Fotos: Divulgação
Um ônibus 100% elétrico começa a operar, em fase de testes, na manhã de terça-feira, 3 de dezembro, nas avenidas de Salvador. O veículo, adquirido junto a empresa chinesa BYD (Build Your Dreams), fará a linha Aeroporto-Lapa até o dia 21 do mesmo mês e percorrerá grande parte da orla da capital baiana sob o custo de R$ 2,80 para os usuários, mesmo valor da taxa praticada pelo transporte público municipal.
Com poucas alternativas em mobilidade urbana e um metrô em construção há amargos 16 anos, o principal objetivo da prefeitura de Salvador é demonstrar ao empresariado que o investimento em mobilidade urbana compensa. Segundo o secretário municipal da Cidade Sustentável, Ivanilson Gomes, “essa medida visa oferecer um modelo de transporte para o município com um caráter mais sustentável, com uma energia limpa, boa autonomia, não poluente”.
Além de reduzir a poluição ambiental, o veículo é mais silencioso e confortável para os passageiros, possuindo rampa de acesso e área específica para cadeirante. Com capacidade para 76 passageiros, o ônibus possui uma autonomia de 250 km com um sistema de carregamento simples, de quatro horas, e que pode ser instalado em diversos pontos da cidade, além de sistema de freios que gera energia, quando parado, para os cinco conjuntos de bateria que alimentam o veículo.
Modal
De acordo com um dos grandes entusiastas da iniciativa, o diretor da Rede C-40 (Cidades pelo Clima) em São Paulo, Adalberto Maluf, “os empresários só vão comprar se perceberem durante os testes que a tecnologia se encaixa bem em Salvador”. Maluf coordenou um projeto, em conjunto com o Banco Interamericano, que testou diversos sistemas de transportes nas cidades de Bogotá (Colômbia), Santiago (Chile), São Paulo e Rio de Janeiro, e concluiu que o ônibus elétrico em circulação nos BRTs, (Bus Rapid Transport, ou via de transporte rápida), é a melhor alternativa para a mobilidade das grandes cidades. Leia a entrevista exclusiva que Maluf concedeu ao EcoD.
Especialista em transporte, Adalberto Maluf veio a Salvador fazer a viagem inaugural do ônibus elétrico
Foto: Reprodução/Twitter
EcoD: Os ônibus elétricos são opções mais sustentáveis e o senhor defende que as cidades invistam neles em conjunto com os BRTs, em vez de metrôs ou monotrilhos. Salvador vem de um processo de mais de uma década de construção de um metrô, o senhor acredita que o BRT seria uma boa opção para melhorar a mobilidade urbana da cidade?
Adalberto Maluf: O BRT não é uma boa opção, é a melhor opção. Nós estudamos todos os projetos em andamento nas grandes cidades do mundo e existem poucas cidades que estão investindo em metrô. As grandes cidades do mundo hoje vêm construindo BRT. Primeiro, pelo custo: o BRT custa 10 a 20 vezes menos que o metrô, e ele entrega praticamente a mesma solução de mobilidade – tem capacidade e velocidade muito parecida. Só que ele tem um custo operacional cinco vezes menor do que metrô.
Cidades que precisam entregar soluções grandes e impactantes vêm optando por corredores de ônibus, porque são medidas mais rápidas, eficientes e têm um custo operacional muito menor. O grande problema do BRT era a poluição, porque os ônibus eram movidos a diesel. Agora, com esses novos ônibus elétricos, se consegue fechar um ciclo, daquilo que faltava para transformar o BRT num dos melhores sistemas de mobilidade possíveis nas grandes cidades.
Diversos especialistas afirmam que o melhor sistema de mobilidade urbana é a integração, ou seja, vários modais de transporte em conjunto. Quando o senhor afirma que o BRT é a melhor opção é porque acredita que essa é a única alternativa que deve ser implantada ou as prefeituras devem investir nos modais de acordo com as especificidades de cada cidade?
Não existe solução única para todas as cidades. Certamente, a solução para a mobilidade passa pela integração de vários modais: com a importância das bicicletas, como alimentadoras do sistemas; dos ônibus, como sistema alimentador; dos BRTs, como sistema de média e alta capacidade; assim, como os metrôs. Não estou dizendo que os metrôs não sejam importantes. Em cidades com mais 5 milhões de habitantes, há demandas que ultrapassam a capacidade do BRT. Até 30 mil passageiros hora/sentido dá para levar no BRT. Entre 50 mil e 70 mil, só se consegue levar no metrô. Salvador ainda não tem uma demanda necessária, ao menos nos próximos 10, 20 anos, para levar 70 mil pessoas hora/sentido.
Por exemplo, Salvador é muito parecida com Bogotá: uma cidade montanhosa, com poucas avenidas e estrutura social parecida. E Bogotá, ao invés de fazer de fazer uma linha de metrô, que levaria de 10 a 20 anos e consumiria todo o dinheiro, fez BRTs. Hoje eles estão na linha número cinco e se criou um sistema importante, integrado de corredor. A questão é de custo-benefício.
O metrô nunca vai conseguir ser o modal mais importante de uma cidade. Para se ter ideia, das 63 maiores cidades do mundo, somente cinco cidades tem mais passageiros no metrô do que no ônibus. Londres, com 400 km de metrô e mais 1.100 km de trens metropolitanos, tem o dobro de passageiros nos ônibus. São Paulo também tem mais de 80 km de metrô e 75% dos passageiros estão nos ônibus.
Então, o metrô não seria a melhor solução também em Salvador?
Salvador está há mais de 10 anos investindo em uma linha de metrô que, mesmo se estivesse pronta, ia resolver muito pouco. Ia melhorar a vida de 100, 200 mil pessoas. Enquanto 90% da população ainda continuaria nos ônibus. Salvador pode ficar mais 10 anos esperando uma solução que quando for entregue vai resolver o problema para 10% da população ou quer uma solução que atenda aos anseios da maioria da população? Essa é a pergunta.
Nós, como C-40, ficamos muito entusiasmados com a liderança de Salvador em trazer esses ônibus mais limpos para serem testados no Brasil. Com as manifestações de junho, o tema transporte público entrou muito forte na agenda política. As cidades têm que realmente buscar soluções que possam ser entregues em curto prazo com menor custo operacional.
Os ônibus elétricos, inclusive, custam mais caro que os ônibus a diesel, só que no longo prazo eles tendem a ser muito baratos. Seria muito legal ver outras cidades fora do eixo Rio-São Paulo testar essas soluções para ver se cabem na realidade de suas cidades.
Na última semana de novembro, o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, foi nomeado presidente do C-40 em substituição a Michael Bloomberg, ex-prefeito de Nova York. O senhor acredita que a liderança dele pode trazer a agenda sustentável para outras prefeituras brasileiras, além das já afiliadas (São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba)?
Com certeza. Eu acho que o C-40 ter escolhido a prefeitura do Rio para a presidência demonstra que as grandes cidades do mundo perceberam que nos países emergentes está o grande desafio da urbanização. Porque são as cidades em desenvolvimento que vêm crescendo muito e têm oportunidades de mudar seu padrão de desenvolvimento, além de empregar soluções visando à sustentabilidade e melhoria da qualidade de vidas das pessoas.
Com a presidência do Rio, certamente as cidades brasileiras vão ter a oportunidade de compartilhar dessas experiências internacionais. E Salvador, que manifestou há meses o interesse, provavelmente será a primeira cidade do Brasil a entrar no C-40 em 2014.
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