O topo da tabela do Campeonato Brasileiro foi definido antes que todas as rodadas terminassem e o Flamengo garantiu o seu oitavo título (1980, 1982, 1983, 1992, 2009, 2019, 2020 e 2025) ainda na penúltima rodada, ao vencer o Ceará e neutralizar qualquer reação do Palmeiras, que vinha logo atrás e até fez a sua parte com uma goleada sobre o Atlético-MG. Mas, como quase sempre acontece, o desfecho do campeonato não se escreveu com taças e fogos, e sim com lágrimas, silêncio e incredulidade. A verdadeira decisão estava na parte inferior da tabela.

A última rodada começou com um mapa claro do drama: Internacional e Vitória dentro da zona de rebaixamento, precisando de vitória e combinações improváveis; Fortaleza, Ceará e Santos fora do Z4, dependendo apenas de si, mas ainda sob risco. E ainda havia clubes com chances meramente estatísticas de cair, como o Atlético Mineiro e o Vasco. O futebol, no entanto, detesta lógica excessiva e, em 90 minutos finais de pura crueldade esportiva, o roteiro foi reescrito com requintes de tragédia - e com sotaque cearense.
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O Fortaleza caiu lutando. O Leão do Pici passou boa parte do campeonato rondando o abismo, mas encontrou forças onde parecia não haver mais. O time entrou na zona de rebaixamento na 11ª rodada e só chegou a sair da faixa da degola na penúltima partida, após emplacar uma série de nove jogos sem perder. Fez uma arrancada final impressionante, chegou à última rodada dependendo apenas de si, carregando a esperança de quem acreditou até o fim. Mas o futebol não premia intenção, nem justiça poética. Diante do Botafogo, quando menos podia, o Fortaleza sucumbiu. Caiu de pé, exausto, mas digno. A dor ali é conhecida: a de quem luta, sangra, reage, mas não alcança a margem.
Já o Ceará viveu uma dor ainda mais difícil de explicar. O Vovô atravessou 37 rodadas sem pisar na zona de rebaixamento. Administrou riscos, escapou de tempestades e chegou à última jornada acreditando que o pior já havia ficado para trás e não haveria riscos. Não ficou. A derrota para o vice-campeão Palmeiras foi suficiente para empurrar o clube para a Série B. Um rebaixamento que não se desenhou aos poucos, mas que caiu como um raio em céu azul. A perplexidade dói mais do que o cansaço. É o sofrimento que chega quando ninguém está preparado para sofrer.
Diante desse cenário de tragédia do futebol de um dos estados mais queridos do Brasil, é impossível não lembrar de Luiz Gonzaga e da eterna “Súplica Cearense”, quase como se a música tivesse sido escrita para momentos como esses. O futebol também conhece bem o pedido contido na canção, aquele apelo para que “a seca não seja tão grande” e para que a dor não ultrapasse o limite do suportável. No fim, torcer é isso: pedir, em silêncio ou em grito, que o castigo seja menor, que o amanhã chegue mais leve.
O esporte - e o futebol, em especial - tem essa capacidade quase cruel de nos levar do controle absoluto à completa impotência. Ele constrói narrativas que não respeitam estatísticas, campanhas anteriores ou merecimento. Em uma final de tarde de domingo, ele cobra tudo o que parecia esquecido. Em outra, devolve o que parecia perdido.
Para Fortaleza e Ceará, resta agora o luto esportivo. Mas também resta a história. O futebol é cíclico, como a vida que Luiz Gonzaga cantou com tanta sabedoria. Há tempos de estiagem e tempos de colheita. Cair não apaga identidade, nem diminui torcida, nem anula trajetórias. Pelo contrário: às vezes, é no fundo que se aprende a subir mais forte. Que a dor desta queda vire aprendizado. Que a súplica vire promessa. E que, como no sertão de Gonzagão, depois da noite mais dura, a esperança volte a cair, nem que seja em forma de garoa.
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