Em 20 anos, a renda das mulheres negras cresceu 80%. Em compensação, as desigualdades de gênero e raça continuam. Isto porque as negras ainda recebem abaixo do que ganham os homens e as mulheres brancas. Esses são alguns dos dados em destaque no estudo Retrato das Desigualdades de Gênero e Raça com base em séries históricas de 1995 a 2015 da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A análise apontou ainda que os lares brasileiros são cada vez mais chefiados por mulheres e que elas estão trabalhando bem mais que os homens.
Se em 1995, a renda de uma mulher negra era de apenas R$ 570,3, ao longo do tempo este valor chegou a R$ 1.027,5. Mesmo assim, existe uma diferença bem maior na comparação com o salário de um homem branco, por exemplo. Apesar de ter tido a menor evolução no período de 20 anos, com 11% de aumento, o branco ainda ganha mais que o dobro do que recebia uma mulher negra. Com base na pesquisa, os rendimentos dos homens brancos em 2015 alcançaram o montante de R$ 2.509, 7 - ou seja - 144,25% a mais do que as negras.
“A mulher negra nordestina está em mais desvantagem do que as outras. O país é todo estruturado por desigualdades uma sobre a outra. Existe a questão da herança histórica, exploração do trabalho e não valorização do trabalhador. Tem toda uma questão do contexto econômico também”, explica a especialista em políticas públicas e gestão governamental e uma das autoras do trabalho, Natalia Fontoura.
Carga horária
Além de ganharem menos, a pesquisa identificou também que as mulheres trabalham, em média, 7,5 horas a mais que os homens por semana devido à dupla jornada, que inclui tarefas domésticas e trabalho remunerado.
A diarista Sirlete Santos viveu isso quando trabalhava dois turnos por dia. “Eu era professora e pegava de 7h até 12h, tirava uma hora de almoço e de 13h até 17h”, conta. A carga pesada e o salário desigual em comparação com o de outros funcionários que trabalhavam menos fizeram com que ela, após tentar sem sucesso montar um negócio próprio, se tornasse diarista.
“Às vezes a gente ainda sofre discriminação, mas trabalhando como diarista eu consigo ganhar mais do que o salário mínimo. A maioria das contas em casa sou eu que pago. Pago 80% das despesas. Eu quero mostrar para todas as pessoas que a mulher pode viver sozinha, sem depender de homem”, afirma ela que é também a chefe de família da casa e responsável por todas as tarefas domésticas. “Eu faço as atividades de casa. Hoje, eu sei que isso é uma coisa da minha mãe ter me educado errado, porque ela achava que a mulher tinha que cuidar de tudo e eu levei essa cultura adiante e prefiro fazer sozinha mesmo”, acrescenta.
A taxa de participação das mulheres no mercado de trabalho aumentou muito entre as décadas de 1960 e 1980, mas, nos últimos 20 anos, houve uma estabilização. Segundo Natalia Fontoura, A responsabilidade feminina pelo trabalho de cuidado da casa ainda continua impedindo que muitas mulheres entrem no mercado de trabalho e, ao mesmo tempo, aquelas que entram no mercado continuam respondendo pelas tarefas domésticas. “Isso faz com que tenhamos dupla jornada e sobrecarga de trabalho”, analisa a especialista.
Diferenças
Para a pesquisadora do Núcleo de Estudos Interdisciplinares da Mulher da Universidade Federal da Bahia (Neim/ Ufba) e chefe de departamento do Bacharelado em Gênero, Márcia Macedo, uma desigualdade não atua separada da outra. “Quando as mulheres negras ganham menos que todas as mulheres e todos os homens, a gente vê o racismo e sexismo atuando de forma integrada, o que potencializa o poder de produzir estas desigualdades”, pontua.
Ainda de acordo com ela, mesmo que as mulheres negras estejam atualmente mais escolarizadas que os homens, a integração de sistemas discriminatórios continua a excluir estas mulheres. “Isso é absurdamente preocupante porque causa um diferencial muito grande em termos de privilégios e salários”.
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Redação iBahia
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