“Um, dois, três, depois desse a gente passa”. A frase é da vendedora Sandra dos Santos, 22 anos. Ela e a amiga, Cíntia Moraes, 23, tentavam atravessar a Avenida Vasco da Gama, nas imediações do posto Petrobras, na sexta-feira passada. Apesar de o semáforo estar a cerca de 80 m do local, elas optaram por fazer a travessia em uma região sem faixa de pedestre, nem passarela. Esse tipo de comportamento é apontado pela gerente de educação para o trânsito da Transalvador, Mirian Bastos, como um dos responsáveis pela estatística que coloca a Avenida Vasco da Gama como a líder em número de vítimas de atropelamentos — foram 14 casos somente este ano e outros 61 no ano passado, quase o dobro da segunda colocada, a Avenida ACM, que teve 33 ocorrências em 2013 (veja tabela abaixo). Segundo o levantamento da Transalvador, a segunda colocada em 2014 é novamente a avenida ACM (11 vítimas), seguida pela Octávio Mangabeira (8 vítimas), Paralela e Bonocô (ambas com 7).
Segundo Mirian, muitos acidentes poderiam ser evitados se o pedestre obedecesse às regras de sinalização. “A desobediência à legislação, tanto por parte de condutores, pela falta de atenção e diversos comportamentos, quanto do pedestre, por não atravessar em segurança, é responsável pela maior incidência de atropelamentos”, explicou. Ela acredita que o elevado número de estabelecimentos comerciais na Avenida Vasco da Gama faça com que seja grande o número de pessoas circulando pela via. Isso, associado à falta de atenção e ao desrespeito às normas de segurança, contribui para a avenida estar na liderança. “A região é um polo gerador de tráfego, alimenta outras vias, mas já está sendo objeto de estudo nesse momento”, garantiu. Quem circula com frequência na área confirma as estatísticas. “Passo por aqui todos os dias e é sempre a mesma dificuldade para atravessar. O motorista não dá preferência e não tem passarela, a gente passa como pode”, afirmou a gerente de vendas Georgina Bethânia. Imprudência Na sexta-feira, o CORREIO passou pela Avenida Vasco da Gama e encontrou pessoas atravessando a rua correndo, com crianças, idosos e carregando bagagem. O empresário Carlos Damasceno, 37, empurrava um carrinho com quatro galões de água. Esperou, olhou de lado, esperou mais um pouco e, então, atravessou, às pressas. “Eu sei que o semáforo não está muito distante, mas estou com pressa. Aqui é mais rápido, apesar de ser mais imprudente”, afirmou entre risos. Enquanto isso, na beirada do passeio, o ambulante Jinoel Miranda equilibrava uma bacia de amendoim sobre a cabeça, um balde e um saco em cada uma das mãos. Primeiro, ele pôs o pé direito no asfalto, mas teve que retirar ligeiro para não ser esmagado pela roda de um táxi. Tentou novamente, mas teve que recuar mais uma vez. “O peso atrapalha, eu sei, mas os motoristas também não ajudam. Ninguém dá preferência. O único jeito de passar sem ser atropelado é passar correndo”, disse, e se lançou na avenida. Por sorte, chegou ileso do outro lado da pista. Motoristas também reclamaram dos pedestres. “Existem semáforos na avenida, faixas e até passarelas. Eles precisam respeitar os espaços”, afirmou a psicóloga Juliana Moura. Estrutura Há quem, porém, reclame da estrutura do local e do planejamento. Para o comerciante Joilson Borges, 37, que trabalha há cinco anos na Lucaia, a sinalização não ajuda muito. A banca de frutas dele fica no canteiro do cruzamento entre as avenidas Vasco da Gama, Juracy Magalhães e Garibaldi e ele disse já ter visto os mais variados acidentes envolvendo motoristas e pedestres. “Os semáforos ficam distantes dos pontos de ônibus e as pessoas se arriscam atravessando na pista. Acidentes sempre acontecem, principalmente na via expressa para ônibus”, contou. Apesar dos cinco semáforos e das duas passarelas que existem na avenida, muitos pedestres preferem se arriscar atravessando na rua. A estudante Ariane Lopes, 13, contou que minutos antes de ser entrevistada pela reportagem uma amiga quase foi atropelada perto da Perini, na Avenida Vasco da Gama. “Ela estava atravessando por baixo do viaduto quando veio um carro. Foi por pouco”, contou. No canteiro central da Avenida Vasco da Gama funcionam ainda praças e equipamentos de ginástica, o que contribui para o aumento de pedestres atravessando entre as vias. Para os moradores da região, pintar mais faixas e construir mais passarelas seriam as alternativas para resolver o problema. A gerente da Transalvador, Mirian Bastos, explicou que esse tipo de alteração não pode ser feita da noite para o dia. “Para se colocar os equipamentos, é preciso um estudo de impacto do local. Cada local é analisado pela engenharia de tráfego, é feito um estudo da topografia, impacto de vizinhança, tem todo um planejamento”, disse. Ela acredita que a orientação e a educação entre motoristas e pedestres ainda seja a melhor solução. Vítimas Na última terça-feira, a aposentada Julieta Barreto dos Santos, 71, morreu ao tentar atravessar a Avenida Bonocô. Apesar de a passarela estar a poucos metros de distância, ela escolheu por fazer a travessia pela pista, foi atingida por um carro e morreu no local. A cena, que chocou quem passava pela região, é comum nas avenidas mais movimentadas da cidade. No ano passado, foram 246 vítimas de atropelamento (uma morte a cada 1,5 dia), enquanto em 2012 esse número foi de 387 pessoas (mais de uma morte por dia). Paralela reduz atropelamentos, mas lidera mortes Campeã em atropelamentos em 2012, com 68 vítimas, a Avenida Paralela reduziu em um terço o número em 2013 (22), caindo para 4º lugar, e continua nessa posição este ano. A gerente de educação para o trânsito da Transalvador, Mirian Bastos, acredita que foi a educação que ajudou na redução das ocorrências. “Investimos muito em engenharia de tráfego e sinalização, mas também em campanha educativa que está sendo feita nas universidades e escolas que ficam na Paralela. Isso tem gerado resultados”, disse. Segundo ela, a campanha será ampliada também para as instituições que ficam na Avenida Vasco da Gama. Apesar da redução no número de vítimas, a Paralela continua sendo a campeã em mortes, foram duas este ano e outras oito no ano passado. As escolas e universidades interessadas em participar do projeto podem procurar a Transalvador. A inscrição é gratuita e as palestras não geram custo para a instituição. Os interessados podem entrar em contato com a Transalvador através do telefone (71) 2109-3663. Meta do Brasil é reduzir número de acidentes em até 50% Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), os acidentes de trânsito ferem, em média, de 20 a 50 milhões de pessoas em todo o mundo, todos os anos. A Organização lançou em 2011 um plano de ação global para ajudar na redução de acidentes, em meio ao que considerou a Década de Ação pelo Trânsito Seguro. De acordo com a Transalvador, cada país tem a meta de reduzir em até 50% o número de acidentes de trânsito, através de campanhas educativas e fiscalização. Para alguns pedestres, no entanto, a educação exigida no trânsito precisar vir de casa. “Para atravessar a pista, por exemplo, eu sempre uso a passarela, em qualquer situação, e sempre ensinei meu neto a fazer o mesmo. A pista é muito perigosa, não vale a pena arriscar a vida”, afirmou a doméstica Maria Teresa Roque, 50, ao lado do neto Reinam Hora, 6. “É preciso dar o exemplo”, finalizou. Matéria original do Correio Avenida Vasco da Gama lidera ranking de atropelamentos desde ano passado
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