Em junho deste ano, o Arquivo Nacional, em Brasília, abriu alguns dos papéis da ditadura para o público. Neles, todos os grandes nomes da cultura brasileira das décadas de 60 ou 70, foram acompanhados de perto pelos órgãos de segurança. As informações foram obtidas pela Folha de São Paulo. De acordo com estes documentos, Chico trazia de Portugal discos italianos e portugueses, livros e uma correia de violão com a inscrição "Cuba". "Confiscaram praticamente toda a nossa bagagem", confirmou o compositor à Folha, por e-mail. Após responder a um questionário com mais de 70 itens, Chico foi liberado. "Fomos intimados para novo depoimento na semana seguinte", recorda o compositor. Francisco Buarque de Hollanda foi o artista brasileiro mais monitorado pelos órgãos da repressão. Todas as informações sobre sua carreira artística está documentada em relatórios produzidos por órgãos de Marinha, Exército e Aeronáutica, além das Polícias Civil e Federal. As mais de 700 fichas com referências ao compositor, contêm ainda os "dossiês pessoais", com todos os dados disponíveis,de acordo com a Folha.
Os papéis do Arquivo Nacional mostram que, além de censurar previamente, a ditadura infiltrava agentes que comentavam sobre as peças, shows e espetáculos. Caso fosse constatado que canções ou danças folclóricas, por exemplo, tivesse eventuais safadezas, poderia o artista, ser censurado. Como foi o caso de um samba de roda cantado num show do Caetano, "no qual fazia referência aos olhos e os artistas presentes colocavam as mãos nos olhos, boca, idem, as mãos na boca, e finalmente dizia no 'lelê, lalá' e os artistas colocavam as mãos no sexo", registrou um araponga. Caetano Veloso, frequentemente chamado de "homossexual" nos relatos da repressão, foi monitorado até no exílio em Londres. De acordo com os documento oficiais obtidos pela Folha, o agente da ditadura relata uma apresentação dele, em novembro de 71, no Queen Elizabeth Hall. Ele nota que "80% dos espectadores eram brasileiros" e registra forte discurso do cantor "contra a Revolução". "Nunca imaginei que houvesse alguém da repressão no show do Queen Elizabeth Hall", afirmou Caetano à Folha. Um dos relatórios mais detalhados da repressão diz respeito à histórica apresentação de Chico e Caetano no Teatro Castro Alves, em Salvador, nos dias 10 e 11 de novembro de 1972. A repressão esteve presente nos dois dias, atestam os documentos, feitos a pedido do Exército e da Aeronáutica e assinados por inspetores da PF baiana. "A referida apresentação [tem] cenas que feriam a moral das famílias ali presentes, bem como atitudes do sr. Caetano Veloso, que, de certa forma, indispôs o público contra as autoridades presentes", diz o documento. E segue: "Podemos observar quanto a Caetano Veloso: pintado de batom e com trejeitos homossexuais; [...] cabe-me salientar que Caetano, embora usando de uma afetação um tanto exagerada, muito mais apropriada para uma pessoa do sexo feminino, provocando até algumas vaias do auditório, tendo cantado músicas que, ao meu entender, nada apresentam de anormal."
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