Usar a expressão "gênio" para adjetivar alguém que faz algo impressionante é comum na linguagem informal do dia a dia. Em Salvador, o pequeno Breno Rezende, de apenas 3 anos, assustou os pais ao se interessar pelo alfabeto russo e foi identificado como uma criança com Altas Habilidades/ Superdotação.
O menino, que possui um QI de 130, agora faz parte da Mensa Brasil, filial brasileira da mais antiga e renomada sociedade de alto QI do mundo. Tanto superdotado quanto gênio são termos comumente associados a pessoas com o QI acima da média, mas, essas palavras realmente significam a mesma coisa?
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Segundo o Ministério da Educação (MEC), os termos Altas Habilidades/Superdotação (AH/SD) são utilizados para qualificar pessoas com habilidades cognitivas superiores quando comparadas com seus pares. Entretanto, Patrícia Schneider, neuropsicopedagoga e especialista em identificar essa condição neuroatípica, afirma, em entrevista ao iBahia, que existe muito senso comum na intepretação desses dois termos e alerta para a diferença entre eles.
"A gente identifica a condição neurodiversa [e] as pessoas esperam que a criança saia voando, recitando poesia ou resolvendo questões matemáticas que ninguém resolveu, mas [a superdotação] é, na verdade, uma facilidade para aprender. Gênio é outra coisa", pontua ela, que já trabalha no ramo há 20 anos, especialmente, com o público infantil.
Segundo a especialista, a não identificação dessas pessoas pode levar a uma série de problemas relacionados à saúde mental. "Eu costumo falar que é a história do Patinho Feio. Geralmente, são crianças que chegam com a autoestima muito baixa, com situações de bullyng escolar, muitas vezes com quadros de estresse, quando são adultos já [possuem] um histórico de tentativa de suicídio", afirma Patrícia.
Diferença entre os termos
Normalmente, os superdotados possuem dificuldade para se adaptar nos ambientes mais agitados e mais sensíveis, por isso precisam de um ambiente educacional adequado à sua forma de pensar. Entretanto, a superdotação é ainda pouco estudada no Brasil, o que dificulta a identificação dessas pessoas, tanto por especialistas, quanto pelos pais.
"Essas pessoas têm necessidades educacionais especiais não pelas dificuldades que possuem, mas porque são mais 'famintos' (pela busca do conhecimento)", diz Patrícia. Todo esse potencial não significa, imediatamente, que a pessoa superdotada fará algo inédito no mundo.
A ideia de gênio como algo isolado se confunde com o termo superdotado, o que também não é positivo para a pessoa identificada com essa condição neuroatípica. "Superdotados podem se tornar gênios, a depender do ambiente. Eu já atendi crianças superdotadas com 7 anos e que tem interesse em estudar física quântica, mas que não sabem andar de bicicleta. É um mito achar que essa criança já sabe tudo, de que não precisa de ajuda", diz a especialista.
A tentativa de suprimir o comportamento dessas pessoas, que tendem a ser mais agitadas e emotivas, pode levar a uma série de outras dificuldades. Problemas na escola, hiper sensibilidade e mal comportamento são aspectos que podem começar a acontecer, quando se fala de uma criança. Por isso, a neuropsicopedagoga alerta para a necessidade de buscar entender a condição da criança.
"As pessoas ficam apertando o 'botão' errado achando que eles funcionam de uma forma, mas as coisas acontecem de outro jeito", enfatiza Patrícia.
A identificação
Cerca de 5% da população do mundo é superdotada, mas identificar esse público é um grande problema em países como o Brasil, por exemplo, onde o tema ainda não é muito explorado. Apesar disso, esse grupo de pessoas já é legalmente amparado pela Lei Brasileira de Inclusão e possui uma série de direitos educacionais garantidos.
Segundo diretrizes do MEC, a identificação de alguém com a condição de Altas Habilidades/Superdotação deve ser justificada mediante avaliação pedagógica. Caso seja necessário, uma avaliação psicológica, neuropsicológica, ou ainda, avaliação biopsicossocial pode ser feita. Em uma instituição de ensino, uma equipe interdisciplinar deve ser a responsável pela identificação.
A partir disso, o aluno passa a ter o direito a um Plano de Desenvolvimento Individual e Escolar (PDIE), garantido pelo MEC por meio da Lei Brasileira de Inclusão e amparado por leis federais e estaduais.
O documento deve incluir frequência, envolvimento do estudante nas atividades propostas, provimento de serviços, recursos e estratégias para sua educação, desenvolvimento curricular, registro de progressos e necessidades educacionais, trajetória escolar e outros registros pertinentes.
Além disso, o PDIE deve ser conhecido pela equipe técnica da escola, pelo próprio estudante e assinado por sua família. A aceleração de estudos faz parte dos direitos do superdotado e está prevista na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
Segundo Patrícia, esse processo é fundamental, pois é através dele que essas pessoas terão o potencial desenvolvido. "Todo superdotado pode produzir algo genial, mas [isso] não nasce pronto. Esse é um dos grandes mitos. Superdotados tem muita facilidade de aprendizado, por isso precisam ser identificados para serem estimulados", finaliza ela.
Iamany Santos
Iamany Santos
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