Vestir a camisa rubro-negra, sair de carro ou pegar o ônibus a caminho do Barradão, apoiar o Vitória durante os 90 minutos e voltar para casa. Um ritual simples, que pode ser resumido em poucas linhas, mas que se passa em horas desgastantes e tem afastado o torcedor do estádio. Chegar ao Manoel Barradas, bem como ir embora, em dia de jogo, tornou-se um verdadeiro sofrimento para os rubro-negros. Por isso, o
iBahia Esportes resolveu aprofundar a discussão sobre as dificuldades de acesso à casa do Leão. Na última quarta-feira (22), por exemplo, apenas 88 torcedores compraram ingresso para ver Vitória x Coritiba, pela Copa Sul-Americana. O público de 3.254 pagantes só foi possível graças aos sócios do programa Sou Mais Vitória e dos ingressos promocionais da campanha em parceria com uma rede de postos de gasolina. Além do horário - jogo começou 21h50 -, times reservas em campo, preço do ingresso e falta de transporte público contribuíram para o número pequeno.
Média em 2012 foi de 16.192 |
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Cinco dos dez melhores públicos da segunda divisão do ano passado foram do Vitória, que terminou o torneio com a melhor média da competição. |
Porém, antes mesmo da partida de quarta, a ausência do torcedor virou motivo de reclamação do presidente Alexi Portela, do técnico Caio Júnior e também do meia Renato Cajá, já que a campanha do time no Brasileirão é boa. Mas até que ponto o torcedor pode ser cobrado? Melhorias nas vias de acesso, mais linhas de ônibus, ações de marketing e redução no preço dos ingressos são algumas das sugestões para estimular o torcedor a encarar as dificuldades e passar a torcer das arquibancadas habitualmente, como na Série B do ano passado. "Primeiro, eu prefiro não cobrar. Valorizo aqueles que se associam, que vão aos jogos", opina Carlos Falcão, vice-presidente do Vitória, para depois justificar a necessidade de ter uma torcida cada vez mais presente. "É importante saber que o clube vive de receitas e que a associação e bilheteria juntas são importantes receitas do clube. Gira em torno de 10% a 15% do nosso total de receitas. Existe um círculo: mais bilheteria, mais investimento, melhores resultados. Não existe caso de sucesso se não tiver envolvimento da torcida com o clube".
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Associação e bilheteria: "10% a 15% das receitas do Vitória" |
Falta de acessibilidade - O problema é que o torcedor pensa duas vezes antes de ir ao Barradão em jogos de grande apelo. Por exemplo, não é preciso nem vender todos os ingressos para parar o bairro de Canabrava e região. Dez mil pessoas, talvez menos, a caminho da casa do Leão são suficientes para dificultar o acesso, que é feito por vias estreitas e que, muitas vezes, não contam com o serviço adequado de organização do trânsito. Na monografia "O Impacto do Estádio Manoel Barradas na Produção do Espaço Urbano" (
veja e baixe aqui), o geógrafo Eduardo Penna destaca que "a escolha da localização do Manoel Barradas aconteceu simplesmente pela disponibilidade de aquisição do terreno. O local nunca foi planejado para receber um contingente tão grande de pessoas. Algumas obras foram feitas, de forma paliativa, ao longo dos anos para tentar amenizar os problemas. Porém, nenhuma foi capaz de sanar as dificuldades, uma vez que essas são decorrentes da configuração espacial da localidade".
Setoristas criticam - "Tem muitos buracos, falta transporte público e basicamente só se chega de carro. É terrível. O Barradão sempre foi de difícil acesso. É uma cobrança, às vezes, descabida, uma perseguição com o torcedor. Ano passado a média foi de 16 mil e teve jogo de lotou começando às 19h30", pontua Andre Hiltner, que cobre o dia a dia do Vitória pela rádio CBN Salvador.
Leia também Obras e sugestões: Via Expressa, ações de marketing e redução do preço Paulo Carneiro fala em pressão para Vitória mudar de casa; dirigente nega Veja rotas para chegar ao estádio Manoel Barradas Angelo Paz, que é setorista do Vitória do jornal Correio*, concorda e ressalta que os problemas não são novos. "É difícil chegar ao estádio, já faz dez ou 15 anos. É um problema crônico, seja para quem vai do Centro ou da Região Metropolitana de Salvador para o estádio. O que ajuda, muitas vezes, é o transporte clandestino, que o torcedor se espreme para entrar. Na hora de voltar, ele reza para encontrar ônibus e retornar para casa. Para quem vai de carro, dependendo do público, demora duas horas para sair. E não adianta cobrar se não tiver ônibus, domingo é complicado e nos jogos de semana à noite é pior ainda". Torcedor do Vitória e membro do site Arena Rubro-negra, Marcello Góis entende que o acesso sempre será uma barreira. "O jogador, o dirigente, tem razão porque o time precisa da torcida. Se o time quer evoluir, precisa do torcedor, mas eu respeito quem não vai. Eu pegava muito no pé dos meus amigos torcedores que não iam, mas vai quem pode. Tem gente que estuda, trabalha, tem a dificuldade de transporte, nem todo mundo pode ter o plano de sócio".
Transalvador - Vice-presidente, Falcão cobra dos órgãos públicos mais atenção ao clube. "Há ações de operação que seriam fáceis de ser implantados pela prefeitura. Imploramos por um ordenamento de trânsito melhor. Repare como o poder público tratava os jogos do Bahia em Pituaçu. Fechavam viaduto, mudavam o tráfego na Avenida Pinto de Aguiar, tinha policiamento ostensivo. No Barradão temos três vias de acesso, mas a má vontade é muito grande. Uma ação de mobilidade que envolveria mão única nas vias que dão acesso ao Barradão na chegada e com inversão na saída resolveria boa parte do problema. Isso acontece em todo lugar do mundo". Em contato com a reportagem, a assessoria de comunicação da Transalvador informou que o órgão monitora todos os eventos da cidade e relatou limitações viárias para desafogar o trânsito na região do Barradão. Além disso, o serviço de organização do trânsito para eventos como uma partida de futebol é pago e o preço varia de acordo com a quantidade de pessoas atraídas. O órgão, no entanto, não soube informar se havia pagamento dessa taxa quando o Bahia mandava seus jogos em Pituaçu, mas destacou que as operações são distintas, uma vez que o local onde está situado o estádio público oferece mais alternativas à população.
Tabela de taxas para serviço de quatro horas |
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Operação e monitoração de trânsito em eventos com até 1.000 pessoas. R$ 697,18 Operação e monitoração de trânsito em eventos acima de 1.001 até 5.000 pessoas R$ 1.662,98 Operação e monitoração de trânsito em eventos acima de 5.001 até 10.000 pessoas. R$ 2.794,61 Operação e monitoração de trânsito em eventos acima de 10.001 até 20.000 pessoas R$ 5.589,20 Operação e monitoração de trânsito em eventos acima de 20.001 até 30.000 pessoas R$ 8.383,81 Operação e monitoração de trânsito em eventos acima de 30.001 até 40.000 pessoas R$ 11.178,40 Operação e monitoração de trânsito em eventos acima de 40.001 até 50.000 pessoas R$ 13.973,01 Operação e monitoração de trânsito em eventos acima de 50.001 pessoas R$ 20.959,51 *Os preços para operação e monitoramento de trânsito para eventos estão especificados para a duração de 04 (quatro) horas. Em caso de evento com tempo superior será calculado proporcional ao acréscimo. |
Falcão admitiu desconhecer o pagamento por uma operação mais efetiva da Transalvador, mas criticou a cobrança pelo serviço. "Você veja que absurdo. O clube paga diversos impostos e ainda tem que pagar por uma coisa que é obrigação. O clube é uma entidade sem fins lucrativos. O jogo é diferente de um show. Em nehum momento fomos procurados e acho que isso não deve se aplicar a uma entidade como um clube de futebol. As coisas não podem ser assim", reclamou, para depois completar. "Não havia transporte público no último jogo, contra o Coritiba, para os torcedores irem embora. Como você pode viabilizar o clube? O clube paga impostos, mas falta segurança, iluminação...".
Média no Brasileirão - Nono colocado no Brasileirão 2013, com 22 pontos, o Vitória cai algumas posições no ranking de público do torneio. Com média 11.600, o Rubro-negro aparece com o 14º melhor número da Série A. O curioso é que o vice-líder Botafogo tem média de 9.421 torcedores no estádio, enquanto o lanterna Náutico leva 15.794 torcedores por jogo, ocupando a 16ª e a 7ª colocação, respectivamente, no ranking. Os dois times citados, inclusive, têm atuado em novas arenas, que aumentaram o público, a renda e o lucro dos clubes no Brasileirão, no comparativo com os dados do ano passado. O próximo jogo do Leão em casa é contra o Criciúma, domingo (1º), às 16h.