A torcida ia rápida pro lado do fosso. Era Ricky encostar para a galera cantar. No woman, no cry, música de 1974 de Bob Marley. O reggae ganhava espaço em meados dos anos 80 e a canção embalou muitos gols do atacante na Fonte Nova. O mestre de cerimônia era o radialista Zé Bim, sempre de paletó e gravata, que puxava Ricky pelo braço pra galera.
Richard Daddy Owubokiri nasceu em Port Harcourt, na Nigéria, dia 16/7/1961. Teve como clube por dois anos o Sharks, sendo artilheiro da temporada 80/81, e depois foi ao ACB Lagos. Começou a jogar pela Nigéria aos 18 anos e estreou pela principal na Copa das Nações de 82, na Líbia, convocado pelo técnico brasileiro Otto Glória, que o trouxe ao Brasil, em 83, para o América-RJ.
Teve muitas dificuldades de adaptação. O trio ofensivo Gilcimar, Luisinho e Gilson Gênio não lhe dava espaço. No Brasileiro de 84, sete partidas e apenas um gol. O Vitória atravessava época dura. Em 83, jogou a Série B. Em 84, nada de Brasileiro e já eram seis jogos sem ganhar pelo Baiano: dois empates e quatro derrotas.
Quando finalmente a diretoria buscou contratar, trouxe para o ataque Framber e Ricky, ambos do América. A resposta foi imediata. Na estreia, na véspera de fazer 23 anos, Ricky marcou o gol rubro-negro no Ba-Vi, 1x1. Era o primeiro dos 65 em 98 jogos pelo Vitória.
Salvador era para o atacante como sua África. O calor, o jeito das pessoas, tudo o fazia sorrir outra vez. Com alegria nas pernas, esbanjou avelocidade que marcava a carreira. Feliz, flutuava para marcar gols de cabeça. Foi batizado “A Gazela Negra da Toca”. Nascia um ídolo. Acontece que a fama da máquina de sonhos chegou à Europa.
Em 86, Ricky, campeão e artilheiro do Baiano 85, foi pro francês Laval. Depois, Metz, Benfica, Estrela Amadora e Boavista, os três últimos de Portugal. Já tinha 30 anos e muitos duvidavam do reforço. Fez temporada memorável. Artilheiro do Português e segundo goleador europeu, atrás de Ally McCoist, do escocês Glasgow Rangers.
Fez inclusive cinco gols em Boavista 5x0 Estoril. Até voltou ao Vitória em 94, apresentado durante a inauguração dos refletores do Barradão. Abrilhantou a festa, mas não era a Gazela. A musculatura não gerava o arranque em fúria para o gol, o desmarque rápido, aquele frio na barriga da torcida. Optou pela saída discreta e foi goleador na Ásia antes de parar, em 97. Há 25 anos tem moradia em Salvador, com mulher e três filhos. É onde seu coração pulsa mais feliz.
Matéria publicada na edição impressa do jornal Correio do dia 4 de
fevereiro de 2011
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