A família de Mãe Bernadete rejeitou o resultado das investigações sobre a morte da líder quilombola. Essa foi a primeira declaração dada depois que o inquérito foi divulgado nesta quinta-feira (16).
Em entrevista à TV Bahia, o filho da ialorixá, Wellington Pacifico, disse que não acredita na versão apresentada pela polícia, defendida pelo Ministério Público da Bahia (MPBA) e acolhida pela Justiça.
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"Usarei até uma metáfora: o fechamento do inquérito ficou igual uma moqueca sem azeite. Porque apresentou cinco nomes, determinou que foi isso, mas cadê os mandantes?", disse.
Para Wellington, os cinco suspeitos de tráfico de drogas denunciados pelo assassinato de Mãe Bernadete são apenas executores do crime. O filho de Mãe Bernadete acredita que eles foram contratados para a ação.
"Continuo na minha versão de que o tráfico participou da execução de Mãe Bernadete, ele foi pago para fazer isso. Eu não acredito na versão da polícia".
No final da tarde desta quinta, Wellington, o sobrinho que testemunhou o crime e os advogados da família estiveram no Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), no bairro da Pituba, onde o caso foi investigado, para tentar acesso a uma cópia do inquérito.
"Nós precisamos ter acesso a essas informações. Vamos levar isso para São Paulo, nos debruçar sobre isso. Mas, de qualquer maneira, nós não podemos tomar nenhum passo sem acesso às investigações", disse o advogado Hédio Silva Jr.
O objetivo da defesa é que os peritos contratados pela família revisem os dados coletados pela polícia ao longo dos três meses de apuração do crime.
"Nós temos os nossos próprios peritos. A família contratou peritos particulares, para revisar todo o trabalho que foi feito. Apenas para confirmar o que foi feito. Essas informações também serão importantes para que a gente possa pensar no campo cível", pontuou.
Investigação
A dinâmica do crime foi detalhada na manhã desta quinta-feira (16) pela Polícia Civil durante coletiva na sede do Ministério Público da Bahia, no Centro Administrativo da Bahia (CAB). O caso aconteceu no dia 17 de agosto deste ano, no Quilombo Pitanga dos Palmares, que era liderado pela ialorixá, em Simões Filho, na Região Metropolitana de Salvador (RMS).
Conforme a delegada geral Eloisa Brito, dos cinco homens que participaram diretamente do homicídio, dois foram mandantes, dois executores e um informante - todos vinculados a uma facção criminosa responsável pelo tráfico de drogas na região.
Um sexto homem foi indiciado em um inquérito separado por ter recebido as armas após o crime e ajudado a fuga de um dos executores. Ele não está incluído nessa ação penal que foi aceita pela Justiça.
O inquérito policial foi finalizado após três meses de investigação. A morte da ialorixá teria sido motivada por sua defesa veemente do território. Dias antes de ser executada, Mãe Bernadete se posicionou publicamente contra a construção de um bar na região do colombo, espaço que, segundo a polícia, seria utilizado pelos criminosos como ponto de comercialização de drogas.
“Na investigação ficou claro e inequívoco que Mãe Bernadete morreu porque lutava contra o tráfico de drogas na região onde ela morava. Ela tinha uma legitimidade popular muito grande. Seus conselhos, orientações eram ouvidas pela comunidade. Isso está fartamente comprovado na investigação através de depoimentos de testemunhas, da extração de áudios de telefones apreendidos, interceptações telefônicas”, afirmou Luis Neto, coordenador do Grupo Especial de Combate às Organizações Criminosas e Investigações Criminais (Gaeco-BA), que participou das investigações.
Foram denunciados à Justiça pelo homicídio Arielson da Conceição Santos, 24 anos; Josevan Dionísio dos Santos, 26; Marílio dos Santos, 34; Ydney Carlos dos Santos de Jesus, 28; e Sérgio Ferreira de Jesus, 45. Eles irão responder pelos crimes de homicídio triplamente qualificado, por motivo torpe e recurso que impossibilita a defesa da vítima.
No dia do crime, conforme relata o inquérito, Arielson e Josevan, a mando de Marílio e Ydney, chegaram a pé na residência de mãe Bernadete. Informações sobre a rotina da vítima e a melhor forma de adentrar a residência foram passadas por Sérgio, que conhecia Mãe Bernadete. Na residência, a vítima estava acompanhada de três netos, dois deles menores. Mãe Bernadete foi executada na sala de casa com 25 tiros.
O sexto envolvido, identificado como Carlos Guionai, foi denunciado por porte ilegal de arma de fogo e por auxiliar na fuga de um dos executores. Guionai foi responsável por receber as duas pistolas após o crime e por conduzir a fuga de Arielson da Conceição até a cidade de Araças, no interior da Bahia, onde foi preso no dia 1º de setembro.
Dos seis envolvidos, três estão presos - Arielson da Conceição, Sérgio Ferreira e Carlos Guiodai. Os demais estão foragidos.
Áudios de celulares ajudaram a polícia
Áudios trocados pelos criminosos em aplicativos de mensagem ajudaram a polícia a detalhar a motivação do crime. Ouça aqui:
“Fiquei sabendo no quilombo que Bernadete falou que no dia da festa vai cercar tudo de polícia, vai pegar todo mundo aí. Ela está mandando um carro preto aí cheio de polícia para tirar foto das barracas. Ela disse que vai dar risada quando tiver todo mundo na cadeia. Fica ligado aí. Avisa a Café [Ydney Carlos]. Fica ligado no carro preto aí. Vai pegar todo mundo na moita", diz Sérgio a uma pessoa próxima aos líderes de facção apontados como mandantes do crime.
Após o crime, Sérgio, que tinha uma bar na área do quilombo e convivia com Mãe Bernadete, enviou outra mensagem aos comparsas. A orientação era para que retirassem o chip dos aparelhos celulares para evitar que fossem rastreados. Ouça aqui:
Mãe Bernadete fazia parte do Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) do Governo Federal. A sede do quilombo Pitanga dos Palmares, onde ela vivia, era monitorada por sete câmeras de segurança. No dia do crime, apenas quatro estavam funcionando.
Alan Oliveira
Alan Oliveira
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