A tranquilidade de Mariene de Castro, 30 anos, é visível para qualquer pessoa. Mas, ao bater um papo com a cantora percebe-se que ela é ainda mais tímida do que parece. Uma calmaria só. Cuidado a cada palavra e gesto. O cenário completa o espírito da artista: sua casa, na Praia do Flamengo, tem verde por toda parte e o silêncio só é quebrado, volta e meia, por passarinhos que por ali passam. Bem menos tímido do que a mãe, Pedro, 3, veio correndo receber a reportagem e ficou observando tudo.
Além de Pedro, Mariene é mãe de João Francisco, 13, de Bento, 1, e está grávida de sete meses de sua primeira filha. “Agora não penso em ter outros filhos, meu foco está na Maria”, conta a soteropolitana, que faz show de lançamento de Tabaroinha (Universal Music), seu terceiro álbum - segundo de estúdio -, hoje, no Teatro Rival, no Rio. Os ingressos estão esgotados há mais de uma semana. Depois, no Dia das Mães, 13 de maio, a turnê chega à Concha Acústica do Teatro Castro Alves, às 18h30. Os ingressos, que ainda não estão à venda, custarão R$ 20/R$ 10. No repertório de Tabaroinha, que foi todo concebido num estúdio móvel na reserva de Sapiranga, no Litoral Norte, canções de grandes mestres do samba. “Foi um mergulho musical num universo muito diferente do estúdio. Todos estavam comprometidos com o trabalho e montamos todo o repertório e os arranjos lá”. Sambistas - Em ritmo de samba-de-roda, A Pureza da Flor, de Arlindo Cruz, abre o disco, que segue com Filha do Mar, música inédita da cantora e compositora pernambucana Flávia Wenceslau. “Conto uma história neste disco. O nome é perfeito, pois dá a ideia de gravar outros compositores, mas com meu sotaque. A Bahia está ali”, diz. Os conterrâneos Dorival Caymmi (1914-2008), Nelson Rufino e Roque Ferreira também estão presentes. De Dorival, Mariene interpreta História Pro Sinhozinho. O samba Amuleto da Sorte, que já foi gravado por diversos nomes como Martinho da Vila, Nara Leão e Alcione, foi um presente de Rufino. De Roque Ferreira, ela gravou três canções: Foguete, Orixá de Frente e Ponto de Nanã. “Tenho uma relação muito próxima com Diogo Nogueira, Arlindo Cruz e Beth Carvalho. Já gravei com tantos nomes do samba, só faltava Zeca Pagodinho, mas agora participei do DVD dele”, comemora. Mariene, que faz aniversário dia 12, tem se destacado no cenário nacional e ganhou muito espaço, principalmente, no Rio. “Sempre fui muito bem recebida lá. O carioca já tem uma predisposição a gostar de samba, já na Bahia é preciso construir um público”. Mariene, que tem entre suas referências nomes como o Rei do Baião Luiz Gonzaga (1912- 1989) e Dorival Caymmi, diz não se importar com as comparações com a cantora Clara Nunes (1942-1983). “Clara cantou muito a Bahia, ela levantou a autoestima da nossa terra e isso vem no meu trabalho, pois canto a cultura do meu povo”, diz. Energia feminina - Com um barrigão, Mariene é só sorrisos ao falar dos filhos e diz estar ansiosa pela chegada da primeira menina, que deve nascer no começo de julho. “Ter filho é uma bênção e agora estou nesse universo feminino. Estou curtindo comprar sapatilhas, lacinhos, essas coisas de menina”. A cantora conta que cuidar de três crianças e administrar a carreira ao mesmo tempo não é fácil: “É uma gincana. Mas dá para fazer com alegria. Sempre que dá, eles viajam comigo”. E quando não está nos palcos, é exatamente disso que ela gosta: ficar em casa com os filhos. Filha de Oxum, Mariene traz colares e pulseiras sempre com ela. “Descobri que minha família tinha pessoas ligadas ao candomblé e eu sou, antes de tudo, uma pessoa de fé. Como gosto muito da natureza e o candomblé é ligado às forças dela, não tive como fugir”. Mariene começou como vocal de apoio de Carlinhos Brown, Timbalada e Márcia Freire. Em 1996, fez seu primeiro show-solo no projeto Pelourinho Dia e Noite. Vista por produtores franceses, foi para a França e se apresentou em mais de 20 cidades. No país, chegou a ser comparada pela crítica a Edith Piaf. Em 2004, Mariene conquistou o Prêmio Braskem de Música e teve a oportunidade de gravar seu primeiro álbum. Dois anos depois, foi convidada por Beth Carvalho para participar do DVD Beth Carvalho Canta o Samba da Bahia (EMI). Em 2010, lançou o disco Santo de Casa (Universal), gravado ao vivo num Teatro Castro Alves lotado e editado também em DVD.
Tambaroinha é álbum para se orgulharpor Hagamenon Brito* Entre 2005, quando lançou seu primeiro disco de estúdio, Abre Caminho, e Tabaroinha (Universal), muita coisa mudou na vida e na carreira de Mariene de Castro. De promessa, ela passou à condição de maior revelação feminina do samba no Brasil neste período, recebendo o aval de bambas cariocas como Beth Carvalho, Arlindo Cruz, Diogo Nogueira, Dudu Nobre e Seu Jorge. Não custa lembrar que, apesar do samba ter nascido na Bahia, foi no Rio de Janeiro que o gênero se urbanizou, criou identificação total com a população e gerou seus intérpretes mais famosos. Com seu canto forte e laços culturais verdadeiros, Mariene recria a ligação do samba tradicional baiano, com influência do Recôncavo, com o samba do Rio, que tem diferenças melódicas e rítmicas. E também não deixa de reverenciar ritmos de outros estados e ícones como Luiz Gonzaga (1912-1989), Dorival Caymmi (1914-2008) e Clara Nunes (1943-1983). Os elementos do candomblé, ressaltados no DVD Santo de Casa Ao Vivo (2011), aparecem em Tabaroinha de forma mais dosada, numa decisão acertada da produção dirigida por Alê Siqueira. Assim, Mariene escapa de um possível rótulo regional e se transforma numa intérprete de samba de todo o Brasil, mesmo sem esquecer a importância de cantar as coisas do seu quintal. O ótimo Tambaroinha é trabalho para se orgulhar. * Crítico musical e editor do CORREIO
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