Ler histórias para crianças é uma prática consagrada. Mas, em geral, as pessoas não fazem isso com bebês. Especialista em primeira infância, psicóloga e consultora da Rede Primeiros Passos, Denise Mazzuchelli diz que os pais devem começar a ler para os filhos ainda enquanto eles estiverem no útero, se possível.
Quando os pais devem começar a ler para os filhos? Qual a faixa etária adequada?
Desde quando ainda estão útero. É interessante estimular os pais a conversarem e lerem para crianças desde a gestação. Há estudos que relacionam o primeiro contato da criança com os fonemas ainda no útero materno.
Qual a importância dessa prática?
A leitura em voz alta para bebês amplia o vocabulário receptivo da criança, ou seja, mesmo que ela ainda não fale, vai entender. Antes de falar “mamãe", a criança sabe o que é “mamãe”. O vocabulário é a base do pensamento: quanto maior ele for, mais complexos serão os pensamentos que a criança será capaz de elaborar. Essa prática é um preditor de desenvolvimento em leitura aos 10 anos. O vocabulário da primeiríssima infância faz diferença para toda a vida. Além disso, a criança passa a associar a leitura com uma experiência prazerosa. A leitura em voz alta cria uma bagagem para a criança no sentido de vivenciar experiências que não estão em seu ambiente imediato.
Pode dar um exemplo?
A criança nunca vai ver um hipopótamo no Centro do Rio, mas, por meio do livro, pode ter contato com esse animal. Assim como ela não vai ver neve no Brasil, mas pode ver em uma história e pensar sobre isso. A leitura para bebês também semeia o desejo de aprender a ler. Uma criança que constrói momentos de prazer e conexão com os pais na primeira infância vai ficar sedenta para desvendar aqueles códigos por si mesma.
Há técnicas específicas para ler para bebês?
Uma criança até os 4 meses de idade tem uma mobilidade ainda limitada, mas já consegue ouvir e enxergar, ainda que não de forma tão apurada. É possível deixá-la deitada e ler uma história, há livros com apenas uma imagem em cada folha, em preto e branco para que ela comece a distinguir figuras. Aos 6 meses, é interessante que o cuidador dê a ela a oportunidade de virar a página, há livros com páginas grossas para crianças que ainda não conseguem fazer movimento de pinça. Um bebê de 8 ou 9 meses vai impor mais dificuldades na hora da leitura, vai querer pegar o livro, jogá-lo, então é difícil fazer uma leitura do início ao fim, mas a dica é persistir. A partir dos 12 meses, eles já interagem muito mais. Se for um livro que traz ruídos de animais, vão conseguir imitar. Nesse momento é possível fazer uma leitura dialógica, que vai ter um impacto importante.
O que os pais não devem fazer?
É importante que eles não queiram traduzir o livro para a criança. Ler o que está escrito faz muita diferença, porque os livros têm um vocabulário e uma construção diferente do que se ouve no dia a dia. É importante também ter um diálogo com a criança.
Qual a diferença entre bebês que foram estimulados com a leitura por seus pais e os que não foram?
Há diferenças no Q.I, na memória, na capacidade de atenção. Além disso, há grandes diferenças no padrão de comunicação daquela família. Aquelas que fazem leitura tendem a ter uma interação mais suave, fazer menos uso de punição física com os filhos.
No Brasil, existe essa prática de leitura para bebês?
Já avançamos, mas ainda estamos engatinhando. Os livros têm que entrar na pauta de prioridade da primeira infância. Na pré-escola já é muito tarde para fazer uma intervenção. O que acontece antes é determinante no desempenho da criança. É preciso haver excelentes bibliotecas públicas para que as famílias de baixa renda tenham acesso, ainda que muitos desses pais não saibam ler. O contato precoce com a leitura gera um sujeito de ação e não de reação. É alguém que tem iniciativa, que consegue pensar desde muito cedo, que sabe prever o que vai acontecer. Se a criança ler dois livros por semana durante os seis primeiros anos, antes de entrar na escola já vai ter tido contato com 600 livros, o que é muito mais que a maioria dos adultos lê a vida toda.
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Redação iBahia
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