O Brasil é conhecido mundialmente pelo seu calor humano, pelas festas vibrantes e pela alegria contagiante que marca nossa cultura, não é mesmo?! Mas essa imagem exuberante contrasta com uma realidade emocional urgente e alarmante. Em 2025, ocupamos a segunda posição global em transtornos de ansiedade e lideramos a América Latina em casos de depressão, segundo a OMS e a Fiocruz. Essa contradição revela uma ferida aberta: exportamos alegria, mas importamos remédios para a mente.

Temos o maior número de psicólogos por habitante no mundo, mas apenas 2 em cada 10 brasileiros conseguem acesso real a atendimento psicológico. O problema não está na quantidade de profissionais, mas na forma como o cuidado é estruturado ou, melhor dizendo, na ausência dessa estrutura.
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Muitos gastam o que podem e o que não podem para acessar psiquiatras, medicamentos e terapias, quando conseguem vaga em meio à falta de empatia e aos preços exorbitantes. O governo dedica apenas cerca de 2% do orçamento da saúde à saúde mental, e faltam remédios básicos na rede pública. A saúde mental tornou-se um luxo para poucos.

Nesse cenário, o sofrimento é explorado comercialmente: influenciadores e marcas vendem autocuidado como solução rápida, enquanto a dor verdadeira é empurrada para o invisível. Vivemos numa sociedade marcada pela desigualdade, insegurança, violência e um culto à produtividade que nega o direito ao descanso e à vulnerabilidade.
No consultório, vejo pessoas exaustas que fingem estar bem. Um país que sofre em silêncio, coberto pelo sorriso obrigatório. Saúde mental não é escolha pessoal, é questão pública, social e política. Enquanto isso não for entendido, estaremos fadados a um ciclo de dor mascarada.
A depressão no Brasil não é uma fraqueza individual é o sintoma de uma crise coletiva. Somos o país que mais consome ansiolíticos na América Latina, mas investe pouco na prevenção e no cuidado na base do sistema de saúde. Seis em cada dez jovens relatam sintomas de ansiedade, e ainda assim a narrativa insiste em responsabilizar o indivíduo, como se força de vontade bastasse. Enquanto isso, o sofrimento é anestesiado digitalmente: consumimos compulsivamente conteúdos que geram prazer imediato, apostamos em cursos e produtos que prometem cura rápida, mas ignoram a raiz do problema. O setor de wellness cresce no Brasil, mas vende alívio, não solução. E a depressão avança, especialmente entre adolescentes.

Temos mais de 430 mil psicólogos registrados, mas só 6% dos municípios contam com atendimento psicológico pelo SUS. Nas escolas públicas, o suporte emocional é exceção. Enquanto a graduação em psicologia cresce, o acesso ao cuidado continua elitizado e o sofrimento é nacional, o cuidado um privilégio. Falta política pública, não profissionais.
Vivemos um tempo onde a prioridade é aliviar o agora e não construir o amanhã. O autocuidado virou moda, mas também máscara. Consumimos para anestesiar a dor, conectamos para distrair a angústia. Marcas que não reconhecem essa realidade perdem espaço. Saúde mental é pauta de toda empresa, produto e relação humana. Quem escuta e acolhe constrói confiança; quem promete perfeição exaure.
Se a saúde mental é vista como privilégio, estamos condenando uma parte significativa da população ao sofrimento silencioso e à invisibilidade. A questão não é apenas individual, mas um reflexo do tecido social que construímos, das escolhas políticas, econômicas e culturais que moldam nosso cotidiano.

Precisamos questionar não só o que consumimos para aliviar a dor, mas como nos organizamos enquanto sociedade para cuidar uns dos outros. Que o silêncio do país do sorriso não seja mais uma desculpa para ignorar essa urgência.
Vá por mim, a verdadeira cura começa quando reconhecemos que o sofrimento não é uma falha pessoal, mas um chamado coletivo para transformação. Transformar é um verbo que nos convoca a agir, no atendimento, nas políticas públicas, nas relações e na forma como enxergamos a nós mesmos e ao outro.
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