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BAHIA

Produtores pedem socorro para lidar com seca devastadora

Safras perdidas, milhares de animais morrendo de fome e sede - milhões de baianos têm sido afetados por uma das piores secas da história

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27/03/2013 às 9:27 • Atualizada em 31/08/2022 às 10:09 - há XX semanas
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O sol que resseca o chão e castiga o gado brilha impiedoso há quase três anos. Sem chuva, sem água, sem criação animal, plantação, nem produção leiteira, pequenos e médios produtores viram neste ano se reduzir a zero o número de sacas produzidas em culturas como a de milho, mandioca, feijão, hortaliças, fruticultura e cafeicultura. Sem pastagem, morreram o gado, os porcos, as cabras, as aves, ficaram sem leite as vacas. Ficou impossível manter os trabalhadores na lavoura e no pasto.
Boi com costelas à mostra em Andorinhas, a 430 quilômetros de Salvador: falta de água e comida
Para quem vivia da agricultura familiar, em roças de subsistência, o feijão que vai ao prato não vem mais do quintal. É pago com o dinheiro de programas sociais como o Bolsa Família e o Auxílio Estiagem. Isso quando não se tornou impossível manter-se na roça - buscar emprego na cidade grande tornou-se a única opção para muitos. A peleja dos agricultores diante da seca atinge 390 mil quilômetros quadrados de terra na Bahia, cerca de 70% da área do estado – 214 municípios já decretaram situação de emergência. A falta crônica de água já bate à porta da capital. A cerca de cem quilômetros de Salvador, na zona rural de Feira de Santana, se contam aos milhares histórias similares à de José Ferreira Sales, 56 anos, filho de pais trabalhadores rurais, dono de uma pequena roça de 3 hectares, onde planta feijão, milho e mandioca e cria cabras e galinhas. Quando ainda conseguia tirar seu sustento da terra, tudo era negociado com comerciantes locais. “Hoje, 90% dos agricultores familiares de Feira vivem do dinheiro do Bolsa Família, do Auxílio Estiagem, dp Garantia Safra, da aposentadoria rural. Enfim, de dinheiro do governo”, disse. Ele mesmo recebe R$ 140 por mês, via Garantia Safra, dinheiro que sustenta sua mulher e mais três filhos. “Tá todo mundo com dificuldade até para pagar as contas de água e luz”, desabafa o produtor, que é presidente do Sindicato dos Agricultores de Feira. Sem ter como trabalhar na terra, outros três filhos de José foram morar na cidade. “Até os grandes fazendeiros que demandavam mão de obra dos pequenos agricultores não existem mais. Está complicado. Meus três filhos que foram para a cidade pegam o trabalho que aparecer, de pedreiro, de servente, porque a situação está braba. Tem família para dar comida e não podem vacilar”, disse. Ajuda Sem ter como plantar, os agricultores familiares, pequenos e médios se reuniram ontem na sede da Federação da Agricultura e Pecuária da Bahia (Faeb), em Salvador. Eles se juntaram para elaborar um documento com reivindicações aos governos federal e estadual e marcar mobilizações para chamar atenção do poder público. “Se ninguém souber do nosso drama, vamos continuar invisíveis. O Brasil precisa saber do que acontece com quem sofre com a seca”, disse Carlos Henrique Ribeiro, do Sindicato de Produtores Rurais da Bahia.
Tal qual sempre fez o Movimentos dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), agora são os donos das propriedades que vão às ruas protestar. Uma manifestação está sendo organizada para o dia 8 de abril, em Feira de Santana. “Vamos aprender a fazer barulho para reivindicar”, afirmou Ribeiro. Foi por precisar de ajuda para sobreviver que Amadeus dos Santos Amaral, 45 anos, saiu de Miguel Calmon e veio a Salvador ontem. Separado da mulher e de seus três filhos, ficou sem a ajuda de nenhum programa social. Ao contrário, tem de pagar pensão alimentícia. “Depois de velho tive que pedir a ajuda de minha mãe, que é aposentada e me dá o que comer e paga a pensão, se não vou preso”, conta. Ele tinha 40 vacas leiteiras, que valiam R$ 4 mil cada. Teve de vender uma a uma para bancar a alimentação das que sobraram. Hoje tem apenas cinco, e diz que não encontra quem queira comprá-las por R$ 1,5 mil cada. “Mandei embora as cinco pessoas que trabalhavam comigo e fico o dia dando palma pro gado e vendo o tempo passar, esperando chover”. Sonho adiado Com o tempo batendo em sua porta, Antoniel Francisco Nunes, 44 anos, também de Miguel Calmon, chora quando fala da filha de 17, que passou no vestibular de Matemática da Uneb, em Caetité. Ela não se matriculou. “Não tive condiçõe de bancar ela lá. É uma pena. Ela tem que estudar, não pode ficar que nem o pai, dependendo da chuva para viver”, desabafou. De sua propriedade de 22 hectares, ele planta milho e mandioca, e agora depende exclusivamente do Bolsa Família para viver. Já José Santos Souza, 50 anos, teve a chance de dar estudo superior aos seus três filhos antes da seca chegar. Hoje, recebe a ajuda deles para manter-se na fazenda de pequeno porte que tem em Vàrzea Nova. “Tem mais de um ano que só fecho o mês no prejuízo. Eu tinha seis funcionários, agora só dois. Tinha 23 vacas, já cheguei a produzir 250 litros de leite por dia. Agora são 13 vacas, estou produzindo 100 litros”, disse. Ele ainda conseguiu manter uma produtividade porque conseguiu comprar ração com o crédito de R$ 12 mil que conseguiu no Banco do Nordeste. “Mas o dinheiro acabou e a ração tá acabando”, afirmou. Sem saber o que fazer, também chora a produtora de café Eurly Maria de Souza Pinto, 58, de Seabra. Ela conta que mais de cem pessoas da região decidiram buscar emprego nas fazendas de cana em São Paulo e de café em Minas Gerais. “E muitos acabam voltando porque não acham nada”. Em sua propriedade, ela diz que chegava a produzir cem sacas de café por colheita. “Agora não sai um quilo. O café que tomo vem de fora”. Vereadora do município, sobrevive do salário no cargo público. “Teve um dia que foi duro. Me chegou um vizinho depois de meio-dia e disse: ‘Tu tem comida aí?, porque eu ainda não comi’. Isso toca. A única renda lá é o Bolsa Família. Não temos nada”. Governo tem dificuldade para ajudar produtores Como medidas emergenciais, os agricultores elegeram como prioridade a estruturação da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) na Bahia, para o rápido fornecimento de milho para ração animal a preços de R$ 22 a saca de 60 quilos – atualmente, os agricultores pagam cerca de R$ 43 para o produto comprado em estados vizinhos como Minas Gerais.
Os agricultores querem ainda a ajuda do poder público para perfurar poços artesianos, além do retorno das linhas de financiamento para médios e pequenos produtores via Banco do Nordeste (BNB), com teto de R$ 100 mil. Atualmente, apenas os agricultores familiares têm acesso ao crédito, que é limitado a R$ 12 mil. “A seca está jogando a dignidade do produtor no chão, fazendo ele se humilhar diante do gerente do banco, do secretário e do governador, e isso não está dando resultado”, reclamou o presidente da Faeb, João Martins Júnior. Ele cobrou ainda que sejam planejadas, para o médio e longo prazos, medidas para ajudar a retomada dos plantios e criações de animais, assim que a seca acabar, bem como viabilizar o perdão de parte da dívida dos agricultores. “Não haverá lucro em menos de cinco anos. Essa dívida é impagável, tem que perdoar parte e financiar outra parte”, sugeriu. O secretário de Agricultura do estado, Eduardo Salles, afirmou que a a política emergencial para a agropecuária encontra dificuldade em conseguir água justamente porque o que é encontrado em poços e barragens subterrâneas, em geral é utilizado para o consumo humano. “Até os mananciais subterrâneos estão secando”, contou. Como forma de alimentar os animais, o governo está investindo R$ 1,5 milhão na produção de um milhão de mudas de palma por mês, em Juazeiro, para serem distribuídas aos produtores de todo o estado. Além disso, segundo ele, já foram liberados R$ 22,1 milhões para a construção, neste ano, de 1,4 mil barragens subterrâneas em 50 municípios. O secretário disse que tem buscado, ainda, uma solução para trazer milho de outras regiões do país para servir de ração. Uma proposta que está em estudo com a Conab é a de que navios saiam do porto de Paranaguá, do Páraná, com a carga de 20 mil toneladas por mês para cada estado atingido pela seca. “Esse milho viria para Salvador, e nós nos responsabilizamos em transportá-lo para o interior”. Segundo Salles, com três anos de estiagem seguidos, a seca no Nordeste brasileiro pode ser considerada a mais grave de todos os tempos. “É como se fosse um terremoto de grandes dimensões que vem devastando tudo”. Matéria original Correio 24h Produtores pedem socorro para lidar com seca devastadora

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