A adaptação de cursos e a criação das novas formas de ingresso em instituições de ensino superior estão cada vez mais inovadoras. Vestibulares adaptados, o novo sistema informatizado de seleção unificada (SiSU) e o Programa Universidade para Todos (Prouni) que usam a nota do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) estão garantindo a estudantes novas oportunidades de cursar uma faculdade. Faculdades Públicas e Particulares em todo o país aderiram aos novos métodos. Em Salvador, a Universidade Federal da Bahia (UFBA) criou uma nova unidade para abrigar os Bacharelados Interdisciplinares (BI), novas modalidades de curso da instituição. O Coordenador do Colegiado do BI Artes, Lucas Robatto, conversou com a repórter Kívia Souza sobre o assunto. Ele também é professor Adjunto da Universidade Federal da Bahia, 1º Flautista da Orquestra Sinfônica da Bahia e Coordenador do Bacharelado Interdisciplinar em Artes da UFBa. iBahia - Quando foram implantados os Bacharelados Interdisciplinares da Ufba? Lucas Robatto - O Projeto dos BIs foi criado através de uma série de resoluções dos Conselhos Superiores da UFBA em 2008. Neste mesmo ano foi criada a unidade de ensino IHAC – Instituto de Humanidades, Artes, e Ciências Professor Milton Santos que congrega estes cursos. A implementação efetiva se iniciou com o ingresso de 1200 alunos nos BI no vestibular de 2009 da UFBA. iBahia - Como são formados os cursos do BIs? LB - Os Bacharelados interdisciplinares na Ufba são quatro: Artes, Ciência e Tecnologia, Humanidades e Saúde. Estes são cursos de curta duração (distribuídas em um tempo mínimo de seis semestres), oferecidos nos turnos vespertino e noturno, e que compartilham uma estrutura bastante similar. Esta estrutura divide os cursos em duas etapas: formação geral (três semestres) e formação específica (três semestres). Durante a formação geral, os alunos cursam percursos curriculares bastante similares e de caráter predominantemente interdisciplinar, adquirindo assim competências e habilidades que podem auxiliar-lhes no encaminhamento posterior de sua formação acadêmica, de acordo com seus anseios específicos de atuação profissional. Já na etapa da formação específica, o aluno pode optar por se candidatar às vagas em uma área de concentração de sua escolha ou então permanecer em uma formação generalista na área de cada BIs. iBahia – Como são as Áreas de Concentração? LB - As áreas de concentração, e mesmo grande parte dos conteúdos curriculares dos BIs, são oferecidos por outras unidades da Ufba além do Ihac. Certas áreas de concentração servem de etapa inicial para cursos seqüenciais. Por exemplo, um aluno do BIs Artes que complete a área de concentração em cinema e áudio visual (área que é oferecida pela Faculdade de Comunicação - Facom) vai poder pleitear uma vaga no bacharelado em cinema e audiovisual, curso integral da Facom, em suas diversas modalidades, um curso de curta duração (dois anos) e mais específico, em sua abordagem, que o BIs. Ou seja, o aluno pode escolher para se aprofundar mais em um determinado campo do saber após completar o BIs, e a ele vão ser garantidas, através da estrutura curricular, muitas possibilidades de continuação de seus estudos, seja através da continuação dos estudos em outro curso de graduação, seja através do seu ingresso em um programa de pós-graduação. iBahia - Além da estrutura curricular, existe alguma diferença para outros cursos da Ufba? LB - O projeto dos BIs parte da convicção de que a sociedade contemporânea exige que a universidade ofereça aos alunos a flexibilidade para construir perfis individualmente diversos de formação, atendendo assim às cambiantes exigências de formação que atualmente detectamos em nossa sociedade. Portanto, talvez a maior diferença que exista entre os BIs e os outros cursos universitários tradicionais seja a extrema liberdade que os BIs oferecem para que os alunos possam formar um percurso individual de aprendizagem sem estarem presos às grades curriculares rígidas. O aluno tem bastante liberdade para escolher o que vai estudar, independentemente das “fronteiras” dos cursos e unidades universitárias tradicionais. Os BIs não vêm substituir os cursos tradicionais, mas pretendem oferecer uma alternativa de formação que passa também por componentes curriculares das unidades e cursos tradicionais, em um estado de permanente diálogo com toda a universidade. Os BIs não são auto-suficientes, necessitando da universidade como um todo, e a seus alunos é franqueada a oportunidade de usufruir de forma aberta e flexível os conhecimentos gerados por uma instituição tão fundamental para qualquer sociedade, como são as universidades. Muitos cursos tradicionais não estimulam alunos a explorar os saberes praticados e vivenciados em áreas mais distantes dos cursos em que estão. Os bacharelados partem do principio de que esta “exploração de saberes” é fundamental para uma formação eficaz. Em um nível mais pragmático, esses cursos adotaram uma série de inovações que também estão presentes em cursos tradicionais, tais como o ingresso via Enem, a oferta do curso em turnos (inclusive o turno noturno), a possibilidade de continuação da formação em ciclos, uma grande parcela de atividades complementares exigidas (e que são feitas fora da sala de aula, e mesmo fora da instituição), uma ênfase especial no domínio da língua portuguesa, o estudo crítico da realidade contemporânea, etc. A maior diferença para os outros cursos da Ufba é a intensidade nas inovações são ofertadas. Um exemplo disto é que os componentes curriculares do Ihac não prevêem qualquer tipo de pré-requisito, e o aluno tem a liberdade de construir o seu percurso curricular na ordem que desejar, e com uma paleta de escolhas muito mais ampla do que qualquer outro curso atual da Ufba. iBahia - Existe algum público diferenciado ou é direcionado para àqueles que também prestam o vestibular regular? LB - A partir de 2010, a única forma de ingresso para os BIs tem sido o Enem. Esses cursos pretendem oferecer uma alternativa para os cursos tradicionais, porém, é uma alternativa que não exclui a possibilidade de que o aluno venha a ingressar integral ou parcialmente nos cursos tradicionais. A resolução 02/08 do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão da UFBA estipula em seu Artigo 6, parágrafo 1º , que a partir de 2012, 20% das vagas de ingresso para todos os cursos da Ufba serão reservadas para alunos que concluíram os BIs. Ou seja, a estes alunos é dada a oportunidade de continuar sua formação nos cursos tradicionais, sem maiores entraves. O público do BIs tem se mostrado como o que esperávamos; um público eclético e diverso em sua composição social, cultural, etária e étnica, mas que partilha um entusiasmo contagiante pelo projeto. Em 18 anos que trabalho na Ufba, nunca vi um grupo de alunos tão engajado na construção e implementação de um projeto pedagógico, e de forma tão madura. Acho que a estrutura aberta do curso estimula os alunos a assumirem a responsabilidade por sua formação de um modo bastante ativo, o que se reflete em atitudes de cidadania louváveis, com os alunos sempre atentos e proativos no que se refere ao andamento e implementação do curso. Um exemplo disso é o fato de que a matrícula dos calouros para o Bacharelado Interdisciplinar de Artes deste ano contou com colaboração voluntária e eficiente dos veteranos (organizados pelos centros acadêmicos), que orientaram seus colegas sobre as diversas possibilidades de escolha do currículo. Nós, professores, não precisamos fazer muito nesta matrícula, pois os calouros já tinham sido eficientemente orientados pelos veteranos. iBahia - O que ainda que não agrada aos estudantes ou pode melhorar para tornar os cursos de BIs referência? LB - No meu entendimento, o maior problema que os BIs enfrentam agora é o fato de não terem ainda um espaço físico próprio. Os recursos da Restruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni) destinados à ampliação física da Ufba já foram liberados, porém, nosso campus ainda é um grande canteiro de obras, e parte das construções planejadas ainda não ficou pronta. Isto acarreta que temos que dividir os espaço dos Pavilhões de Aulas (PAF) com outros cursos, o que causa, às vezes, uma certa confusão logística. Isto é o que considero o maior problema atual do Ihac, mas também acho que a participação das unidades e cursos tradicionais da Ufba no projeto BIs pode ser bastante ampliada através da oferta de componentes curriculares e áreas de concentração. Esta participação maior das unidades ampliaria bastante tanto a oferta de possibilidades de formação para os alunos do BIs, como também potencializaria o preenchimento das vagas oferecidas pelas unidades, aumentando bastante a abrangência e o número dos estudantes atendidos. As unidades também podem se beneficiar da colaboração com os BIs ao solicitar vagas nos componentes curriculares dos BIs, que, em sua perspectiva interdisciplinar, atendem uma série de aspectos que, às vezes, ultrapassam o âmbito de atuação das unidades, mas que são necessários para a formação de alunos na contemporaneidade. iBahia - O que é preciso para entrar na área de concentração? LB - As áreas de concentração têm diferentes critérios de ingressos. Muitas áreas vão adotar o critério de coeficiente de rendimento do aluno ao completar a etapa da formação geral, outras vão aplicar testes de seleção específicos (muito comuns nas áreas das artes, por exemplo). Muitas áreas vão permitir que o aluno se matricule em componentes curriculares de sua grade curricular, mesmo antes destes ingressarem oficialmente na área. iBahia - Quais as vantagens de fazer BIs? LB - É um curso de curta duração, que ao seu término oferece diversas possibilidades para o aluno continuar a sua formação, se quiser (em outros cursos tradicionais ou em pós-graduações), mas que dá um diploma universitário pleno ao final de seis semestres. Esses cursos permitem e cobram do aluno muito estudo e reflexão. São flexíveis e oferecem diversas opções de encaminhamento através do percurso curricular individual de cada aluno; são cursos modernos, direcionados ao entendimento da nossa realidade contemporânea, visando uma atuação mais eficiente dos seus egressos na sociedade atual. São cursos de qualidade, oferecidos por um corpo docente altamente qualificado, pois todos os professores do Ihac têm doutorado, mas principalmente são cursos que desenvolvem a autonomia do indivíduo, oferecendo tanta liberdade de opção que acabam desenvolvendo o senso de responsabilidade e engajamento em seus estudantes, requisitos fundamentais para o desenvolvimento de uma cidadania plena, algo que o Brasil necessita muito.
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