
"Entramos numa zona cinzenta. O país não pode ser considerado uma economia de mercado, já que há forte ingerência do Estado na produção, tem câmbio controlado e as relações de trabalho não seguem as regras da Organização Internacional do Trabalho (OIT)", defende Carlos Eduardo Abijaoadi, diretor de Desenvolvimento Industrial da CNI.
Entre as 156 medidas antidumping atualmente em vigor no Brasil, a China é alvo de 52, um terço do total. Em seguida, vêm os EUA, com 14, e a Coreia do Sul, com dez.
"A China é o maior produtor mundial de calçados e, certamente, ainda não pode ser considerada uma economia de mercado. Pedimos na OMC a revisão de nossa medida antidumping, em março de 2016, e ela foi mantida até 2021. Isso mostra que a prática de dumping continua existindo", diz Heitor Klein, presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), lembrando que, depois de seis meses da entrada em vigor da medida antidumping contra os chineses, em 2010, o setor calçadista reabriu 44 mil vagas de trabalho que haviam sido fechadas por causa da concorrência desleal.
O setor têxtil tem três medidas antidumping contra os produtos chineses em vigor. Fernando Pimentel, diretor da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e Confecção (Abit), observa que as empresas estatais ainda têm peso grande na economia e o governo dita a política de preços. Ele conta que, no caso do algodão, a China tem o maior estoque do planeta: "O governo usa esse estoque e joga o preço do produto lá embaixo quando há interesse. É uma decisão de política interna. Como a China produz de tudo no setor têxtil, pode nos prejudicar em todos os elos da cadeia".
A China entrou na OMC em 2001, aceitando posição de desvantagem em julgamentos sobre prática de dumping. Em 11 de dezembro, expirou o prazo para o país adaptar-se às regras de concorrência, adquirindo o direito ao reconhecimento como economia de mercado.
Calçado, aço e têxtil sofrem
Para os especialistas, o fato de, já em 12 de dezembro, a China ter apresentado queixa na OMC contra os EUA e a União Europeia, exigindo o reconhecimento, mostra que o país vai pressionar os principais atores do comércio mundial a aceitá-lo como um de seus pares.
"O governo brasileiro não terá como não reconhecer, já que a China é o nosso maior parceiro comercial. Brasília pode esperar o posicionamento de outras nações, mas vai ter que fazer o reconhecimento", diz Larissa Wachholz, sócia diretora da Vallya, consultoria especializada em China.
O comércio entre Brasil e China expandiu-se 540% nos últimos dez anos, de US$ 12 bilhões em 2005 para US$ 78 bilhões em 2014. Para Wachholz, a China não está 100% adaptada e, por um bom tempo, produtos chineses como calçados, aço e têxteis terão vantagem competitiva.
Em 2004, por decisão política do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o Brasil reconheceu a China como economia de mercado — a medida não teve, porém, a chancela da Câmara de Comércio Exterior (Camex) e não foi validada.
"Foi uma decisão diplomática errada. O governo Lula esperava um fluxo bilionário de investimento direto da China no Brasil, naquela época, que acabou não acontecendo", diz José Luiz Niemeyer, especialista do Ibmec/RJ.
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Redação iBahia
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