Carlos Fadigas, presidente da Braskem, a maior petroquímica das Américas, faz apresentação nesta quarta-feira (24) no seminário Agenda Bahia. Antes, o executivo de 41 anos conversou com o diretor de Redação, Sergio Costa, e a editora-executiva do Agenda Bahia, Rachel Vita, sobre inovação - um dos temas do evento -, o momento econômico do Brasil e do mundo e os investimentos na Bahia, o mais recente deles a atração da Basf para a criação do polo acrílico em Camaçari. Fadigas acredita que o Brasil fez seu dever de casa nos últimos 16 anos para equilibrar a economia, mas corre o risco de entregar um mercado pronto para os concorrentes, se não tomar cuidado com sua indústria. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Qual o papel da Bahia para a Braskem em sua estratégia de conquistar a liderança na petroquímica? O polo petroquímico da Bahia é o maior do Brasil e importantíssimo para a Braskem. Um passo importante foi dado semana passada com a definição da Basf para conduzir a implantação do polo acrílico, que vai atrair novas empresas para consumir o produto da Basf (ácido acrílico). O polo é inédito no Brasil, que tem uma importação grande de ácido acrílico (usado na produção de superabsorventes) hoje e passará a produzir na Bahia.
Em que medida o polo acrílico pode influenciar na balança comercial do estado? A Bahia passa a ser exportadora. Um produtor nacional para abastecer diversos estados, principalmente no Sudeste. Mas o ideal é que consiga atrair produtores para avançar e servir cada vez menos o produto básico e cada vez mais o produto acabado.
No primeiro Agenda Bahia, Manoel Carnaúba, vice presidente da Braskem, disse que o estado poderia perder novos investimentos por falta de infraestrutura, entre eles, o polo acrílico. Como anúncio da vinda da Basf, o que mudou? Estou alinhado com os comentários de Manoel. Materialmente, não mudou nada. O Porto de Aratu precisa melhorar bastante. A Braskem é uma grande usuária. Felizmente, isso não foi impeditivo para a vinda da Basf. A gente espera criar, a partir deste fato, um dinamismo que possibilite ao próprio governo obter arrecadação que possibilite esses investimentos. Começamos a inverter esse ciclo. Com o investimento, vem a fase de construção, a movimentação de fornecedores de mão de obra, uma dinâmica que dá condições ao governo para fazer os investimentos no porto, ou buscar o caminho com o governo federal para permitir que os usuários invistam os recursos necessários.
O governador Jaques Wagner, em entrevista ao CORREIO, acenou positivamente na direção de uma abertura dos portos a uma parceria com a iniciativa privada, embora houvesse problemas no modelo. Houve algum avanço nesse sentido? Houve avanço no diálogo, no debate e na discussão, mas ainda não houve um avanço na identificação de um modelo. O tema portos tem esse cruzamento. É preciso alinhar interesses entre a visão do governo federal, a do estado e a das empresas que se dispõem a participar desse processo e dar mais eficiência ao porto. Nesse aspecto, tem ainda uma coexistência a ser encontrada entre as empresas que querem trabalhar como operadores logísticos e as que usam a infraestrutura e estão dispostas a participar, como é o caso da Braskem, mesmo que esta não seja sua atividade fim.
Parceria, então, deve ser o caminho? Acreditamos que sim, mas é complicado encontrar esse modelo que atenda a todos. Apesar de estarmos num governo do PT federal e num governo estadual também do PT, tem a lógica da administração federal, preocupada com a competitividade da infraestrutura brasileira em criar um modelo que sirva para outros portos também. A Bahia, embora pense alinhada, tem como foco principal a melhoria do Porto de Aratu e a criação do Porto Sul. E as empresas operam numa lógica mais econômica.
A nova planta de eteno verde virá para a Bahia? Não está definido. Temos pelo menos uns três projetos que a gente visualiza para a frente. Um deles, de polipropileno verde. Temos desejo de fazer um polo integrado com usina de etanol de PE. E também um outro para a produção de PET. Temos desejo que aconteçam próximo ao nosso polo petroquímico. Vai depender do avanço dos estudos. Mas temos uma simpatia muito grande por trazer um desses projetos para a Bahia.
A Braskem teve resultado recorde no segundo trimestre. Os preços compensaram a redução de vendas. Qual a projeção que o senhor faz para os próximos períodos, levando em conta o cenário econômico mundial? Há duas tendências que se contrapõem: a favorável é a sazonalidade. Todo ano, o terceiro trimestre é o mais forte da petroquímica. É quando se intensifica a produção para atender à demanda de fim de ano. Isso joga a favor do consumo no período. O que joga um pouco contra é exatamente uma perspectiva pouco favorável à concorrência com importados e a própria conjuntura econômica. Começamos o ano com uma projeção de crescimento de 5% do PIB e já se ouve falar em 3,5, ou 3,7, num cenário em que a importação está crescendo. O Brasil vive uma confluência que não é favorável para sua indústria. O Custo Brasil, que eu não vou aprofundar, e um cenário de câmbio muito apreciado. Se a gente ajustar o câmbio de hoje pela inflação, vamos nos dar conta de que temos o real mais forte da história recente do país.Umterceiro fator é a existência no país de portos incentivados que oferecem benefícios fiscais a importadores.
Como o de Santa Catarina? Espírito Santo e Pernambuco também. Santa Catarina junta um benefício com um malefício para o país. O porto de Itajaí tem boa estrutura, mas virou um centro importante de entrada de produtos, em que o estado para incentivar devolve 9% dos 12% de ICMS ao importador. Temuma série de cadeias produtivas que não trabalham com essa margem de lucro. Isso é muito nocivo para a indústria brasileira, ainda mais num cenário de câmbio apreciado, onde produzir qualquer coisa manufaturada no Brasil torna-se um desafio.
O cenário então é bem desfavorável... Nos últimos 16 anos, nos dois governos FH e nos dois governos Lula, o Brasil pagou um preço alto para arrumar sua macroeconomia: taxa de juros, crescimento baixo do PIB, buscou exatamente a desalavancagem do estado e o ajuste das contas públicas. Conseguimos conter a inflação e estabelecemos uma política cambial que vigora desde 99. Enquanto isso, a indústria internacional estava surfando uma onda de desenvolvimento e de alavancagem interna nos países desenvolvidos. Os nossos concorrentes estavam crescendo e ganhando dinheiro às custas da alavancagem na Europa Ocidental e nos EUA. Hoje, temos um cenário em que o modelo deles esgotou, perderam mercado doméstico. O que coincide com o momento em que o Brasil, que fez o seu dever de casa, passou a ter um mercado doméstico finalmente grande, com a inclusão ao consumo de novas parcelas da população. O governo federal precisa estar atento, porque senão nós vamos entregar o nosso mercado interno para países desenvolvidos que esgotaram o seu mercado interno. Eles estão vindo agora com um modelo parecido com o modelo brasileiro e a indústria nacional pode ficar com o pior de dois mundos: conviveu 16 anos com o ajuste fiscal e, no momento em que seu mercado floresce, quem se beneficia dele, por uma questão de câmbio, é o produtor externo.
Vamos olhar esta questão por um outro ponto de vista. Esta crise mundial não representa para a Braskem oportunidade para a expansão dos negócios, já que ela pretende ser líder? A primeira prioridade da Braskem é o investimento no Brasil. Temos um compromisso enorme com a cadeia de plástico no país com 10 mil transformadores de resina em produtos. Ainda que possa haver oportunidades neste cenário, nosso foco é assegurar que o Brasil continue sendo um bom lugar para investir e criar novas indústrias. O Brasil está fazendo duas novas fábricas neste momento, em Alagoas e no Rio Grande do Sul, e tem planos de construir outras unidades. Daí também porque ficamos satisfeitos de atrair a Basf para investir na Bahia neste momento. Dito isso, vamos estar atentos às oportunidades.
Isso quer dizer que vocês estão com mais cautela nos investimentos neste cenário? Houve alguma revisão de custos e investimentos da empresa em função da crise mundial? Não. O que muda é que a cada ano a gente revê o plano de longo prazo. Isso é uma questão de disciplina, independentemente do cenário estar melhor ou pior. O conselho vê nossa visão dos próximos cinco anos e os investimentos são aprovados depois de discutir essa visão ano a ano. É possível que, diante desta crise, a Braskem fique mais rigorosa na hora de aprovar novos investimentos. Vamos buscar saber se esse investimento tem uma robustez maior e que, ainda que o cenário piore, possa ter retorno do quer for investido. Na parte externa, se surgirem oportunidades, temos a vantagem do porte que a Braskem tem hoje. Trabalhamos muito para ter uma empresa brasileira com porte suficiente para isso e temos a vantagem de ter equipes dedicadas a questões diferentes e atentas às oportunidades.
Presidente da maior petroquímica das Américas aos 41 anos, seu exemplo é, por si mesma, emblemático de inovação. Como a Braskem vê e cuida dos talentos dentro da companhia? Formação de pessoas é uma prioridade absoluta na Braskem e no grupo Odebrecht. Faz parte da responsabilidade de cada um e especialmente dos líderes. Eu acredito que conseguimos formar um grupo forte de pessoas, alinhados com os princípios e valores da empresa e, mais do que isso, com conhecimento da empresa e relacionamento interno. O jovem formado aqui, quando assume uma posição de gerência, de direção de vice-presidência, tem uma série de vantagens como o trânsito enorme aqui dentro, por ter convivido profissionalmente com todo mundo e circulado por vários setores, o que dá um conhecimento enorme da empresa e um alinhamento de cultura.
Qual o peso da inovação para a Braskem? Inovação não é só importante para a Braskem, mas para a indústria brasileira como um todo. Na área petroquímica, estamos investindo. Temos ativos em plantas piloto, em laboratórios, investimentos dedicados a inovação e tecnologia que atingem mais de 330 milhões de dólares. A Braskem tem mais de 400 patentes registradas, sete plantas piloto, onde você testa antes de entrar em produção industrial, tem dois centros de tecnologia, um no Rio Grande do Sul e outro na Pensilvânia. O que é feito é um alinhamento constante entre as áreas de negócio. Cada uma delas aponta onde precisa melhorar em tecnologia. Com essa definição, a área de inovação e tecnologia corporativa - a Braskem tem uma área dedicada ao assunto com uma vice-presidência - usa iConfraestrutura que citei e trabalha nessas fronteiras. É necessário um equilíbrio entre o cientista, de pensamento mais aberto, com o homem de linha, responsável pela unidade de negócio que, em contato com o mercado, sabe o que vai agregar valor para a empresa ou não. É preciso ligar imediatamente esse conhecimento em geração de riqueza e em benefício de todo mundo.