Era para ser apenas mais um dia comum de trabalho, mas a rotina do taxista Hebert Bonfim, 50 anos, mudou após uma tentativa de assalto que terminou em briga com o bandido, facada no braço e acidente grave, na manhã desta sexta (12).
Por volta das 7h, um homem aparentando 35 anos pediu um táxi no Salvador Norte Shopping, em São Cristóvão, e Hebert parou o veículo para atendê-lo. Destino: Nova Brasília. No caminho, o passageiro falou sobre política, os transtornos da cidade e assuntos banais. “Ele estava muito calmo, parecia bastante à vontade” contou o taxista. No trajeto, as coisas mudaram.
“Quando chegamos na Estrada Velha do Aeroporto, ele anunciou o assalto. Ele estava com uma faca e quando gritou ‘Assalto! assalto!’ eu revidei”, contou Hebert. Na luta, o bandido esfaqueou o motorista no braço. Desesperado, o taxista mudou a direção do veículo e jogou o carro no barranco, numa região conhecida como Curva da Morte.
Hebert, que trabalha na cooperativa Use Táxi, conta que, quando lançou o carro na ribanceira, o bandido gritou: “A gente vai morrer!”. Mas o veículo ficou preso no matagal e o assaltante aproveitou a oportunidade para escapar pela janela. Nada foi roubado do Siena, de placa JQU-9371. Essa é a terceira vez que Hebert é assaltado em dez anos de profissão. A corrida de ontem, estimada em R$ 30, quase custou a vida dele.
“Um colega percebeu que tinha algo estranho quando Hebert passou dirigindo o táxi e avisou a central de rádio. A central pediu para que os outros taxistas que estivessem na região seguissem o carro dele. Eu cheguei aqui 10 minutos depois do acidente”, afirmou o taxista Erizan Batista, 46 anos. Ele contou que em cinco anos de trabalho passou por duas tentativas de assalto. Assim como ele, cerca de 20 taxistas se dirigiram ao local para prestar apoio ao colega.
Depois do susto, Hebert foi socorrido por agentes do Samu e levado para o Hospital Eládio Lassérre, em Águas Claras, onde foi medicado e liberado. O corte no braço foi superficial, mas foram precisos oito pontos para fechar o ferimento.
Equipes da 3ª Companhia Independente da Polícia Militar (CIPM/Cajazeiras) foram ao local, mas não localizaram o agressor.
Perigo
A Estrada Velha do Aeroporto, local onde aconteceu a tentativa de assalto, e a estrada do CIA Aeroporto são áreas que costumam ser evitadas pelos taxistas, por conta da falta de iluminação, sinalização e poucas moradias, o que facilita a ação dos bandidos.
Eles apontaram também o Nordeste de Amaralina, a Suburbana, o Calabetão, Castelo Branco e algumas ruas de Itapuã como pontos mais críticos. “Tem locais na periferia da cidade que, tanto de dia quanto de noite, o taxista não entra porque sabe que pode não sair”, afirmou o presidente da Associação Metropolitana dos Taxistas de Salvador, Vandeilson Miguel.
As polícias Civil e Militar, a Secretaria da Segurança Pública da Bahia e a Gerência de Táxi da Transalvador (Getax) disseram que não há estatísticas sobre o número de assaltos cometidos contra taxistas diariamente na capital. No entanto, o presidente da Associação Metropolitana dos Taxistas de Salvador, Vandeilson Miguel, estima que pelo menos 15 motoristas são vítimas de assalto todos os dias na capital baiana.
Ele reconheceu que a falta de estatísticas dificulta as investigações. “Existe uma cultura do taxista em não dar queixa, porque eles acham que não vai resolver. A gente sempre orienta a dar queixa, porque fica a estatística e a polícia sabe o que está acontecendo, chama a atenção, sabe onde estão os meliantes”, explicou Vandeilson Miguel.
O próprio Hebert, assaltado ontem, não prestou queixa. Segundo ele, não resolveria a situação. No mês passado, o taxista Edvaldo Jesus da Silva teve o aparelho com GPS roubado enquanto pedia uma informação para uma corrida nas imediações da Rua Carlos Gomes, no Centro.
Integrante da cooperativa Ligue Táxi, Edvaldo nunca havia sido assaltado desde 1974. Pelo sinal do GPS, ele localizou o aparelho na Rua do Sodré, mas não conseguiu recuperá-lo.
Núcleo especial
Um antigo pleito da categoria é a criação de uma delegacia específica para receber queixas e investigar os ataques a taxistas de Salvador, assim como já existe um núcleo para ônibus — o Grupo Especial de Repressão a Roubos de Coletivos (Gerrc). “Uma das queixas é a demora, eles dizem que perdem muito tempo nas delegacias. Taxista é autônomo. Se ele não trabalha, ele não ganha”, disse Vandeilson.
Segundo a assessoria de imprensa da Polícia Civil, a criação de um núcleo já vem sendo discutida internamente, mas ainda não avançou. A expectativa é que a contratação de profissionais por meio do último concurso público possa agilizar o processo.
O vice-presidente do Sindicato dos Condutores Autônomos de Táxi de Salvador (Sindtáxi), Luiz Santana, lembrou que a profissão deixa os taxistas vulneráveis.
Hoje, há 7 mil táxis em Salvador e 13 mil taxistas. “Ninguém traz na testa escrito se é ladrão. Hoje, eles têm uma nova estratégia: o cara entra no carro desarmado, faz a corrida e quando chega no destino final tem um comparsa armado que faz o assalto”, contou Santana.
Assaltantes e golpistas também costumam andar bem vestidos ou usar mulheres como isca. Em Salvador, além de registros de mulheres que assaltaram taxistas, há um caso de assassinato cometido por uma mulher.
Segundo a categoria, os assaltos e ataques acontecem todos os dias, quando os taxistas têm celulares, dinheiro e relógios roubados, mas os casos só ganham visibilidade quando há morte.
Polícia não tem política específica de segurança para taxistas
A polícia baiana não tem nenhuma política de segurança pública voltada especificamente para os taxistas. Apesar de acontecerem blitze todos os dias em locais diferentes da cidade, a Polícia Militar afirma que as abordagens não são feitas particularmente em táxis.
Mesmo assim, somente este ano, a PM afirma ter abordado 19.356 taxistas entre janeiro e junho — uma média de 106 por dia. As blitze são a maneira utilizada para coibir a ação dos criminosos, mas os taxistas disseram que o método é falho e não oferece segurança.
“Os policiais pedem os documentos dos taxistas, fazem perguntas, mas não revistam os passageiros”, afirmou o taxista Roberto Santos, 41 anos. Ele está na profissão há mais de oito anos e contou que já foi assaltado duas vezes. Há um ano, ele recebeu um tiro depois que três homens roubaram o táxi que dirigia. A bala atingiu de raspão a cabeça do motorista.
Para Vandeilson Miguel, da Associação Metropolitana dos Taxistas de Salvador, as abordagens ajudam a inibir a ação de criminosos. “A categoria é dividida quanto a isso. Tem taxistas que acham que a segurança aumenta. Se ele pega algum passageiro com drogas ou armado, quando a polícia para, é positivo e até inibe. Mas tem outros que acham que atrapalha a viagem e o passageiro”, afirmou.
GPS usado por cooperativas ajudam na localização de veículos
Hoje, os taxistas que trabalham em cooperativas de Salvador circulam com um tipo de GPS nos carros, que ajuda a localizá-los através da central e, em alguns casos, facilita a localização do táxi caso ele seja roubado.
“É um celular com GPS. Na verdade, isso só é bom se levarem o táxi. Se o taxista for assaltado, o GPS não vai adiantar”, disse Vandeilson Miguel, da Associação Metropolitana dos Taxistas de Salvador. O aparelho custa de R$ 300 a R$ 400, mas o taxista também paga uma mensalidade à cooperativa.
Já o vice-presidente do Sinditáxi, Luiz Santana, disse que existe outro aparelho que também está sendo usado. No entanto, ele considera o equipamento caro, em torno de R$ 1 mil, além de uma mensalidade de R$ 80 pagos à empresa que opera o GPS. O aparelho pode ser localizado, mesmo após ser desligado.
Violência contra taxistas
5 de fevereiro, Avenida Bonocô: O taxista Ronaldo Gomes dos Santos, 48 anos, é assassinado por dois homens que estavam em uma moto e abordaram o veículo em frente à Fonte Nova. O passageiro Rosenval Teixeira Marinho, de 48 anos, é baleado;
24 de fevereiro, Itaigara: Um táxi é roubado na Rua Wanderley Pinho por volta das 15h. O taxista é rendido depois de parar o carro ao notar uma colisão entre outros dois veículos. Um dos carros envolvidos no acidente era dirigido por um assaltante, que levou o táxi;
28 de abril, Feira de Santana: Um homem anuncia assalto a um taxista depois de sair da Micareta de Feira de Santana. Ele rouba o dinheiro da vítima e o abandona na BR-324;
20 de maio, Camaçari: O taxista Ademário Alves dos Santos, de 54 anos, é assassinado a tiros em uma praça de Camaçari
30 de maio Feira de Santana Um taxista é morto por passageiro ao final de corrida em Feira de Santana. A corrida já havia sido recusada por outros colegas;
3 de junho Vitória da Conquista Um taxista leva um tiro durante um assalto e morre. Ele chegou a pedir socorro pela central de rádio, mas não deu tempo. Matéria original: Correio 24h Sem política de segurança, taxistas sofrem com violência na capital baiana
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