Por quase três dias, a mãe do estudante Abraão Felipe Ramos Marques, 15 anos, procurou o filho em vários hospitais e no Instituto Médico-Legal. A última vez que tinha visto o filho foi minutos antes de cerca de 30 homens chegarem atirando na praça do Pé Preto, localidade do bairro de Portão, Região Metropolitana de Salvador, e matarem três pessoas. Mas o corpo do adolescente estava mais perto do que a mãe imaginava. Ele foi encontrado morto, na manhã de ontem, no quintal de uma casa que fica atrás da praça onde a chacina ocorreu. “Hoje (ontem) é o Dia das Crianças e eu encontro meu filho morto. Meu primeiro filho morreu por nada”, lamentou a mãe do adolescente que não quis se identificar. O corpo do filho, desaparecido desde a noite de domingo quando aconteceu a chacina, só foi encontrado por volta das 6h de ontem, em estado avançado de decomposição. “Percebi o mau cheiro e chamei a polícia para ver. Geralmente eu não vou no quintal. Tomei um susto. Acordar e encontrar o corpo de uma pessoa morta. Achei que fosse um frango morto”, disse o segurança Antonio Santos, 43 anos, dono da casa que fica na travessa Antonio de Souza. “A mãe ficou em pânico quando viu o filho caído no chão”, completou o segurança. Policiais militares da 81ª CIPM chegaram no local por volta das 8h, mas o corpo só foi retirado quatro horas depois, com a chegada da perícia. “Provavelmente ele pulou o muro da casa, já atingido, e caiu no local. Deve ter agonizado até morrer”, disse um PM sem se identificar. O adolescente tinha saído de casa para colocar crédito no celular. Como demorou para retornar, a mãe decidiu ir atrás do filho. “Eu desci com minha filha de 3 anos atrás dele. Ele estava na barraca de lanche, tomando suco de goiaba. Lembro dele me dizer que ia tomar o suco e depois ia para casa”, contou a mãe.
Desespero Antes de voltar pra casa, a mãe do adolescente ainda entrou na casa de uma vizinha e só ouviu o barulho dos disparos. “Ainda tentei sair para buscar ele, mas quando saí não tinha mais nada. Como é que uns homens chegam atirando, matam inocentes e ninguém faz nada? Quem é que vai dar a vida do meu filho de volta? Eles fazem isso porque têm certeza da impunidade”. Fugindo da violência, a família tinha saído da Fazenda Grande do Retiro e há um mês se mudou para o bairro de Portão. “A gente saiu de lá fugindo da violência e em menos de um mês acontece isso. Eu saía para trabalhar e meu filho tomava conta da minha filha. Ele era meu braço direito”. No local, moradores voltaram a reclamar da disputa pelo tráfico da região e da falta de segurança. “A população aqui está vivendo encarcerada. É violência 24 horas. Mas tem muita gente de bem, vivendo no meio de monstros”, reclamou um comerciante que há 10 anos mora no bairro. Eles relembraram ainda dos 40 minutos de terror que viveram na chacina ocorrida no domingo.
Vítimas A estudante de 14 anos Tainara Conceição Santos, a autônoma e vizinha da estudante Jandira dos Santos, 43, e o jovem Natan Lima da Silva, 20, foram atingidos pelos disparos e morreram na localidade do Pé Preto. A mãe de Tainara, a auxiliar de serviços gerais Odevânia Conceição, 34 anos, foi alvejada na perna esquerda, mas foi socorrida para o Hospital Menandro de Farias e liberada. “Em três anos que moro aqui, nunca vi uma cena como aquela. Foram mais de 50 tiros para todos os lados. Na segunda, tinha até gato e cachorro mortos na rua”, relembrou um morador que também não quis se identificar. Moradora: ‘Tinha fuzil e metralhadora’Os relatos dos moradores descrevem minutos de pânico. Quando 30 homens chegaram atirando, a população tentou correr. “Tinha gente com metralhadora e até fuzil”, contou uma moradora que conseguiu escapar e não quis se identificar. O titular da 34ª Delegacia de Polícia, em Portão, Cláudio Meirelles, disse, dois dias após a chacina, que os autores já foram identificados, mas os nomes não foram divulgados para não atrapalhar as investigações. Segundo moradores, os homens que chegaram atirando são traficantes de uma localidade da rua Queira Deus, conhecida como Fonte das Pedras, e disputam o tráfico da região. Um homem apelidado de “Babão” é apontado como o líder do grupo.
Fugindo dos tiros, jovem pulou muro, mas caiu ferido alguns metros depois |
Rua onde ocorreu a chacina no bairro de Portão, em Lauro de Freitas |
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