De repente, no meio de um trivial engarrafamento, preocupado com o atraso para uma entrevista na Rádio Transamérica, surgiram as lembranças. Igor Kannário teve insights de um tempo que precisava de liberação do juizado de menores para cantar. Bons tempos, deve ter pensado, ainda que hoje desfrute de uma fama que parecia inalcançável.
“No Lagoa Mar e em outras casas de show eu não conseguia trabalhar sem o documento do juiz”, lembra, como se estivesse falando de um passado distante. E falava. Mas, peraí. Qual a idade desse jovem franzino de “cabelo viadinho pão com ovo”? (O status capilar é o próprio cantor quem dá).
“Tenho três ponto zero, pai”. Pois bem. Kannário estava falando de coisas de 20 anos atrás. Pouca gente sabe, mas o que é fenômeno hoje já tem mais estrada do que muito cantor consagrado. Kannário tem história no pagode. Tudo começou aos 8 anos. Com essa idade, tocava bateria e era backing vocal na banda Eclipse do Samba. O vocalista brigou com o produtor e ele tomou o microfone principal pela primeira vez.
Igor Kannário canta em programa de TV: há quem torça o nariz para seu trabalho, e há que festeje. Só não dá para ficar indiferente ao que ele faz (Foto: Marina Silva/Correio) |
Críticas
De lá para cá, consolidou sua quebradeira. Críticas às letras e à música de Kannário existem aos montes. Mas, musicalmente falando, há gente gabaritada que atesta sua qualidade. “A música está precisando de transgressão, transgressão essa que ele traz, deixando muita gente de nariz torcido. Sempre quem transgredir vai sofrer algum tipo de preconceito. Talvez desse preconceito surja uma nova música”, afirma o produtor musical Luciano Calazans, que já tocou e gravou com várias estrelas da música brasileira.
O poeta e articulista James Martins enxerga tanto talento no pagodeiro que chegou a chamá-lo para um recital de poesia. “Kannário é tão notoriamente talentoso que mesmo Márcio Victor, o mais dotado artista do pagode baiano, foi influenciado por ele. O cara tem o tempo e a pegada do samba, por isso empolga. E ele canta bem. Tanto que tem voz rouca, mas foi quem introduziu os trinados superagudos no pagode”, analisa. James refere-se a uma espécie de efeito natural que Kannário tem na voz.
Carreira
Depois do Eclipse do Samba, Kannário passou por Coisa do Samba, Patrulha do Samba, Swingue do P, A Bronkka e, de dois anos para cá, apostou no talento solo. Mas a galera que compõe a banda, inclusive os bailarinos, é a mesma de sempre. O acompanham fielmente desde a infância e adolescência. “Tirando o backing vocal, a rapaziada é toda formada por amigos de infância do gueto. Até o pessoal do balé, eram bailarinos de largo e foram se profissionalizando”, conta Kannário. Seu maior ídolo? Lu Costa, do grupo Nossa Juventude. “Fui presidente do fã-clube dele. Canta muito”, elogia.
O apelido Kannário é obra do cantor romântico Belo. “Belo olhou para minha cara e para minhas pernas finas e largou: ‘ele é magrinho e canta igual um canário’. Aí pegou”, diz. Hoje Kannário só canta, mas diz saber tocar também. “Toco tudo de percussão. Mas no palco gosto de dirigir, de criar, de enlouquecer a galera”. Mas sabe que para isso precisa dos outros 14 que sobem no palco com ele. Tanto que, na saída de uma das entrevistas, teve uma conversa em particular com todos dentro da van, agora cheia. Depois, entregou o assunto. “Tava falando com eles para terem paciência e profissionalismo. Nossa hora chegou!”, avalia.
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