O zagueiro Joãozinho está apreensivo. Difícil manter o olhar naquele corpo robusto, vestido numa camisa branca, com frisos azuis e vermelhos. Apelido tomado de empréstimo a uma inocente boneca da moda, Beijoca não tem nada de mimoso. Está mais para rock pauleira que chorinho ou bossa nova.
Na hora de subir do vestiário para o campo da Fonte Nova, atira a bola no rosto do zagueiro para avisar logo quem vai mandar no jogo. Joãozinho tem consciência do problemão que arrumou. Naquele Campeonato Baiano de 1976, o Vitória estava com a mão na taça. Havia conquistado as duas primeiras fases. Na decisão da terceira, tinha 1x0 no placar, um pênalti a favor e Romero, do Bahia, expulso. Joel Mendes pegou o pênalti de Osni e Beijoca fez o resto.
A lenda de Jorge Augusto Ferreira Aragão se fixou no imaginário da torcida a partir daquele dia 27 de junho de 1976. Era só a primeira fase do segundo turno. E o treinador Orlando Fantoni, católico fervoroso, fez questão de botar todo mundo pra andar 15 quilômetros até a Igreja do Bonfim. Valia agradecer a virada: 2x1. O Bahia ganhou tudo a partir dali e chegou ao título, graças aos gols heróicos de Beijoca em quatro Ba-Vis decisivos seguidos. A torcida ia para a Fonte Nova certa de fazer a festa, tal a confiança no seu guerreiro invocado.
Pecador - Filho de uma torcedora rubro-negra que até brigava pelo Vitória, Beijoca não teve lá uma juventude muito tranquila. Era melhor não irritar a revelação da escolinha do Bahia. Aqueles que ousaram, não se deram bem. Houve quem ficasse paralítico, depois de um banho em azeite fervendo, e outro perdeu uma vista com um murro.
Beijoca pegou 14 processos por brigas e confusões, se meteu com o lado mais obscuro dos bastidores do futebol, mas nada que uma boa Bíblia não resolva. Tornou-se servo do Senhor como um dia serviu à felicidade do povão tricolor. Antes de tornar-se ídolo do Bahia, Beijoca esteve no São Domingos de Alagoas e fez gols pelo Fortaleza. Do Bahia, foi para o Flamengo. Jogou no Vitória e na Catuense. O pecador arrependido não cometeria hoje os excessos que fizeram a fama de brigão. Mas o artilheiro repetiria, tudo outra vez, a briga dentro de campo para fazer do Bahia o campeão dos campeões.
Matéria publicada na edição impressa do jornal Correio do dia 4 de
fevereiro de 2011
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