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NOVELAS

Choque da responsabilidade do amor versus liberdade eterna

A nova das seis estimula que o personagem reflita sobre seus atos diretamente junto ao telespectador e vice e versa

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13/03/2015 às 23:44 • Atualizada em 01/09/2022 às 23:13 - há XX semanas
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A primeira impressão que se tem ao assistir os capítulos da semana de estreia de Sete Vidas, a nova novela das 18h da Globo, é que encenação e realidade se complementam. A obra de Lícia Manzo, com direção de Jayme Monjardim, é uma novela-crônica que carrega em seu enredo o cotidiano urbano e sustenta em seus diálogos uma sutileza assustadora nas tramas embargadas pela família e relacionamentos contemporâneos complexos, coisa que, na teledramaturgia, só Manoel Carlos consegue fazer. Sete Vidas, que poderia ser apenas um estudo de comportamento humano, acaba, sem muito esforço, com um instrumental aqui e uma frase certeira ali, indo além, e faz, com naturalidade e realismo, com que o personagem reflita – com equilíbrio e bom senso – sobre seus atos diretamente junto ao telespectador e vice e versa. Há muita verdade escapulindo no texto. Quem carrega nas costas o mote mais pesado, e até então dramático e interessante, é a personagem de Débora Bloch, a Lígia, uma jornalista de quarenta e poucos anos que planeja cada centímetro da vida para ser bem-sucedida. Nas cenas em que aparece, a personagem, em busca da felicidade idealizada, se mostra uma mulher madura, decidida, realizada profissionalmente.
A nova das seis estimula que o personagem reflita sobre seus atos diretamente junto ao telespectador e vice e versa
Mas, na vida amorosa pouco tem sorte. Seu namoro que já dura um ano com o personagem de Domingos Montagner, o Miguel, é cheio de altos e baixos. E daí ela, desesperada por conta do relógio biológico que desperta todos os dias, quer casar e ser mãe, o oposto de Miguel. Para não frustrar as próprias expectativas, ela se mostra sempre entregue, sempre apaixonada, sempre compreendendo, perdoando, amando loucamente sem pensar. Ela não quer ter apenas um marido. Ela quer um companheiro, um amigo, um pai para os filhos dela. O drama é mais real do que se imagina. Já Miguel, um oceanógrafo ecologista cinquentão, é um desses homens denso, pouco afeito a relacionamentos e de poucas palavras. Não quer machucar Lígia, mas acaba fazendo isso em pequenos detalhes. Faz a linha blasé, não sente muito, não se importa muito, não se interessa muito, não é capaz de dizer “eu te amo”, nem ao menos atropelado pela intensidade numa noite de amor. É quase parecido com um pedaço de concreto. Tem uma tendência ao isolamento, do tipo que consegue viver bem com a solidão, e tem dificuldade em estabelecer relações duradouras porque é narcisista e prefere a liberdade eterna do que a responsabilidade de um relacionamento sério, coisa aceitável para um discurso adolescente. Não é difícil encontrar esse tipo por aí. Com o relacionamento conturbado principalmente por causa da forma oposta de ver a vida, Lígia chega a se fazer de culpada e tenta, a todo momento, recomeçar. “A gente tinha tudo, eu que quis muito”, diz a Miguel como pretexto de consagrá-lo herói. Não raro, tenta um diálogo adulto, sai dos lugares desesperada, volta para casa chorando neurótica, pequena, feia, errada, perdida. É cheia de sentimentos e, quase sempre, pergunta para a irmã Irene (Malu Gali) se ela está louca. “Eu vejo nos olhos dele o quanto ele está dentro também”, desabafou Lígia em uma das cenas, tentando entender o comportamento do rapaz. Sete Vidas não impressiona tanto pela ideia central de irmãos biológicos que se encontram pela internet a partir do número de um doador de sêmen anônimo. Os relacionamentos humanizados, as tramas psicológicas profundas, que mais parecem ter saído de uma terapia, e os diálogos reflexivos são as armas que fazem a novela valer a pena. A atuação de Débora Bloch, Domingos Montagner, Malu Galli, Gisele Fróes, assim como praticamente todo o elenco, merece elogios. Há química, boas construções de tipos e composições afinadas. Se a direção de fotografia é de encher os olhos, assim como os cenários, a inclusão do jornalismo no roteiro, como as cenas da manifestação vistas no primeiro capítulo, é um acerto dos grandes. A vinheta de abertura, com a voz de Tiago Iorc embalando uma versão de "What a Wonderful World", em pequenos cortes de vídeo em mãos de passeios de bicicleta, tardes na piscina, bolhas de sabão, viagens, pipoca e formatura, é tão sensível, delicada e poética quando à trama. É de esperar que, numa overdose de textos inverossímeis em telenovela nos últimos tempos, Sete Vidas traga no vídeo o que o telespectador vê da vida diariamente. Coisa que, iludido, ele sempre cobrou.

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