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SALVADOR

Viver em casarões históricos de Salvador é barato, mas arriscado

O valor razoável da moradia atrai cada vez mais gente disposta a correr riscos. Alguns imóveis têm estruturas aparentes, rachaduras que parecem crateras

• 26/06/2011 às 19:37 • Atualizada em 29/08/2022 às 12:45 - há XX semanas

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Imóvel em ruínas na Igreja da Conceição da Praia tenta ser vendido por R$ 450 mil
Em fevereiro, pouco antes do Carnaval, o estudante João*, 25 anos, se mudou de Conceição de Coité, a 210 quilômetros de Salvador, para estudar na capital. Sem muitos recursos, foi seduzido por uma proposta que quase lhe custou a vida. Alugou uma unidade - um espaço com quarto, banheiro e cozinha conjugados - num casarão histórico no Comércio, área declarada de patrimônio artístico e cultural da Bahia. “Achei que estava, de início, fazendo meu melhor negócio. Pensei que seria incrível morar num desses casarões, viver cercado de gente interessante e ainda por cima num patrimônio. Paguei, entreguei os documentos e fui”, conta o estudante. Essas unidades nos casarões têm preços variados. Em áreas como o Dois de Julho ou em alguns edifícios mais conservados - mas que também podem estar condenados - o aluguel chega a R$ 500. As mais baratas encontradas pelo CORREIO ficam na área do Comércio, próximo ao Elevador Lacerda. Por ali, o aluguel de uma apartamento pode custar R$ 250 - justamente o que João pagou. E assim ele virou mais um a viver em risco num dos casarões históricos da cidade. Afinal, de acordo com o último levantamento feito em 2009 pela Defesa Civil de Salvador (Codesal) - órgão responsável por monitorar o estado físico dos imóveis -, 111 casarões estão condenados. “Só entendi o risco que eu estava correndo quando o homem que me alugou o apartamento me disse que eu não poderia ouvir música em volume alto, ou que era melhor nem ligar o rádio, já que o som poderia fazer as paredes trepidarem. Percebi que eu poderia morrer”, explicou o estudante, que agora procura outro lugar para morar. BarrilO valor razoável da moradia atrai cada vez mais gente disposta a correr riscos. Alguns imóveis têm estruturas aparentes, rachaduras que parecem crateras e até inclinações na fachada. “Morei por três meses num edifício no Dois de Julho, na Rua Areal de Baixo. Pagava R$ 450 por mês e saí quando consegui outro lugar. Não morava num patrimônio. Eu ia morrer no patrimônio”, conta a vendedora Maria Lúcia, que morava no local com dois filhos. “Moro aqui há pelo menos dois anos. Rezo todas as noites para que esse casarão não caia. E toda vez que ouço no rádio ou vejo na TV que um casarão caiu, fico em pânico”, diz o catador de lixo Ronaldo ,que mora em um edifício na Rua do Sodré, no Comércio, área tombada pelo Iphan. Os casarões se tornam um meio de vida para quem invade, reforma e aluga. Conseguir um canto nesses edifícios normalmente não exige muitas burocracias. Alguns são alugados para temporadas ou até por uma noite sem exigência de muitos documentos. Pessoas que recebem por alugar esses imóveis fazem poucas exigências. “Aqui é só trazer a carteira de identidade. Só me pediram para não trancar a porta de noite”, contou um homem que aluga quarto na rua Areal de Baixo, no Dois de Julho. VendasSe por um lado alguns não podem pagar aluguel num lugar melhor e aceitam viver em um casarão mesmo sob risco, há quem veja nos imóveis históricos uma forma de transformar ruína em muito dinheiro. Na região do Comércio, por exemplo, há diversos casarões à venda. Ao lado da Igreja da Conceição da Praia, por exemplo, um grande imóvel que aparenta abandono, com janelas quebradas e rachaduras, ostenta na sua fachada histórica uma placa que anuncia a venda: pede-se R$ 450 mil. Há imóveis cujo preço para um negócio definitivo pode chegar a R$ 2 milhões, fora a transferência de documentação e a reforma, que exige um alto investimento. Há outros prédios sendo vendidos na Cidade Baixa e Centro Histórico, como um que fica ao lado do Elevador Lacerda. O edifício inteiro por R$ 800 mil. Mas quer investir num imóvel desse porte pode procurar um dos mais caros casarões que estão sendo vendidos: na rua do Rosário um imóvel sai por R$ 2 milhões. Considerado uma pechincha entre corretores, um terreno na Rua do Sodré está sendo vendido por R$ 130 mil. O espaço, com mais de 136 m², é uma das jóias disponíveis para a compra na região do Comércio, já que não possui prédio erguido e, por isso, claro, não tem fachada a preservar. * Nome fictício Codesal afirma que não pode agirA Defesa Civil de Salvador (Codesal) informou que não possui poder de polícia e que não pode impedir que os imóveis abandonados sejam invadidos ou que as pessoas aluguem unidades habitacionais neles. O órgão informou que só pode notificar e fiscalizar os casarões, indicando se há riscos ou não de desabamentos. A maior parte dos apartamentos que são alugados nos prédios históricos são reformados ou sofrem alguma intervenção promovida por algum invasor, que, em seguida, aluga as unidades. As reformas dificilmente seguem padrões ou orientações técnicas. No Dois de Julho, por exemplo, um conjunto de três casarões tombados teve sua parte interna modificada por um morador, que se mudou para o local e fez a obra mesmo sem autorização. A coordenadora-geral de Bens Imóveis, Érica Diogo, do Departamento do Patrimônio Material e Fiscalização do Iphan e o superintendente do órgão, Carlos Amorim, foram procurados pelo CORREIO para comentar a situação, mas não foram localizados. A assessoria do Iphan disse que Érica estava de férias. Amorim não respondeu aos contatos telefônicos. Imóvel na Soledade desabou e matou travesti no fim do mês de maio A dona do casarão que desabou no fim de maio na área da Soledade não foi localizada pelos órgãos públicos para ser notificada das obras de reparos que precisam ser feitas no imóvel que teve parte da fachada destruída pela ação do tempo e provocou a morte da travesti Driele. A dificuldade de se localizar os donos desses imóveis se faz presente até dentro das instituições governamentais. Dos 111 imóveis condenados pela Codesal, 24 são de propriedade do governo do estado. Desses, 20 são de responsabilidade da Conder, mas o governo não identificou qual órgão é o responsável pelos outros quatro. A situação se agrava quando o assunto são outros 29 casarões que, de acordo com o relatório da Codesal, não tiveram sua inscrição localizada na Secretaria Municipal de Fazenda. Desde o dia 26 de maio, o CORREIO tenta, junto à assessoria de imprensa do órgão identificar os donos desses casarões, mas não obteve resposta da instituição sobre as propriedades. Justiça quer desocupação de imóveisNo dia 15 de junho, o juiz Paulo Pimenta, titular da 16ª Vara Federal na Bahia, concedeu liminar em parte determinando a desocupação e a interdição dos 111 casarões condenados pela Codesal em 2009. A ação civil pública número 0019255-84.2011.4.01.3300 foi proposta pelos ministérios públicos Federal e Estadual e tinha o objetivo de fazer com que os órgãos de administração estadual e municipal, além do Instituto do patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), responsável pelo tombamento em âmbito nacional, além da União, se manifestassem sobre os casarões. Os órgãos têm até julho para apresentar uma defesa sobre a situação dos imóveis.

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