Ator integrante do 1° elenco da globo, diretor, aprendiz de sapateiro, de alfaiate e de gráfico, além de militante político. Essas são algumas das atividades desempenhadas por Milton Gonçalves ao longo dos seus 88 anos de vida. Em consulta ao especial Memória Globo, o iBahia reuniu parte dessa história. Confira abaixo
Vida e carreira
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Millton Gonçalves nasceu em 9 de dezembro de 1933, na cidade de Monte Santo, em Minas Gerais, mas se mudou ainda pequeno para São Paulo, com os pais, que eram camponeses.
Chegando na cidade, ele foi aprendiz de sapateiro, de alfaiate e de gráfico. Mas foi no teatro infantil e amador que se encontrou.
Milton estreou profissionalmente em 1957, no Arena, na peça Ratos e Homens, de John Steinbeck.
“O Teatro de Arena tinha algumas propostas da época, revolucionárias. Quais eram? Descobrir, ou formatar, formalizar uma maneira brasileira de interpretar. Passamos a pesquisar como o homem brasileiro anda, como ele come, como ele fala, como ele gesticula”.
Ele ficou com o grupo até 1958, quando, depois de uma turnê pelo Brasil, que terminou no Rio de Janeiro, os integrantes resolveram se separar.
“Uns quiseram voltar para São Paulo, outros quiseram ficar no Rio. Eu escolhi ficar. Aí passei a fazer Teatro Nacional de Comédia”, conta.
Segundo os registros, Milton Gonçalves já era contratado da Globo antes mesmo da inauguração da emissora, em 1965.
Junto com Célia Biar e Milton Carneiro, ele formou o primeiro elenco de atores da Globo, depois de um convite do ator e diretor Otávio Graça Mello, de quem fora companheiro de set no filme Grande Sertão (1965), dos irmãos Geraldo e Renato Santos Pereira.
“Não tinha inaugurado nada ainda. Os três estúdios e o auditório pareciam para mim os estúdios da Universal. O primeiro salário foi 500 cruzeiros. E eu fiquei feliz”, lembra.
Sob a direção de Graça Mello, participou das primeiras experiências dramatúrgicas da Globo: o seriado Rua da Matriz, de Lygia Nunes, Hélio Tys e Moysés Weltman; e a novela Rosinha do Sobrado, de Moysés Weltman.
No mesmo ano, Milton atuou também em Padre Tião.
Entre 1966 e 1969, trabalhou no humorístico TV0-TV1. Com texto e produção de Max Nunes e Haroldo Barbosa, e direção de Augusto César Vannucci, o TV0-TV1 parodiava outros programas, sendo considerado um dos precursores do TV Pirata (1988).
O ator participou, ainda, da primeira versão do Balança Mas Não Cai (1968).
A primeira experiência de direção ocorreu na novela Irmãos Coragem (1970), de Janete Clair, considerado um marco da televisão brasileira.
“Comecei como assistente do Daniel Filho na novela Véu de Noiva, em que também fazia um pequeno personagem. Depois dessa, veio Irmãos Coragem, na qual eu fazia o Brás Canoeiro, e também ajudava na direção. Até que o Daniel disse: ‘Eu vou entregar a novela pra você’. Um belo dia, ele tirou o fone e já foi dando tchau. Eu botei o fone e disse: ‘Olha, o Daniel está indo viajar. Vocês vão me desculpar durante dois dias. Eu vou errar, mas depois vamos acertar’. E assim foi feito”.
Depois disso, o ator esteve em praticamente todos os momentos-chave de emissora.
Interpretou, por exemplo, o Professor Leão do infantil Vila Sésamo (1972) e o Zelão das Asas de O Bem-Amado (1973), de Dias Gomes. Esse último personagem representava uma metáfora da busca por liberdade política e de expressão em plena ditadura dos anos 1970.
A última cena da novela foi protagonizada pelo pescador que, finalmente, conseguia voar com as asas construídas por ele durante toda a trama.
“O Zelão das Asas mexeu com uma coisa muito cara à população: a fé. O Zelão sou eu, aquele que acredita e cumpre com o que combinou. Eu estou na vida para servir de exemplo”, destaca.
Além disso, Milton também fez história na primeira versão de Pecado Capital (1975), de Janete Clair. Em trama de horário nobre, a autora deu ao ator o papel do psiquiatra Dr. Percival, um médico renomado, com vários cursos internacionais.
Até então, era comum que artistas negros ficassem restritos a funções como empregados, motoristas ou escravos. O personagem foi um pedido do próprio ator para Janete.
Na época, a escritora até ensaiou um romance do psiquiatra com Vitória (Theresa Amayo), a filha mais velha de Salviano (Lima Duarte), mas o público reagiu mal, e a história entre os dois não aconteceu.
O relacionamento de um negro com uma branca seria uma forma de abordar a discriminação racial no Brasil ainda mais forte no país naquele período.
“Eu fui à Janete e disse: ‘Eu gostaria de fazer um personagem que fosse bacana, culto, inteligente, um exemplo para aquele menininho que está no morro, na favela e que só vê negro sendo bandido na televisão, ou que não aparece’. E ela me deu um personagem memorável, que foi o Dr. Percival, de Pecado Capital, na primeira versão”, conta.
Ainda em sua carreira como diretor, figuram os primeiros capítulos da novela Selva de Pedra (1972), de Janete Clair, e o grande sucesso Escrava Isaura (1976), uma das novelas mais vistas no mundo.
Em Roque Santeiro (1985), de Dias Gomes, Milton interpretou o promotor público Lourival Prata, e também trabalhou em minisséries como Tenda dos Milagres (1985), adaptação do romance de Jorge Amado por Aguinaldo Silva; As Noivas de Copacabana (1992), de Dias Gomes, Ferreira Gullar e Marcílio Moraes; Agosto (1993), adaptação da obra de Rubem Fonseca por Jorge Furtado e Giba de Assis Brasil; e em Chiquinha Gonzaga (1999), de Lauro César Muniz, em que deu vida ao maestro Henrique Alves de Mesquita.
Em 2006, Milton Gonçalves atuou na segunda versão de Sinhá Moça, como Pai José. Na história, o personagem foi transformado em escravo reprodutor pelo pai do então coronel Ferreira (Osmar Prado), o barão de Araruna, e quando idoso, começou a sonhar com a liberdade dos negros, morrendo no tronco por causa dos desejos.
Na época, a novela foi indicada ao prêmio Emmy Internacional na categoria Série Dramática. Na cerimônia de premiação, Milton Gonçalves apresentou o prêmio de melhor programa infantojuvenil ao lado da atriz americana Susan Sarandon.
Foi a primeira vez que um brasileiro apresentou um prêmio Emmy Internacional.
Em 2011, Milton Gonçalves trabalhou na novela Insensato Coração, de Gilberto Braga e Ricardo Linhares, como Gregório Gurgel.
Já no ano seguinte, voltou a atuar em uma trama de época, ao interpretar o Afonso Nascimento em Lado a Lado, novela de João Ximenes Braga e Claudia Lage, que ganhou o prêmio Emmy Internacional.
Em 2017, o ator foi Cristóvão na novela Pega Pega, de Claudia Souto, que estreou como autora titular, e, no ano seguinte, viveu Eliseu em O Tempo Não Para, de Mario Peixoto.
O último trabalho de Milton na Globo foi em 2019, quando integrou o elenco da minissérie Se eu Fechar os Olhos Agora.
Política
Milton também teve importante militância política ao longo da vida. Simpatizante do Partido Comunista Brasileiro na juventude, chegou a se candidatar ao governo do Estado do Rio de Janeiro em 1994 pelo PMDB.
Inclusive, o ator usou a experiência no universo da política para compor o personagem Romildo Rossi, um político corrupto, em A Favorita (2008), de João Emanuel Carneiro.
A novela está em exibição atualmente no Vale a Pena Ver de Novo. Na trama, Milton contracena com Taís Araújo, que deu vida à filha dele, Alícia.
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Redação iBahia
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