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Personagem mórbido de Gerbelli é o prato cheio de 'Em Família'

Atriz consegue trafegar pelo desequilíbrio mental sem caricatura, sem exageros e sem remeter a outros personagens vistos na TV

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28/04/2014 às 11:52 • Atualizada em 31/08/2022 às 22:46 - há XX semanas
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Na novela das nove, Vanessa Gerbelli brilha na pele de Juliana, uma mulher complexa, desequilibrada e, sobretudo, humana. Foto: Cynthia Salles | TV Globo
A Ana, personagem de Cássia Kiss em 'Barriga de Aluguel' (Glória Perez, 1990), tinha um casamento feliz, mas não conseguia, em hipótese alguma, engravidar. Depois de diversas tentativas frustradas, decidiu contratar a personagem de Claudia Abreu, a Clara, para gerar uma criança. A moça, embora tenha firmado compromisso e ficado muito satisfeita com a quantia oferecida, se recusou a entregar o bebê para a contratante e o caso foi parar nos tribunais. Anos mais tarde, a teledramaturgia recebeu de braços abertos a maquiavélica Nazaré, interpretada pela atriz Adriana Esteves na primeira fase, e por Renata Sorrah na segunda fase da novela 'Senhora do Destino' (Aguinaldo Silva, 2004). Porque não conseguia engravidar, a bandida optou por um caminho mais fácil: roubar o bebê da protagonista Maria do Carmo (Carolina Dieckmann/Susana Vieira) para dar um golpe da barriga no amante, largar a vida de prostituta, e se tornar esposa. Mas, com o passar dos capítulos, cuidando da menina sequestrada com todo carinho e educação, se convenceu que era mãe dela e dispôs a passar por cima de tudo e de todos para manter a mentira debaixo do tapete. Tipos como esses, de personagens obcecadas pela maternidade, que acreditam que os fins justificam os meios, já renderam outras histórias emocionantes e inesquecíveis nos folhetins. É o que acontece na novela 'Em Família'. Há pouco mais de dois meses bordada a mão pelo autor Manoel Carlos, a trama, em cartaz às 21h, na Globo, traz à tona o drama de Juliana, vivido pela atriz Vanessa Gerbelli, uma mulher que tem o dom da maternidade, quer ser mãe a qualquer custo e, para tanto, não mede esforços para isso: suborna, manipula, mente, rouba e chantageia. É um poço de desequilíbrio tão quanto às mulheres histéricas interpretadas pela atriz americana Gena Rowland. Na trama, Juliana se casou com Nando (Leonardo Medeiros) com o propósito de gerar um filho e nada mais. Engravidou três vezes contrariando a vontade do marido de curtir o casamento por mais algum tempo, montou o enxoval do bebê com todo amor, mas acabou sofrendo abortos espontâneos. Frustrada, resolveu adotar a qualquer preço a filha da empregada, que morreu atropelada nos primeiros capítulos da novela. A madame tentou fazer a adoção ao modo tradicional, mas a avó materna não deu trégua. A solução é uma particularidade folhetinesca: com um casamento morno, Juliana decidiu se separar de Nando e, como não é boba, tratou de se casar com o viúvo da empregada, um malandro, arquitetando ficar mais próxima da menina. A partir daí vive às turras com o novo marido, engravida, mas teme perder novamente o bebê, o que acaba se tornando combustível para novos conflitos. A interpretação de Vanessa Gerbelli, até aqui, é o prato cheio da novela. Ela consegue, a cada diálogo realista de Manoel Carlos, trafegar pelo desequilíbrio mental sem caricatura, sem exagerar e sem remeter a outros personagens vistos na telinha. Juliana não tem paz de espírito para poder lidar com a incapacidade de ser mãe e por conta disso se transformou numa mulher fraca, doente, em crise, descontrolada, que não aceita interferência da família. As ações dela são dramáticas e profundas e a atriz se sobressai justamente por não ser do tipo de personagem boa, nem ruim e muito menos moralista ou hipócrita. Ela é humana e decalca o retrato de muitas mulheres que podem ser facilmente encontradas nas ruas, na fila da padaria, em um supermercado ou num banco. A carga intensa dada ao personagem se deve, principalmente, à pressão social que muitas mulheres na realidade têm para gerar um filho. Visto como um dom inerentemente da natureza feminina, ainda que ultimamente muitas abram mão de ter filhos ou deixem para mais tarde em nome de outros objetivos, não gerar a vida pode causar transtornos emocionais graves, além de fazer com que a mulher se sinta rasa e incapaz. E é nessa controvérsia que Vanessa Gerbelli embala Juliana. O público entende, no meio da loucura dela, que por trás de tantas neuroses e desequilíbrios, existe sempre uma grande amargura, uma fragilidade. A personagem não é uma simples mulher que quer muito ter filhos, é uma mulher que passou a vida inteira alimentando esse desejo e se vê perdida ao perceber que está avançando na casa dos quarenta anos e não alcança o que sempre quis, o que a leva a não entender o sentido de sua vida, e, portanto, explica a dor estagnada nos olhos. Na novela 'Em Família', o envolvimento do telespectador se dá por linhas tortas. A protagonista Helena (Julia Lemmertz) é, de longe, a personagem feminina mais desinteressante do folhetim. Inexpressiva, bem-educada, elegante, seu drama de mulher casada e insatisfeita que não consegue esquecer o amor pelo primo, que foi seu noivo na juventude, não chama atenção. Personagens nada sensatos, como é o caso de Juliana, a louca, despertam interesse pelos seus comportamentos mórbidos. Manoel Carlos sabe, como nenhum outro autor, escrever personagens com conflitos e diálogos que tenham "doença na alma". Assim, Juliana não é só uma mulher chata e perturbada jogada em uma sinopse de novela – é uma doente psicologicamente em fase terminal. Em Família Direção: Jayme Monjardim Quando: Segunda a sábado, às 21h, na Globo *Texto opinativo e colaborativo, supervisionado por Aline Caravina

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