Cinco vezes campeão brasileiro como jogador (quatro no Flamengo e uma no Vasco) e uma vez como técnico (Flamengo 2009), Andrade agora é técnico do modesto Jacobina, que volta à primeira divisão do Baiano após 20 anos. E está curtindo esse recomeço.
Treinar o Jacobina é um recomeço na sua carreira?
Na vida, estamos sempre recomeçando. É uma experiência nova para mim e estou muito motivado com o projeto, que tem como objetivo ficarmos entre os quatro primeiros colocados do Campeonato Baiano. Além disso, eu precisava sair do Rio, buscar novos ares e achei que era o momento de recomeçar.
O que pesou mais na hora de aceitar o convite?
Eu passei a vida toda viajando como jogador e técnico. Saí muito novo de casa, passei dois anos na Venezuela, na Roma, fora do Brasil. Depois, mais para o fim da carreira, rodei o Brasil inteiro e cheguei a ir para Mato Grosso, Maranhão, Espírito Santo. Minha vida sempre foi andando muito e minha família foi muito sacrificada, então eu nem vi meus filhos crescendo. Esse é o lado negativo da vida no futebol. No entanto, a minha vida é isso. Eu gosto de aventuras, desafios. Vivi a vida inteira baseado nisso e vir para o Jacobina foi mais um desafio que eu quis aceitar.
Você começou a carreira no Flamengo, sendo campeão brasileiro em 2009. Por que não continuou em times de ponta?
Na verdade, o que aconteceu em 2009 é que, logo depois de eu ser campeão brasileiro, houve eleições no clube. Na época, aconteceu o inesperado e o presidente Delair (Dumbrosck) não foi reeleito. Para a nossa surpresa, a Patrícia Amorim ganhou e ela decidiu trazer o pessoal dela, as pessoas de confiança. Acabei saindo e existiu muita sondagem e até especulações para fora do país, mas nada daquilo era concreto.
Há muitos flamenguistas no interior da Bahia. Houve muito assédio desse público?
É engraçado, porque quando encontro um flamenguista na rua, eles sempre falam comigo. Na semana passada, decidi passear no Pelourinho e até torcedores de Bahia e Vitória me abordaram, reconheceram, pediram uma foto. Isso eu acho muito interessante, porque vim de outro estado e estou sendo reconhecido. É fruto do trabalho que realizei durante muitos anos.
Dá pra superar o favoritismo de Bahia e Vitória?
Falando de Campeonato Baiano, Bahia e Vitória sempre serão favoritos e já sairão na frente, não tenho dúvida nenhuma disso. Só que nós estamos montando um time para jogar de igual para igual. Reconheço, sim, o favoritismo deles, até pela estrutura que possuem, por terem uma base do ano passado, mas vamos competir sem medo. Nosso investidor (Manassés) foi muito claro ao me convidar e dizer que me daria um time com condições para ficar entre os quatro melhores.
Quem é a estrela do time?
Não tem ninguém muito conhecido no futebol baiano. Mas acredito que Ananias, que é um garoto que veio de Portugal, Dinda, um meia que chega junto, o lateral-esquerdo Felipe, que veio do Rio, e o próprio Balu podem se destacar e encontrar oportunidades em times grandes.
Muitos atletas do interior usam o Campeonato Baiano como vitrine para chegar a um time maior. Você, como treinador, também tem essa pretensão?
Todo profissional que passa por aqui almeja uma contratação por parte de Bahia ou Vitória, os dois times de ponta da Bahia, que trazem visibilidade grande no futebol. Então, como todo profissional, claro que gostaria de trabalhar nessas duas equipes.
Você era um volante técnico, apoiava o ataque, tinha visão de jogo e grande movimentação, o que é difícil de encontrar agora. Como treinador, você procura esse tipo de atleta?
O futebol da minha época mudou muito. Antigamente, os times tinham apenas um volante, com dois meias mais ofensivos. Aqueles atletas mais clássicos, como Carpegiani, quase não existem mais. É muito raro jogador com talento e qualidade. Sinto muita falta de ver jogadores assim, porque é uma posição em que o atleta fica uns 70% do jogo com a bola passando por ele. Então, se ele não tiver qualidade, o time todo não joga direito. O volante tem de fazer o time jogar, fazer a leitura do jogo. Hoje, entre os grandes, só lembro do Lucas (Silva), do Cruzeiro, com essas características. Torço muito pelo sucesso dele para resgatar o futebol de antigamente.
Já encontrou algum jogador com esse perfil?
Vou ser muito sincero. Na verdade, só aqui no Jacobina fui encontrar um menino que se encaixa nesse perfil. Marcelo é um jogador que conhece da posição, tem leitura de jogo. Ele não é de muita pegada, mas tem potência, qualidade, bom passe e é muito técnico. A gente vê logo que é jogador formado para time grande. Se aproxima muito da época em que fui jogador.
Foi um choque sair da pressão e estrutura de time grande e estar no modesto Jacobina?
São experiências diferentes. Além do Flamengo, treinei Brasiliense, Paysandu, Boa Vista-RJ e São João da Barra-RJ. Essas experiências são louváveis. Temos que passar por isso na vida, porque é o que nos faz amadurecer, crescer. Essa experiência de treinar o Jacobina vai ser muito importante para a minha carreira.
O Jacobina já está pronto?
Temos 80% do time pronto e qualquer jogador que vier será para deixar o time mais encorpado. Gostaria de mais cinco ou seis reforços, para a gente montar um time forte. Nossa ideia é ter 28, 29 atletas. Sendo 25 de linha e quatro goleiros. Hoje, contamos com um corpo de 23 atletas.
Qual a reação dos meninos que estão começando e dão de cara com um dos maiores campeões do país?
Eles me enxergam como referência no futebol, até porque vim de classe humilde, passei por muita dificuldade e consegui chegar onde sonhei. Olham para mim e percebem que é possível realizar o sonho deles de jogar em um grande clube, como Flamengo e Corinthians. Um jogador desconhecido pode ser a grande estrela do Baiano.
Você já alcançou o sonho de quase todo treinador, que é conquistar um título brasileiro. Qual o seu sonho na carreira?
Meu sonho é que esses garotos realizem o meu sonho e sejam campeões baianos. Sei que é difícil, principalmente por ter times da grandeza de Bahia e Vitória, mas temos um sonho e um projeto sólido. Vamos lutar por isso.
Você disse que estará entre os quatro melhores. Quem serão os outros três?
Eu aposto em Bahia, Vitória, Jacobina e mais um. Eles que briguem entre si (risos).
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