Já se passaram 14 anos, mas Evaldo Santos, 46 anos, diz se lembrar de ter se sentado numa canga – formação que mistura esmeraldas e rocha – de quase 400 quilos encontrada na propriedade que pertencia ao pai dele, Edvaldo, e a mais dois sócios.
Lá na localidade de Marota, na Serra da Carnaíba, em Pindobaçu, a 390 quilômetros de Salvador, ninguém deu muita atenção para a pedra na época da descoberta. Aquela era a forma bruta da Esmeralda Bahia, avaliada em US$ 400 milhões pela Justiça da Califórnia, onde aguarda a definição de seu destino final. Certo é que para o Brasil ela não volta mais.
Esmeralda Bahia está guardada na sede da polícia de Los Angeles enquanto a Justiça define o destino dela (Foto: AP Photo) |
Ele conta que a área em que a pedra foi encontrada estava arrendada para um investidor que pagou, para o pai dele, 5% de R$ 25 mil. Depois ficou sabendo que a pedra foi vendida em Campo Formoso, cidade vizinha que concentra a comercialização das esmeraldas, por R$ 100 mil e depois disso ninguém teve mais notícias da Esmeralda Bahia até o imbróglio a respeito da propriedade da pedra se tornar conhecido.
Agora, a pedra é o principal assunto de Pindobaçu. Evaldo atende o telefone para conversar com a reportagem e ao saber qual era o assunto ri: “Eu estava aqui na frente do computador analisando essa pedra agora”, antes de contar, talvez pela milésima vez, os nove tubos de esmeraldas incrustados no cacho onde ele diz já ter se sentado um dia.
Segundo ele, a pedra que chegou a ser disputada por oito pessoas, além do governo brasileiro, ficou jogada em um canto por duas semanas antes de aparecer alguém que se interessasse pela mesma. “Colocaram ela para fora (da mina) junto com mais quatro peças. Não aparecia nada verde, então não se deu valor”, diz.
Natural da região e com negócios de família relacionados às esmeraldas, o deputado estadual Adolfo Menezes brinca com o assunto: “Todo mundo na região fala dessa esmeralda ou tem uma história com ela. Um primo meu foi quem vendeu a pedra para um comprador de São Paulo”.
O deputado não recorda o valor da operação, mas diz ter certeza de que os milhões de reais ou dólares atribuídos à esmeralda são excessivos. “Essa pedra adquiriu esse valor por conta do marketing que estão fazendo em torno dela. Se alguém fosse utilizá-la para fazer joias, o preço dificilmente chegaria a R$ 1 milhão”, acredita.
Cidade do garimpo
Pindobaçu já existia quando as primeiras esmeraldas foram descobertas há pouco mais de 50 anos. Era um município que vivia da atividade rural, numa região marcada pela escassez de água. Segundo Adolfo Menezes, a descoberta das esmeraldas “redefiniu” a economia da região. Hoje, diz ele, a vida em Pindobaçu gira em torno da exploração dessas pedras. “A maior parte dos benefícios econômicos vai para Campo Formoso, onde a produção é vendida. Pindobaçu é a cidade do garimpo”, explica.
Segundo o deputado, a história da Esmeralda Bahia, que foi encontrada e foi retirada do Brasil com benefícios mínimos à nação, pode estar se repetindo por conta da falta de controle em relação à produção que existe na região.
“Não existe uma estrutura de fiscalização eficiente para verificar as informações a respeito da quantidade, dos tamanhos e dos valores das pedras encontradas. É tudo muito baseado no que as pessoas declaram”, lamenta Menezes.
Evaldo Santos conta que tudo funciona de maneira extremamente informal na região. “Meus dentes de leite nasceram no garimpo. Já vi de tudo lá. É uma vida muito informal, de grande insegurança. O problema é que o encanto da riqueza fácil seduz”, afirma.
Destino da pedra
Na última semana, a Justiça americana deu prazo de 15 dias para que as partes envolvidas na disputa por uma esmeralda reclamada como patrimônio nacional pelo governo brasileiro apresentem apelação contra a decisão do juiz Michael Johnson, da Suprema Corte de Los Angeles.
O magistrado decidiu que a empresa FM Holdings comprovou ser a dona da pedra, com base no depoimento de três sócios da companhia. Com isso, o juiz abriu caminho para o fim de uma disputa que já dura seis anos e conta com centenas de argumentações.
Caso não haja recurso, a decisão será final. A Esmeralda Bahia está nos Estados Unidos há pelo menos dez anos. Em 2005, ela foi enviada a um geólogo na Califórnia, que a remeteu para Nova Orleans, onde ficou desaparecida por várias semanas devido às inundações provocadas pelo furação Katrina.
Mais da metade de produção na Bahia é informal, reconhece CBPM
O nível de informalidade na produção de pedras e metais preciosos na Bahia é superior a 50% da atividade, estima a Companhia Baiana de Pesquisa Mineral (CBPM). De acordo com o diretor técnico da empresa pública estadual, Rafael Avena Neto, além de Pindobaçu, que se destaca na produção de esmeraldas, a Bahia tem outras cinco cidades que se destacam na produção: Caetité, Jacobina, Senhor do Bonfim, Campo Formoso e Antônio Gonçalves.
“A Bahia é o segundo estado produtor brasileiro, ficando atrás apenas de Minas Gerais”, diz ele. Segundo Avena, o estado oferece incentivos à produção legal, como a redução do Imposto sobre a Circulação de mercadorias e Serviços (ICMS) nas saídas interestaduais de gemas, joias e metais preciosos de 27% para 4%. Quem opera de forma legal costuma se organizar como garimpo ou cooperativas de pequenos produtores.
Atualmente, a estimativa é que existam na Bahia 110 produtores individuais e três cooperativas. “O poder público faz o que é possível, existem ações do governo estadual e federal para legalizar garimpos, mas isso não evita o contrabando”, afirma. Segundo Avena, as remessas ilegais estão entre as principais formas de evasão de divisas.
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