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Tabus, Tretas e Troças

Ancestralidade indígena já nos deu grandes atletas. Conheça alguns!

Mesmo invisibilizada, cultura dos povos originários segue viva em jogos e brincadeiras. E promete ótimas surpresas no esporte

Silvio Tudela • 23/04/2023 às 15:00 • Atualizada em 08/05/2023 às 12:01 - há XX semanas

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					Ancestralidade indígena já nos deu grandes atletas. Conheça alguns!
Foto: Reprodução

Em sua infância, viveu em 'selvagem liberdade'. Descalço, andava pelas matas de Pau Grande sem que ninguém notasse em casa sua ausência. Cavalgava 'em pelo' no cavalo que pertencia ao pai. Adorava caçar pássaros, jogar bola e nadar no rio. Já [nesta] época, era 'ingovernável' como um índio.

As frases levemente colocadas aqui com ar de mistério são de Ruy Castro em ‘Estrela Solitária’ (1995), a biografia de Manoel Francisco dos Santos, conhecido mundialmente como Garrincha (apelido que uma de suas irmãs lhe deu em referência a um pássaro difícil de ser caçado) e também como o Anjo de Pernas Tortas. Os trechos vão revelando um pouco as origens esquecidas do jogador que é uma das maiores lendas do futebol brasileiro e considerado até hoje como o maior driblador de todos os tempos.

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Apesar da maioria dos torcedores brasileiros considerarem Mané Garricha como negro, segundo a Fundação Nacional do Índio (Funai), o jogador era descendente direto da comunidade indígena Fulniô, que se estendia pelo agreste pernambucano e alagoano. Mas, segundo as crenças de seu povo, o Eterno Camisa 7 não poderia ser considerado como representante da etnia porque lhe faltou cumprir o fechadíssimo ritual sagrado Ouricuri, falar a língua nativa yaathe e viver na aldeia.

A origem de Garrincha torna ainda mais emblemática a conquista da Copa do Mundo de 1958, quando o Brasil superou, segundo a crônica esportiva daquela época, o Complexo de Vira-Lata unindo simbolicamente “os três povos formadores da civilização brasileira”: o preto, o indígena e o europeu, representados por Pelé, Garrincha e Bellini - o filho de imigrantes italianos que levantou a Taça Jules Rimet acima da cabeça, num gesto que foi imortalizado e copiado por todos os capitães campeões mundiais desde então.

Apesar de serem conhecidas as histórias de dificuldades de Edson Arantes do Nascimento desde Três Corações (MG) e de Manoel Francisco dos Santos em Pau Grande (RJ), chama atenção o fato da ancestralidade de Mané Garrincha ter sido negada pela tradição de seu próprio povo e ter sofrido um apagamento histórico ao longo de sua existência. Sua origem veio sendo resgatada em obras mais recentes, como "Garrincha, a Flecha Fulniô das Alagoas" (2014), escrita pelo jornalista alagoano Mário Lima, e por textos mais atualizados na imprensa.

Engana-se, porém, quem acha que Mané Garrincha representa um ponto fora da curva entre atletas vencedores de origem indígena no futebol. Lembremos o caso do lateral José Sátiro do Nascimento, nascido na aldeia Xucuru Kariri, em Palmeira dos Índios (AL), apelidado como Nena Goiaba e depois Índio, descoberto numa peneira do Vitória e ter alcançado sua glória no Corinthians, onde conquistou dois Campeonatos Brasileiros (1998 e 1999), dois Paulistas (1999 e 2001) e um Mundial de Clubes (2000). O atleta passou por mais de uma dezena de equipes, jogando inclusive na Coreia do Sul, Grécia e Peru. Após deixar o futebol, Zezinho (ou Iracanã) voltou à aldeia, agora no sul de Minas Gerais em função dos conflitos de terra, onde vive com familiares e atua como professor.

Ídolo e consagrado também no Corinthians, onde conquistou a Libertadores da América e o Mundial de Clubes da Fifa (ambos em 2012) e faz parte do elenco atual, José Paulo Bezerra Maciel Júnior, o Paulinho, passou por vários clubes em diversos continentes, como Tottenham, Guangzhou Evergrande, Barcelona, Al-Ahli e também disputou duas Copas do Mundo (2014 e 2018). Apesar de ter nascido em São Paulo, o vitorioso jogador faz questão de dizer que descende da comunidade Xucuru (PE) - um povo irmão dos Fulniôs - que nunca reconheceram publicamente a origem indígena de Mané Garrincha.

Legado ancestral

A falta de representatividade de nossos povos originários nos esportes é muito mais complexa que o simples preconceito ou apagamento, pois decorre também da dificuldade de encontrá-los em suas comunidades, embora existam projetos e organizações com este propósito. Seja como sinal de intolerância, no Brasil, quase tudo que se refere aos povos indígenas ainda sofre ataques e o mais grave é que, em um país marcado pela miscigenação, os povos originários tiveram sua história, costumes e língua propositalmente apagados. E no esporte não tem sido diferente, com raros registros oficiais.

Mas se os personagens seguem ocultos, a vibração dos jogos e brincadeiras tradicionalmente indígenas fazem parte de nossa cultura do dia a dia. Afinal, é dos povos originários que vêm competições como tiro com arco e flecha, corrida de tora, arremesso de lança, cabo de guerra, canoagem, akô (semelhante à prova de velocidade 4x400m do atletismo), peteca, queimado, bolinha de gude, briga de galo, entre outros.

E se é possível apostar, podem ter certeza que eles brilharão muito nas competições que se aproximam. Em breve, trarei nomes para serem observados e acompanhados com muita atenção, principalmente nas modalidades olímpicas.


				
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Imagem ilustrativa da coluna Tabus, tretas e troças com Sílvio Tudela
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