iBahia > especial 2 de julho
Bicentenário

O que o Hino ao Senhor do Bonfim e o 2 de Julho têm em comum?

Encomendada em 1923, Canção "Glória a Ti" completa 100 anos e cita as batalhas pela Independência

Nathália Amorim • 02/07/2023 às 8:00 • Atualizada em 02/07/2023 às 8:45

Google News siga o iBahia no Google News!

Era 1823, quando o sol nasceu ao 2 Julho com a liberdade do povo brasileiro das tropas de Portugal. A Independência do Brasil na Bahia. A data símbolo da história do estado, que marca a luta do povo baiano pelo país. Cem anos depois, para a mesma data, um novo feito: a encomenda do Hino ao Senhor do Bonfim, que celebra 100 anos em 2023. 

Para muitos, os fatos podem parecer coincidência, mas a Independência e o Hino ao Senhor do Bonfim têm muito em comum. Para o 2 de Julho de 1923, no centenário da data histórica, uma comissão para os festejos de celebração foi montada e, entre os pedidos, estava a canção.

"O Hino do Senhor do Bonfim foi feito em 1923, que é o centenário do 2 de Julho, da nossa Independência. Quando completou 100 anos de 2 Julho, formou-se uma comissão de intelectuais, da elite, que ficou encarregada de construir essa comemoração, preparar os festejos. E, dentre o que eles preparariam, ficou o hino ao Senhor do Bonfim", explica o historiador Murilo Mello (@murilomellohistoria). 

Segundo o professor de história da Bahia, os responsáveis pelo hino que ganhou os corações dos baianos são o poeta Arthur de Salles, compositor da letra, e João Antônio Wanderley, maestro da Polícia Militar da Bahia que criou a melodia. A canção intitulada "Glória a Ti", atrela a religiosidade à vitória do 2 de Julho e, de certa forma, confronta a visão do povo. 

"Esse hino de comemoração aos 100 anos do 2 de Julho faz uma alusão ao Senhor do Bonfim, a Igreja do Senhor Bonfim, como o responsável pela vitória. Ele traz uma conotação religiosa. De certa forma, entrando em confronto com a visão do povo, já que os baianos acolheram como o responsável [da vitória] o Caboclo. A música, o hino do Senhor do Bonfim tem esse caráter religioso e o cívico da vitória sob Portugal.", explica. 

Uma documentação pessoal de Salles sobre o período em que ele compôs a letra, guardada no Arquivo Público de Salvador, revela que ele recebeu o pedido do secretário da capital baiana na época. 

"Estou cheio de compromissos. Avalie que para a procissão do senhor do Bomfin, número obrigado dos programas da festa, que deve ser bello, fui eu o escolhido para fazer o hymno que tem de ser cantado e distribuido pelo povo. Pedido que me foi feito pelo Secretário da fazenda e approvado já esta o hymno pelo sr. Rvm – Arcebispo.", escreveu Salles na carta enviada para o amigo Durval de Moraes, em 1923. 

Murilo Mello conta que o quê ajudou Arthur de Salles na fundamentação histórica do hino foram os escritos de um historiador chamado Titara, da atual Dias D'Ávila. Ele lutou nas batalhas do 2 de Julho e registrou o que viu e viveu em escritos. Essas marcações ficam evidentes nos primeiros versos da canção, que fazem alusão à essas batalhas pela Independência, que aconteceram na Bahia entre 1822 e 1823.

"Glória a Ti, redentor, que há cem anos/ Nossos pais conduziste à vitória/ Pelos mares e campos baianos", dizem os primeiros versos da canção. 

Inicialmente, o hino não teve o apelo popular visto nos dias de hoje, mas cresceu pouco a pouco ao longo dos anos. O estopim ocorreu na década de 60, durante a ditadura militar. O historiador explica que o impulsionamento veio com a Tropicália. 

"O Hino do Senhor do Bonfim, ele não teve o apelo popular nos primeiros anos. Vai levar tempo. [...] Esse hino vai se tornar mais popular na década de 60, em plena ditadura. Caetano e Gil decidem colocá-lo no disco épico do movimento tropicalista, um dos discos mais representativos da música popular brasileira, que é o "Tropicália". Eles tem a coragem e a audácia de colocar esse hino que fala tanto sobre a nossa vitória, sobre a nossa Independência, dentro desse LP. O hino do Senhor do Bonfim", contextualiza o professor. 

Para o padre Edson Menezes, Reitor da Basílica do Senhor do Bonfim, a relação entre o cívico e o religioso sempre existiu e faz parte do que se chama de "religiosidade popular"

"Sempre houve essa relação entre o religioso e o cívico. E, a letra que foi composta pelo grande poeta Arthur de Salles, expressa esse sentimento religioso cívico do povo baiano, e também vai atribuir ao Senhor do Bonfim a vitória do dia 2 de Julho[...] Celebrar 100 anos da composição é valorizar esse sentimento de patriotismo e ao mesmo tempo essa expressão de fé do nosso povo. De modo que, o hino passou a ser cantado em honra ao Senhor do Bonfim", disse ao iBahia

Dois hinos 

Apesar da grande popularidade do hino, conhecido por embalar fiéis durante a caminhada entre a Igreja de Nossa Senhora da Conceição da Praia, no Comércio, e a Colina Sagrada, no Bonfim durante os festejos da Lavagem, a canção não foi a única a ser feita naquele mesmo ano. 

A composição de Arthur de Salles é, na verdade, considerada o hino cívico. Duas versões da canção foram feitas em 1923, sendo a de Pethion de Vilar - pseudônimo do médico baiano Egas Moniz -, encomendada pela Basílica do Bonfim. A canção é cantada apenas dentro da igreja, no espaço da Basílica quando se tem novenas e missas, e onde é considerada como o hino oficial. 

Apesar disso, o professor Murilo Mello ressalta que foi a versão de Salles que se tornou mais significativa, atingindo os baianos com os sentimentos de identidade e pertencimento. 

"Tem duas versões para comemorar o centenário. Tem a versão oficial, que é de Pethion de Vilar, que faz a versão oficial. Mas, a que cai no gosto popular é a de Arthur de Salles [...]  Ele é autor do hino mais famoso da Bahia, talvez o mais significativo de toda a Bahia, o que a gente mais se identifica. Com o sentimento de civismo, de identidade, de pertencimento, esse hino traz tudo isso pra gente.", avalia o historiador. 

E em 2023, assim como é celebrado os 200 anos da Independência do Brasil na Bahia, o Hino ao Senhor do Bonfim também completa 100 anos. Para o professor, a escolha dos baianos pela composição de Salles não foi à toa. 

"O Hino do Bonfim revela uma característica nossa. Por mais que o estado, a oficialidade queira estabelecer determinados princípios e escolhas, é o povo que decide. É o povo que vai escolher o hino de Arthur de Salles. É o povo que vai escolher o Caboclo, por mais que a oficialidade tenha tentado colocar o General Labatut. O ponto máximo é o Caboclo, não é uma figura de Labatut, que é um francês que veio lutar aqui e não tem esse apelo popular. E toda a história da Bahia é pontilhada por isso, e no 2 de Julho tem vários elementos que contribuem com essa tese.", afirma o professor. 

Invisíveis da História 

Apesar da sua importância, Arthur de Salles, assim como João Antônio Wanderley morreram no anonimato para o público de massa, sem sequer colher os frutos da composição histórica. Na época em que compôs a canção, o poeta não recebeu o valor dado na sociedade.

Até hoje, para muitos, o nome de Arthur de Salles e João Antônio Wanderley figuram na vastidão do tempo, sendo reconhecidos apenas por intelectuais e historiadores. 

"Para o público em geral, até hoje eles estão no anonimato. Se a gente fizer uma entrevista sobre o 2 de Julho, de 1000 baianos, de 100 baianos, 99,9% não saberão quem são eles. Então, eu considero que eles ainda estão no anonimato total. Quem sabe, são historiadores, pessoas que trabalham com isso [...] A História é assim, as coisas só ganham valor conforme o tempo vai passando.", destaca Mello. 

Mas, enquanto as figuras de ambos ainda seguem sendo descobertas no tempo, a história está feita, cantada e musicada em uma verdadeira devoção ao Senhor do Bonfim e ao povo baiano. 

TAGS:

2 de Julho athur de salles Hino ao Senhor do Bonfim história hino ao senhor do bonfim Independência independência do brasil na bahia

RELACIONADAS:

Blandina faz armação contra Zefa Leonel em 'No Rancho Fundo'

Resumo de quarta (15)

Blandina faz armação contra Zefa Leonel em 'No Rancho Fundo'

Moradores do Bairro da Paz denunciam falta de água em 4 localidades

Salvador

Moradores do Bairro da Paz denunciam falta de água em 4 localidades

Cristina se revolta com Serena em 'Alma Gêmea'; resumo de quarta (15)

Retorno para mansão

Cristina se revolta com Serena em 'Alma Gêmea'; resumo de quarta (15)

Rodriguinho se diz honrado em ter frase como título do doc de Davi

'Um cara comum da Bahia'

Rodriguinho se diz honrado em ter frase como título do doc de Davi

Bahia é quinto estado com maior número de roubos de carro no Brasil

Segurança pública

Bahia é quinto estado com maior número de roubos de carro no Brasil

Rachid choca ao revelar segredo em 'Renascer': resumo da quarta (15)

Saiba tudo!

Rachid choca ao revelar segredo em 'Renascer': resumo da quarta (15)

MAIS EM ESPECIAL 2 DE JULHO :

Ver mais em Especial 2 de Julho