A ideia era simular os passos de um passageiro que acabava de chegar na terra de todos os santos. Depois que a porta automática de desembarque se abriu, veio a constatação. Eles estão de volta. Bastaram alguns segundos para a primeira abordagem:
- Quer táxi?
Pelo visto, a fiscalização imposta em meados do ano passado afrouxou. Com uma microcâmera, por volta de 22h de quarta-feira, 1º de fevereiro, foi fácil flagrar o saguão do Aeroporto Internacional Luís Eduardo Magalhães tomado por figuras oferecendo serviço de táxi.
Interpelavam a todo momento quem precisava de transporte. Segundo um levantamento feito pela Infraero ainda em junho, era um total de 70. Agora, no Verão, parecem ser muitos mais. Cooperativas e associações de taxistas contam mais de 100.
O CORREIO negociou viagem diretamente com seis deles, além de um taxista de bandeira comum que atuava no saguão, o que também é considerado ilegal. O trajeto seria do aeroporto até a Barra. Sem saber que estavam sendo filmados, os clandestinos cobraram preços pouco variados, mas bem abaixo do que é cobrado pelas três cooperativas que atuam legalmente.
- Olhe, deixe eu lhe explicar... o táxi da Commtas e Coometas é R$ 107. E o táxi da nossa cooperativa é R$ 80.
- Pra Barra você fala?
- É, pra Barra...
O homem, de gola polo branca com listras azuis e verdes, chega a dizer que faz parte de uma cooperativa. E que no fim da viagem emitiria a mesma nota fiscal dos cooperativados.
- Damos a mesma nota só que o táxi deles é padronizado. Quando chegar lá no carro você vai ver a minha nota...
- Mas você é táxi de rua normal?
- Não, o meu é cooperativa. A gente é Cooper-TT...
O clandestino ainda aponta o grupo do qual faz parte. Próximos a uma pilastra, pelo menos cinco outros motoristas aliciam passageiros.
- É cooperativa. Você pode chegar ali. Não tem problema. Aquele pessoal ali, ó. Todo mundo ali é cooperativa. Aquele de lá é o presidente. Tudo cooperado.
Um outro, que se identificou como Almir e tinha um Voyage branco com placa da cidade de Brejões (JNZ-6767), tentava confundir os passageiros dizendo-se cadastrado no Instituto Brasileiro do Turismo (Embratur). O órgão existe, mas só cadastra motoristas ligados a agências de viagem. Os carros liberados pela Embratur têm placa vermelha e não trabalham como táxi. Transportam passageiros de city tour pré-agendados.
- Precisa de transporte?
- Você tá fazendo quanto daqui para a Barra?
- Para Barra? Vou cobrar
R$ 70...
- Você é táxi de rua, é?
- É transporte mesmo do aeroporto, da Embratur. A gente trabalha com a Embratur. É transporte de turismo. Lá da Coometas é R$ 130,
R$ 140 para a Barra.
Um outro clandestino tem um Fiat Siena e chega a admitir que seu carro é particular e sequer trabalha com recibo.
- Você é táxi comum, é?
- Não, é particular... Mas eu trabalho aqui há seis anos... Eu cobro R$ 80 pra você...
- Faz R$ 70?
- Faz... Bora!
- Você tem recibo?
- Tenho não...
No guichê da Coomtas, a funcionária avisa sobre os perigos de entrar em carro clandestino.
- Pra Barra aqui quanto é que vocês tão cobrando?
- R$107,84. Preço tabelado...
- E esse pessoal aí que tá cobrando mais barato?
- Cuidado, viu? É clandestino... Tenha muito cuidado, é muito perigoso.
- Mas eles dizem que são de cooperativa também...
- Lógico, se eles querem levar cliente...
- Mas disse que dá nota e tudo...
- É, pois é... Mas eles podem fazer desses recibos manuais. Mas ali na frente dão o golpe.
- Que golpe?
- Ah, eu não sei. São muitos que o senhor pode encontrar pela frente...
Taxistas comuns também atuam no saguão. A lei manda eles aguardarem passageiros nas filas, do lado de fora. Um deles, apesar de estar interpelando quem desembarcava, criticou os clandestinos.
- Clandestino faz o mesmo trabalho que eu faço, mas sem segurança nenhuma. Porém, somos pais de família...
Desconfiados, os clandestinos começam a olhar feio. Hora de ir embora. Justo no momento em que, segundo o taxista da Coomtas Reginald Cohim, ‘a coisa ia esquentar’. “Depois de meia noite, quando a fiscalização afrouxa, o aeroporto vira terra de ninguém”, diz ele, que lidera o movimento contra os ilegais e até protocolou reclamação no Ministério Público.
interior Uma semana depois, em incursão à tarde, outros três foram flagrados. O primeiro, que se apresentou como Luiz, insistiu que agia legalmente, apesar de circular com carro comum.
- Tenho recibo, CNPJ, tudinho...
Eles garantem portar documentos de todo tipo, mas nada é apresentado. Mesmo sem taxímetro, se dizem proprietários de táxi comum.
- Meu táxi é do aeroporto, com autorização da Bahiatursa e Ministério do Turismo, com recibo da Associação de Táxi, Inscrição Estadual, CNPJ, tudo direitinho.
- Mas é táxi com bandeira, com faixa do lado?
- Não, aí é com taxímetro. O meu é táxi comum...
Até taxistas do interior agem no aeroporto, o que é proibido. Um deles admite que seu táxi é de outro município.
- A gente não pode botar taxímetro.
- E por que?
- É porque a placa da gente não é de Salvador. Só pode botar taxímetro placa de Salvador...
- E sua placa é de onde?
- Muritiba...
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