Não há, no mundo dos esportes coletivos, nenhuma catarse que se aproxime à de um gol. À de um gol no futebol, que fique claro. Parte da explicação é estatística. Uma única partida de basquete pode ter, tranquilamente, mais de cem cestas convertidas. Em um só jogo de vôlei, supera-se com facilidade os 200 pontos disputados. Mesmo no handebol ou no polo aquático, menos populares e mais econômicos em termos de placar, raríssimos são os resultados com menos de dez tentos computados. No futebol, não. É possível vencer por 1 a 0, furando a retranca adversária no último lance, em um misto de explosão individual e de equipe — para não falar da torcida. O gol é a gênese do caos. Pulsante, eruptivo, libertador. Indissolúvel. É dessa anarquia que nasce o inevitável êxtase. Se o gol, como pregava o antigo programa de televisão, é o “grande momento do futebol”, a comemoração subsequente é irmã siamesa do ápice.
Entre a alfinetada no adversário e o recado para a família, passando pelo pique desvairado e meio aleatório pelo gramado, nada supera a liberdade de festejar uma bola na rede. Ali, tudo pode. Ou quase tudo, como souberam Xhaka e Shaqiri na Copa do Mundo da Rússia. As polêmicas mensagens políticas, que renderam multa e advertência da Fifa aos suíços, foram somente duas das 13 celebrações de gol no Mundial que incluíram provocação de algum nível aos rivais. O levantamento feito pelo GLOBO contabilizou todos os 163 tentos, espalhados por 63 jogos, marcados até a disputa pelo terceiro lugar. Em 56 ocasiões, ou praticamente um terço exato das bolas nas redes russas, a festa incluiu somente abraços e cumprimentos efusivos — volta e meia um tanto desconexos — entre os companheiros, sem nenhuma característica mais marcante.
Desconsiderando esse terço, duas comemorações, uma clássica e outra não tanto, dividem a primeira posição do ranking, surgindo em 24 casos cada (14,9% do total). Pouco pode-se acrescentar ao soco no ar parido por Pelé há quase seis décadas, quando o melhor jogador da história do futebol já era campeão mundial aos 18 anos. Depois de marcar, pelo Santos, um gol antológico contra o Juventus de São Paulo, em 2 de agosto de 1959, na Rua Javari, o futuro Rei — porém já mágico — saltou desferindo um gancho ao vento. O alvo do golpe eram as vaias que vinha recebendo das arquibancadas do time da casa. “Um desabafo”, reconheceria Pelé, muito mais tarde. Os apupos viraram palmas, e a imagem, repetida às dezenas com a camisa da seleção brasileira, acabaria imortalizada. Na Rússia, três dos oito gols marcados pelo Brasil precederam o gesto — só os anfitriões e a Bélgica igualaram-se na estatística.
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Redação iBahia
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