Sabe essas pessoas que sempre têm motivo para achar graça das coisas da vida? Assim era França, lateral-esquerdo eterno do Vitória. Vítima de um acidente de carro em 1994, ele terminou seus dias negociando sucata na Avenida Suburbana. Em sua última residência, nas proximidades de um ferro velho, recebia seus fãs rubro-negros na maior alegria. Com dificuldade para manter a família e alimentar os filhos André e Adriana, França exibia o álbum de casamento, documento incontestável do tempo que ganhava bem como jogador.
Preparador Raimundo Barbosa, Luiz Motta, Fernando, Luiz Rangel, Valter, Agnaldo, França e o massagista Gaguinho. Agachados: Osni, Gibira, André Catimba, Almiro e Mário Sérgio
"Sabe, tive um colega que quando ficava de ressaca pedia sal de frutas... sabor manga!" Pronto, bastava uma brecha para encaixar uma de suas piadinhas, que de tão repetidas, às vezes ficavam sem graça, mas ninguém passava batido à gargalhada do lateral-esquerdo campeão de 1972. “É, meu irmão, sou meio perturbado mesmo. Tenho certeza que deixarei saudades”, dizia aos repórteres que o visitavam em busca de histórias do seu tempo de parceiro de Mário Sérgio, pela ala-esquerda do ataque do Vitória, uma dupla imbatível para sempre. França assumia ser “metido a palhaço” e, graças a este temperamento, era chamado à concentração até quando não estava relacionado. Ele animava o grupo. Carioca de Del Castilho, este marcador duro e tinhoso, 1,72m e 65kg, começou como zagueiro no Botafogo, mas se mudou para a lateral já no Flamengo: viu que a altura não ajudava. França veio para Salvador tentar a sorte e divertia-se lembrando do almoço de peixe frito com jaca, dieta inapropriada para um atleta, mas a única disponível antes de firmar o primeiro contrato com o Vitória em 1970. Outro perrengue que Francisco Olímpio de Oliveira Filho passou foi a coleção de inimigos, depois que pegou a posição no Vitória e quebrou a perna de Luís Alberto, do Bahia. Pelo rádio, os parentes do tricolor o chamaram de marginal e assassino. O presidente do Vitória, Pirinho, escondeu França na estância hidromineral de Dias D’Ávila, na Região Metropolitana de Salvador. Com três guarda-costas, lá se foi o lateral guerreiro e bem-humorado se internar junto com a mulher grávida. Depois que a confusão esfriou, França tentou visitar Luís Alberto e foi impedido pela família do jogador. Paranóia ou não, passou a ver inimigos por toda parte. Não foi fruto da imaginação o impacto do paralelepípedo que atiraram ao seu carro. Um França com mania de perseguição deixou de curtir os bregas da Montanha e da Conceição da Praia, hábito de jogadores do periodo. Nem saiu mais nas Muquiranas no sábado de Carnaval. Palhaço O bom futebol que superou a teimosia de treinadores como Jair da Rosa Pinto e Ricardo Magalhães já não aparecia tanto no Náutico. As piadas seguiam, mas França curtia mesmo era Salvador, para onde retornou ao pendurar as chuteiras. O ambiente das sucatas da Suburbana inspiravam nova gracinha. Conta outra, França: "Sabe aquele cara que veio consertar o carro outro dia? Pedi pra ele me ajudar a testar o pisca-pisca. Aí, quando eu acionei o botão, sabe o que ele me disse? Tá, não tá, tá, não tá, tá..." Esse é o França eterno que ficará na imagem dos rubro-negros: guerreiro em campo, palhaço fora dele.*Matéria publicada na edição impressa do jornal do Correio do dia 29 de janeiro de 2011Veja também:
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