“Meça o pano três vezes, pois só poderá cortá-lo uma vez” - o conselho é de Mãe Stella de Oxóssi e esta é apenas uma das muitas curiosidades do livro “Histórias contadas em tecidos: o carnaval negro baiano", de Alberto Pitta, criador do Cortejo Afro. O livro deve ser lançado em junho, mas eu antecipo algumas histórias pra vocês.
"É um outro olhar, uma outra forma de contar e de falar o que a gente faz. Mostrar, através dos tecidos, o que é o carnaval negro baiano porque às vezes dá impressão que todo o ano é a mesma coisa. E não é!", contou Pitta em entrevista ao iBahia.
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O trabalho começou em 2020, em plena pandemia. Na verdade, o artista vinha trabalhando há muito tempo em cima das lembranças da infância e adolescência. Na prática, Pitta memorizou histórias contadas, principalmente, por Mãe Santinha, mãe biológica dele. E por isso, o livro é um documento pra todos, negros e não negros.
"Nosso carnaval é marcado pelos símbolos e signos milenares da África. São detalhes desta história que conto no livro. Tem várias formas - de falar sobre o que nós fazemos, mas eu percebi também, que a Academia em si tem um limite, né? Não é só o acadêmico chegar, entrevistar o Vovô do Ilê e João Jorge, do Olodum que pode se autoafirmar um conhecedor das nossas coisas. Não! A vivência é importante", explicou o escritor que falou ainda sobre a importância desse registro.
"Esse é um livro de memórias, onde eu, acima de tudo, recupero as histórias dos blocos de índios. As entidades tinham nomes de tribos dos Estados Unidos: Comanches, Apaches, Cheienes e outros. Isso porque houve uma influência do cinema norte americano no carnaval da Bahia", detalhou Pitta.
É nas passarelas, na multidão de foliões, que contamos nossas lutas, revoltas, alegrias e tristezas. Dentro desse contexto, o livro deve ser lido e relido com atenção para que valorizemos cada vez mais nossa cultura, nossa história. O carnaval negro é uma lição pra se ter orgulho, seja pela música ou pelos sons de tambores, atabaques, agogôs e histórias contadas nas fantasias.
Curiosidades
Um dos fatos interessantes de destaque é do Bloco Cacique do Garcia, inspirado no Bloco Cacique de Ramos, do Rio de Janeiro - fundado por uma mulher da família Barroso, dona Maria, moradora do bairro. Imagine que ao desarrumar a mala do seu marido, João Barroso, que havia brincado carnaval no Rio de Janeiro , dona Maria encontrou uma fantasia do Bloco Cacique de Ramos. Foi paixão à primeira vista, rapidinho ela convidou os vizinhos, amigos para criar o primeiro bloco de índios de Salvador que se chamaria Cacique do Garcia. Detalhe: a entidade carnavalesca sairia no dia que a Escola de Samba Juventude do Garcia não desfilasse. Os brincantes foram parar no Bairro do Tororó. A turma de lá não ficou pra trás, e no ano seguinte o Apaches do Tororó enriquecia o carnaval de Salvador.
Outra curiosidade foi o confronto entre os 1.500 homens da PM da Bahia e os 5 mil integrantes do Bloco de índios Apaches do Tororó, no desfile do Bloco Lá Vem Elas, formado só por mulheres da chamada alta sociedade de Salvador. Os maridos desfilavam nos Internacionais, Corujas, Lords - blocos masculinos. Pois bem, a amante de um dos homens casados foi 'proibida' de sair no Lá Vem elas. Insistiu em brincar no mesmo território onde a esposa teria contratado 4 Apaches para agredir sua rival. A polícia foi chamada e nesse dia, acredite, o carnaval de Salvador terminou mais cedo. Imagine Os Apaches sendo caçados pela polícia militar da Bahia? Na época, eles foram acusados de invadir o Lá Vem Elas e promover um beijaço. Mas há outra versão: a de que tudo não passou de uma briga particular.
A ex-presidente do bloco em 1977 confirmou para o autor do livro, a versão do triângulo amoroso. A confusão foi grande. O comandante da PM da Bahia recebeu ordem para prender todo homem que estivesse vestido de Apache. A história completa? Você vai ler no livro.
Wanda Chase* - @chase.wanda
Wanda Chase é jornalista graduada pela Universidade Federal do Amazonas, com mais de 30 anos de experiência e mais de 45 prêmios recebidos ao longo da carreira. Atuou como repórter, produtora, editora, apresentadora e comentarista em várias emissoras de televisão e jornais do Norte-Nordeste, a exemplo da TV Bahia, Rede Globo Nordeste, TVE Bahia, Rede Manchete, etc. Em 2009, recebeu o Troféu Maria Felipa, da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, e o Troféu Ujaama, concedido pelo Grupo Cultural Olodum, em 2020. Recebeu também o título de Cidadã Soteropolitana.
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