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Daniela Mercury e 'Cabeça de Nós Todos' em visita a Rádio Bahia Fm |
Com 20 anos de carreira, 15 anos de turnês internacionais, 14 CDs gravados e seis DVDs. Daniela Mercury comemora em 2012 os vinte anos de 'O Canto da Cidade', seu segundo CD solo, que vendeu dois milhões de exemplares, atingindo a marca de disco de diamante no Brasil. Além do sucesso com este álbum, em 2007 foi ganhadora do Grammy Latino pelo trabalho 'Balé Mulato'. Seu álbum mais recente é 'Canibália', onde a artista presta uma homenagem a Carmen Miranda, cinema nacional, os negros e os índios. Em passagem pela Bahia Fm, a cantora Daniela Mercury conversou com o
iBahia sobre o projeto 'Geração Canibália', a parceira com os músicos do grupo Cabeça de Nós Todos, a comemoração dos 20 anos do 'Canto da Cidade', e ainda sobre atuação em palestras, Carnaval e Verão.
iBahia - Como surgiu a ideia de fazer parceria com a ‘Cabeça de Nós Todos’? Daniela Mercury - Surgiu porque fiquei encantada com algumas músicas do disco promocional deles. Encontrei os meninos, os chamei para ouvi-los como compositores. Eram tantas canções maravilhosas, tantas músicas que me encantaram que eu disse vamos gravar um trabalho juntos? Como eu tenho um estúdio, combinamos de gravar cinco músicas, dessas cinco já são 13, que virou um CD com previsão de lançamento em março de 2013. Gravamos também imagens para que virem material de divulgação em vídeo, talvez se torne até um DVD ou clipes lançados exclusivamente para internet. Estou me sentindo como se estivesse na 'Companhia Clic' de novo, curtindo essa diferença em trabalhar em grupo.
iBahia - Como será esta apresentação do Geração Canibália? DM - Será um workshop-show misturando performance, pintura, teatro e circo. A gente vai trocando e gerando experiências com o público os convidando pra fazerem parte de um laboratório de teatro, para fazerem papel, não no palco, mas no próprio espaço. A ideia é diminuir o máximo esta distância entre o palco e o público. Teremos 60 atores, grupos de teatro, transformistas, o musical 'Éramos Gays', além das participações de Ludmillah Anjos (The Voice Brasil) e Gabriel Povoas, filho da cantora. Sugiro que o público vá com roupas confortáveis, como se estivessem indo para um parque de tarde para fazer uma experiência corporal. O espaço das artes é assinado por Iuri Sarmento, onde as pessoas poderão se pintar, elas vão fazer um laboratório de artes conosco durante o show.
"As pessoas poderão se pintar, elas vão fazer um laboratório de artes conosco durante o show" |
iBahia - Você e o grupo 'Cabeça de Nós Todos' vão fazer turnê com este trabalho? DM - Sim, estou com três shows marcados no Rio de Janeiro. A minha ideia é que este projeto fique o ano inteiro em paralelo a minha turnê 'Canibália - Ritmos do Brasil', mas que a gente faça esses 'happiness' no Brasil inteiro.
iBahia - Além dos ensaios, já tem algum outro projeto para o Verão? DM - Tem o camarote da Rainha que está na segunda edição e acontece no dia 2 de fevereiro, no dia de Iemanjá, no Alto do Andu, mas será realizado com a minha banda, pois é um show mais de carnaval.
iBahia - Você está comemorando 20 anos da música 'O Canto da Cidade'. O que mudou na Daniela daquela época para a Daniela de hoje? DM - Diz Mia Couto, um grande autor moçambicano, que a gente passa mais tempo do que a própria vida para se modificar. Na essência eu sou a mesma menina de Brotas que queria me expressar e continua aqui querendo fazer minha cidade ser reconhecida por sua arte. Os compositores populares são os que mais me emocionam, estar com eles, meninos novos, é a mesma coisa que eu fiz desde o começo, é cantar a gente, acreditar na gente, mas sou uma mulher mais serena, muito realizada, muito feliz e agradecida por tantas coisas extraordinárias que vivi nesses anos. Com muito mais a viver, porque sou muito jovem, mas é gostoso pensar nesses 20 anos, pensar em tantas coisas que realizei, com tanta energia, com tanta dedicação, com tanta entrega, me emociona muito isso.
iBahia - Você é conhecida por levar apresentações espetaculares para as ruas durante o carnaval de Salvador. Pode nos adiantar algo para a folia de 2013? DM - Eu ainda estou pensando, temos os 20 anos do Canto, sem dúvida esses vinte anos vão estar presentes, vou celebrar com minha cidade. Minhas provocações que ainda não finalizei todos os detalhes também estarão durante a festa, a 'Cabeça de Nós Todos' irá participar um dia de Carnaval comigo. Ainda estou pensando nas performances específicas para apresentar, assim que acabar o 'Geração Canibália' que vai me inspirar a pensar alguma coisa, pois estou conhecendo grupos de teatro, diretores importantes que vão estar comigo neste projeto assim conseguirei finalizar as ideias para o Carnaval.
"Os 20 anos do Canto da Cidade e o 'Cabeça de Nós Todos' vão estar presentes no Carnaval comigo" |
iBahia - Além dos projetos musicais, Daniela Mercury está com algum projeto em outra área? DM - Estou fazendo palestras sobre cultura, comecei em Belo Horizonte palestrando para empresários sobre o mercado criativo brasileiro. Tenho estudado muito sobre os conceitos de cultura, mas por enquanto a minha dedicação está em estudar, como estou com outros projetos acontecendo, para poder dominar ainda mais do que eu já conheço os números do mundo, o olhar sobre cultura e os conceitos. Para poder ver se o Brasil próspera nessa área porque eu acho que a gente ainda se vê de uma maneira pouco profissional... os governos, as prefeituras acham que a cultura precisa de apoio quase como caridade e não é verdade, é um mercado pujante, importantíssimo para o desenvolvimento do país. Eu tenho todos os números do mercado cultural, o Brasil começou a medir os seus números agora, a partir do convênio que a presidente da República fez com o IBGE.
"Os governos, as prefeituras acham que a cultura precisa de apoio quase como caridade e não é verdade, é um mercado pujante" |
iBahia - Como você enxerga o investimento no Carnaval baiano?DM - A gente gera um bilhão de reais no Carnaval, mas a prefeitura não investe absolutamente nada, ela diz que investe, mas a visão é na verdade de tentar não gastar com o Carnaval, que é uma festa que gera muito dinheiro para prefeitura e governo.A prefeitura investe 20 milhões em recursos e ajuda, mas não é que ela gasta, o valor é disponibilizado em serviços que já são contratados pela prefeitura como de limpeza, de organização de banheiro... E dizem gastar 20 milhões, mas só que eles arrecadam 17 milhões somente de patrocínios de empresas, competindo com os próprios artistas que tem isso somente para se viabilizar no carnaval, sem isso a gente não vai pra rua.
iBahia - Como é a relação da prefeitura com os artistas do Carnaval?DM - A prefeitura hoje briga com os próprios artistas que são conteúdo que eles estão vendendo, porque sem o nosso conteúdo não tem Carnaval, e três milhões são impostos diretos... então eles empatam a conta, não gastam um real pra fazer o Carnaval da Bahia. De alguma forma dificultam a captação de recursos dos artistas grandes que estão se viabilizando com muito esforço e correndo de 80 a 90%. O governo também investe 20 ou 30 milhões, mas a gente gera um bilhão de faturamento, quer dizer praticamente tudo com iniciativa privada, então é preciso dar valor a isso, é preciso reconhecimento parar de tratar-nos como se nós tirássemos da cidade.
"A gente gera um bilhão de faturamento, quase tudo com iniciativa privada, então é preciso dar valor a isso" |
iBahia - E de que maneira você se vê nesse cenário?DM - Só o sucesso de 'O Canto da Cidade' trouxe mais de 500 mil pessoas para o Carnaval, o sucesso do axé dobrou o número de turistas na cidade, sabe quanto a gente gera pra cidade de recursos econômicos para os hotéis todos lotados, as cia. aéreas, os restaurantes, todos os benefícios que a música tem trazido, a propaganda? Só eu trago 30 milhões de mídia espontânea por Carnaval.
"O que o governo coloca de serviço, eu sozinha pago em mídia espontânea de divulgação da cidade para o mundo todo" |
Quer dizer, o que o governo coloca de serviço, de polícia, eu sozinha pago em mídia espontânea de divulgação da cidade para o mundo todo, e ainda não temos a medição de internet, se colocarmos internet vai ser muito mais do que 30 milhões. Imagine juntando eu, Ivete, Chiclete, Claudia, todos os grupos e todos os artistas quanto serviço que a gente presta pra cidade.
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Daniela Mercury no Carnaval 2012 |
iBahia - Qual o seu maior desejo referente à cultura?DM - Queremos ser vistos como parte dessa cidade, como gente que trabalha aqui, que ficou aqui, que fizemos os nossos escritórios aqui então é uma indústria importantíssima. É por isso que eu estou dando essas palestras não só para falar especificamente disso, mas pra falar da importância do conteúdo cultural para o desenvolvimento dos softwares, do desenvolvimento do mercado de tecnologia do Brasil, para a identidade brasileira, para divulgação no exterior do que é o Brasil, porque sem isso a gente não vai aproveitar essa Copa e essas Olimpíadas.Sem olhar para nós de uma maneira diferente, sem falarmos de nós e nos tratarmos como gente de extrema competência no mundo, que qualquer país gostaria de ter artistas, blocos e empresários como nós. Se estivéssemos nos Estados Unidos seríamos tratados de outra maneira, eu não quero falar como reclamação, falo estas coisas porque acho que chegou a hora de trabalharmos juntos por uma consciência.
iBahia - E de que maneira os governos podem melhorar esse investimentos, na sua opinião?DM - Eu acho que o governo, a prefeitura e a cidade querem o mesmo que a gente, que é ver a cidade prosperar, desenvolver, as pessoas bem, a gente quer trazer as novidades artísticas, quer fazer desse lugar cada vez mais de maior destaque no mundo, quanto mais sendo embaixadora da copa do mundo. A gente já faz isso normalmente com turnês mundiais são 17 anos divulgando a Bahia fora do Brasil sem receber nenhum apoio de Emtursa, nem Bahiatursa, nem nada, pelo contrário eu sempre apoiei o trabalho deles então assim é só um exemplo de como nós devemos ser visto, não só nós, mas toda a industria criativa do Brasil pra que nós nos levemos a serio e façamos disso um manancial de desenvolvimento para o Brasil. Não só eu, mas todos que desenham os softwares, todas as pessoas que fazem essa internet criativa que o Brasil tem.
iBahia - Como você avalia a política cultural do Brasil em comparação ao mercados internacionais?DM - Nos Estados Unidos, nenhum filme passa nos cinemas sem ser dublados em inglês, e a gente deixa fazer programa de televisão com todo mundo cantando em inglês. Temos hoje mais de 70% do mercado brasileiro de música, mas se não cuidarmos a gente perde isso. Os Americanos tem 50% do mercado de cultura do mundo, é maior do que a industria bélica, é muito maior porque eles dão mais valor ao valor de pensar, de disseminar a forma deles de pensar do que as armas, eles acham que isso é mais poderoso. A gente tem que pensar: como deixar um artista estrangeiro vir cantar a música da Copa?
"A gente tem que pensar: como deixar um artista estrangeiro vir cantar a música da Copa?" |
Porque isso é uma afronta a cultura brasileira, não estou falando por mim não, pode ser qualquer artista fazendo isso, mas isso é proteção da nossa identidade, é cuidar da gente, cuidar do que é nosso sem radicalismos, sem deixar de absorver tudo que é melhor do mundo, mas é a gente valorizar o que é nosso, sair dessa sombra europeia que era cantada nos anos 20.O movimento antropofágico foi para sair dessa sombra, mas até hoje a gente vive achando que os Estados Unidos e a Europa são melhores do que nós em termos de arte, a gente é diferente, eles tem vantagens como países desenvolvidos e muitas outras coisas que a gente ainda não tem em relação aos direitos humanos e em relação a outras coisa. Mas em termo de arte, a fazemos um trabalho de primeiro mundo, basta ver isso e tratar o mercado cultural de maneira mais profissional que não existe sem um olhar mais consistente como se faz com qualquer indústria.
"Até hoje a gente vive achando que os Estados Unidos e a Europa são melhores do que nós em termos de arte" |
Por isto que a lei que eu fui reivindicar de descontos de impostos para exportação de cultura, pois a taxa de imposto para exportação de cultura é altíssimo, e as pessoas sem conseguirem divulgar o Brasil lá fora. Quando eu descobri que tinha subsidio para outra industrias, porque que a cultura não tem este tipo de desconto? O comitê de educação da Câmara já aprovou por unanimidade, espero que o Senado aprove pra que a gente tenha este benefício e não pague imposto caro para levar um show a outro país. Dezenas de atitudes podem melhorar muito esse nosso mercado, não só pensando de forma individual e sim pensando coletivamente em termo de país. É só aproveitarmos as experiências e tentarmos resolver as questões como por exemplo o Carnaval, pois todo mundo acha que a gente explora a rua. Engraçado, o asfalto está lá e não existiriam dois milhões de pessoas no Carnaval se não fossemos nós e ainda somos vistos com rancor, como se estivéssemos tirando alguma coisa de Salvador. Não, a gente só dá.
"Dezenas de atitudes podem melhorar muito esse nosso mercado, não só pensando de forma individual e sim pensando coletivamente" |