Levantar da cama cinco horas antes da cerimônia, colocar a maquiagem e fazer o penteado, para então, finalmente, usar o vestido branco especialmente escolhido para a ocasião. Esta poderia ser a rotina de qualquer noiva no dia do casamento, se o destino final fosse a igreja ou o cartório e não a Penitenciária Lemos de Brito, no Complexo Penitenciário da Mata Escura, como é o caso de Rebeca da Silva Santos, 26 anos.Na manhã desta terça-feira (27), outras oito noivas cumpriram uma rotina parecida com a dela para participar do primeiro casamento celebrado dentro de uma penitenciária na Bahia. A cerimônia coletiva aconteceu na escola que fica dentro do complexo e cada casal teve direito a quatro convidados: dois para a noiva e dois para o noivo.
Mesmo as circunstâncias um tanto quanto adversas não foram capazes de roubar o brilho dos olhos de Rebeca. A dona de casa veio do município de Catu, a cerca de 90 km de Salvador, para realizar o sonho de infância de usar o tradicional vestido branco.Namorando com Roberval dos Santos Pires, 30, há seis anos, Rebeca credita o pedido de casamento à mudança de comportamento pela qual o noivo passou desde que foi preso, em 2013. "Já convivi com ele lá fora e aqui mudou a mente dele. Deus deu nossa filha e nós tivemos esse privilégio, essa oportunidade de casar", comemora.O pedido de casamento foi feito há dois anos, mas só agora Roberval e Rebeca puderam oficializar a união. Infelizmente, Roberval vai passar os primeiros cinco anos de casado preso, até terminar de cumprir a pena por envolvimento com o tráfico de drogas.Durante a cerimônia, os os casais foram chamados um a um para realizar o registro civil, até chegar a vez de Rebeca e Roberval. Além de garantir que ambos os noivos estavam ali de livre e espontânea vontade, o juiz Antônio Mônaco Neto pediu ainda que dissessem "eu te amo"."Eu celebro geralmente casamentos dos ricos e famosos. Entretanto, aqui eu me senti gente", revelou o juiz, impressionado com a alegria dos noivos e dos presentes. Ao final da cerimônia, os 18 recém-casados cortaram o bolo que foi dado de presente pelos defensores públicos.O projeto do casamento coletivo foi idealizado pela defensora pública Fabíola Pacheco, atuante na Execução Penal, a partir da demanda identificada entre os próprios presos. Com o apoio da corregedoria do Tribunal de Justiça, a união é oficializada pelo cartório de registro civil de Valéria.Próximos casamentos
Atualmente há outros 60 detentos na lista de espera para casar. Segundo Fabíola, eles ficaram de fora da primeira cerimônia porque não conseguiram reunir a documentação necessária a tempo, mas, Se estiverem com os documentos em dia, vão poder participar do próximo casamento coletivo, previsto para maio.A iniciativa também pode ser estendida para outros presídios do estado, segundo Clériston Cavalcante de Macedo, Defensor Público Geral da Bahia. "É importante que ações como essa sejam cada vez mais difundidas para quebrar esse paradigma de que as pessoas que estão privadas de liberdade não são capazes de amar", avaliou.
Prova de amor
O casamento foi a forma que o detento Antônio Lázaro Santos Silva, 43, encontrou para dar uma prova de amor à companheira. Ele ficou sabendo da iniciativa da Defensoria Pública através de um cartaz afixado no Centro de Observação Penal (COP), parte do Complexo da Mata Escura, onde está preso."Ela já vinha me cobrando há tempos, aí eu pensei: é agora! Ou tudo, ou nada!", conta. O pedido foi feito na visita seguinte e Ana Rita da Conceição, 49, prontamente aceitou. Mas não sem antes dar uma chamada no noivo, que vivia se esquivando do casamento."Agora você me mostra realmente se você me ama, se quer se casar, porque fica só prometendo, prometendo e nada". Dos 16 anos de união, nove foram passados com Antônio dentro das grades.Os dois têm uma filha adolescente e Ana Rita tem um filho mais velho, de um relacionamento anterior. Além de cuidar da casa, dos filhos e do emprego, a operadora de caixa ainda precisa incluir as visitas a Antônio na rotina atribulada."Eu tinha quase dois meses sem ver ele. Só na semana passada foi que eu consegui uma folga para vir", contou Ana Rita. Ela começou no emprego novo há seis meses e precisa contar com a compreensão das colegas de trabalho para trocar de turno e ir visitar o companheiro, mas, segundo a recém-casada, isso não é nada que o amor não supere.Paixão de adolescência
Laurenilma, 29, conheceu o noivo, Ramon Anjos de Jesus, 26, quando os dois frequentavam a mesma escola, no bairro de Abrantes. O relacionamento demorou de engatar, mas os dois já estão há cinco anos juntos. "Ele ficava insistindo, mas no início eu não queria nada com ele não", revelou, às gargalhadas.A dona de casa leva o nome de Ramon tatuado no ombro e a partir de hoje vai carregar o sobrenome dele também. Vai deixar de ser Laurenilma Paixão de Menezes para virar Laurenilma Menezes de Jesus. Há três anos namorando com um detento, ela só tem uma forma para explicar o porquê de tanta entrega: "é a química".Ramon foi preso por envolvimento com o tráfico de drogas e até hoje aguarda julgamento, sem saber de quanto tempo será a sentença. Não só ele aguarda, mas também Laurenilma. "Esperei até agora, não é depois de casada que vou deixar de esperar", declarou a noiva.
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