Ninha da Bahia (nome artístico adotado por ele) nos conta um pouco dessa história: “Nos anos 80, eu era cantor do Samba Leva Eu, do Engenho Velho de Brotas. Cantei dez anos lá. O bairro é conhecido como um celeiro cultural. Por todo lado que se virava tinha uma manifestação cultural. Muitos artistas de Salvador nasceram lá. O Engenho Velho tem até uma lugar especial chamado Praça dos Artistas, reverenciando gente como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Amelinha e tantos outros que frequentavam o bairro, fosse no Afoxé Badauê, nos terreiros de candomblé, afoxés como o Ókanbi - fundado pelos irmãos Jorjão e Mario Bafafé . Enfim, gente que gostava do Engenho Velho”.
Ninha lembra que conhecia Carlinhos Brown apenas “de vista naquela época”, quando o cacique do Candeal tocava com Caetano Veloso. Mas, certo domingo, Brown, Tony Mola e Cícero Menezes ficaram até o fim do ensaio do Leva Eu.
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“De repente, Brown me chamou e falou que precisava de uma voz percussiva como a minha para um projeto que ele estava criando. Era a Timbalada. Aceitei o convite, passei quatro anos no grupo, depois dei uma pausa, precisei me afastar porque tinha um contrato assinado com o Dance Brasil, em Nova York - grupo do dançarino, coreógrafo e mestre de Capoeira Jelon Vieira, baiano de Santo Amaro. Foi uma experiência significativa, fui capa do jornal New York Times, gravei um disco, divulguei a cultura da Bahia. Passados três anos lá, a Polygram, hoje Gravadora Universal, me chamou de volta para a Timbalada, pagou a multa da minha quebra de contrato com o Dance Brasil e eu voltei para Salvador e para o Candeal”, relata.
Ninha diz que se não fosse o samba duro, ele não teria construído uma carreira de sucesso. O cantor e compositor cultiva as melhores lembranças de sua época no samba duro. “Todo domingo era diferente. A cada ensaio, o público aumentava. Nós ficávamos encantados. Era um verdadeiro espetáculo, samba duro na veia. Eu ganhava tudo que era de concurso na cidade”.
O reconhecimento veio anos depois, em novembro de 2021, quando o “gogó de ouro da Bahia” recebeu o título de Rei do Samba Duro Junino, da Fundação Gregório de Matos . “Ele era um fenômeno, muito bom, um monstro do nosso movimento”, resume Tatau.
Tatau sabe o que diz. Ele também foi revelado pelo samba duro. Um dos fundadores do Grupo Scorpio, Tatau é autor da canção “Quero ser seu namorado”, uma das faixas de maior sucesso de um LP - disco vinil - com os melhores sambas juninos da Bahia. Produzido por Manolo Posada (in memoriam) e Cristóvão Rodrigues, diretor de programação das emissoras de rádio Itapoan e Sociedade na época, o disco estourou.
“Na verdade, era Manolo que fazia tudo, palavras de Cristóvão Rodrigues. E Manolo era um senhor pesquisador, vivia nos bairros da cidade e descobriu muitos talentos. Nós gravamos o disco - pela Continental - na WR. Wesley Rangel não cobrou nada. Não demorou e o samba duro foi parar na Tv Itapoan, no Programa do radialista e apresentador de Tv, Josenel Barreto. O movimento ganhou força e surgiram outros grupos e muitos fãs”.
Reinaldinho, ex-Terra Samba, foi outro que bebeu da fonte do samba duro. “A gente morava na Rua Nova e eu ouvia um som assim “ tchá, tchá ,tchá , tchá “. Era a batida do samba duro e eu ficava encantado. Foi ali, naquele lugar, minha iniciação musical”, diz o cantor.
Só depois ele veio saber que o tchá, tchá, tchá, do tamborim é a clave mãe do samba duro. É essa batida que caracteriza o samba duro, que determina o ritmo. Reinaldinho circulou em vários grupos: no Sambarca, Gantois , Coisa Doce. Cantou no Scorpio com Tatau. Durante quase duas décadas foi cantor do Grupo Terra Samba e é claro que levou sua experiência, vivência do samba duro.
É muita informação sobre esse movimento cultural que aquecia a economia dos bairros. Costureiras ganhavam confeccionando roupas, o homem da cerveja vendia seu produto, os fabricantes de instrumentos ... a valorização da cultura viva, que emana do povo. Na próxima quinta eu volto aqui pra contar a vocês histórias de percussionistas, criadores de instrumentos, gente que alimentava e alimenta essa cadeia produtiva. Tchau!! Até quinta se Deus quiser !!
Wanda Chase
Wanda Chase
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