Temendo represálias, três famílias de suspeitos mortos em uma ação das Rondas Especiais (Rondesp) na Vila Moisés, bairro do Cabula, deixaram o local. Ao todo, cinco das 12 pessoas mortas na operação da Polícia Militar, que completa um mês amanhã, viviam na comunidade. Segundo moradores, as famílias fugiram após incursões policiais se tornarem quase que diárias. As fontes contam que, em algumas situações, casas foram arrombadas e homens com fardas da PM circulavam com máscaras brucutus. Ao todo, 16 suspeitos de planejar um assalto foram baleados. Dos quatro que sobreviveram, dois estão sob custódia, internados no Hospital do Subúrbio, um foi preso após ter alta médica e um adolescente de 15 anos, também após deixar o hospital, foi ouvido e liberado. A família deste menor seria a quarta a ter se mudado após as mortes, também por supostas ameaças. Na ação de 6 de fevereiro, um PM levou um tiro de raspão no rosto. Ação De acordo com a polícia, a operação começou quando homens da Rondesp Central avistaram uma Saveiro branca e um grupo de seis suspeitos com mochilas, próximo à agência da Caixa, na Estrada das Barreiras. Um aviso havia sido emitido pelo Serviço de Inteligência da corporação, no dia anterior, dando conta que uma quadrilha se preparava para fazer um ataque na região. Por isso, o veículo suspeito foi denunciado à Central de Polícia. Ao chegar no local, a Rondesp foi recebida a tiros e iniciou a incursão. No entanto, moradores e parentes dos mortos negam esta versão, dizendo que os suspeitos foram executados.
O Correio* esteve na Vila Moisés, na manhã da quarta-feira (4), e verificou que a casa da avó de Caíque Bastos dos Santos, 16 anos, abandonou a residência. A idosa morava no segundo andar de um imóvel sem reboco. “Três dias depois (da ação), ela deixou tudo para trás e saiu com medo porque os policiais haviam invadido algumas casas”, relatou um morador. Depois que a avó de Caíque saiu, numa outra ação da PM, a casa teria sido revirada. Às pressas saiu também a mãe de Óclinho, o único suspeito que foi recolhido na Vila Moisés – os demais baleados foram levados para o Hospital Roberto Santos, onde 11 faleceram. A mãe dele residia na Vila Dois Irmãos, localidade dentro da Vila Moisés. “A casa está vazia”, garantiu uma moradora.Outra que encontramos fechada foi a de parentes de Ricardo Vilas Boas Silva, 27. “Não há mais ninguém aí. Todos foram embora essa semana”, contou um rapaz, atribuindo às incursões recentes da PM. “Na sexta-feira, foi a vez da Polícia Civil tocar o terror aqui. Também entraram em algumas casas”, informou. Alguns moradores disseram que apenas o adolescente que sobreviveu não tinha envolvimento com a criminalidade. “Mas isso não era motivo para tanta barbárie. Com exceção do rapazinho, não havia nenhum inocente, mas por que não os prenderam?”, questionou um morador.Segundo ele, a ação ocorreu quando um grupo de rapazes estava reunido num beco, onde funcionava uma boca de fumo, situada a poucos metros de uma praça. “Era a diversão da comunidade (a praça). Agora, todo mundo vive trancafiado”, comenta uma senhora. Olheiro Era pouco mais de meia-noite quando a turma que estava reunida no beco foi informada de que guarnições da PM desciam pela Rua Major Vitorino Palma. “Daí, todos correram em direção à área de terreno batido, onde normalmente se escondiam quando a polícia chegava”, relatou um morador.Durante a fuga, o bando foi informado por Natanael de Jesus Costa, 17, apontado como olheiro e morto na ação, de que o caminho estava livre para o grupo do outro lado da vila. O que os demais não sabiam era que Natanael já tinha sido abordado pelos policiais na Rua Fernando Pedreira, quando ia comprar pizza para a namorada, e foi obrigado a mentir.“Quando a turma chegou no terreno, cerca de 30 policiais saíram do matagal”, relata o morador. Ainda segundo a fonte, todos estavam com as mãos na cabeça e apenas dois foram encontrados com um revólver durante a revista. “Uma parte foi obrigada a ficar de joelhos. Em seguida, começaram a atirar. Alguns clamavam pelos parentes. Dava para ouvir os choros, suplicando para não morrerem”, disse.ResistenteAvó de Natanael, com quem morava, a costureira Marina Lima Oliveira, 58, enxugava as lágrimas com a camisa da farda escolar do neto, ontem. “Que ele fosse ladrão, traficante. Prendesse, mas não fizessem aquela barbaridade com ele. Quebraram as pernas e um dos braços, meu Deus”, condenou dona Marina, que não pretende sair da Vila Moisés.“Já tiraram a minha razão de viver. Se quiserem me matar, não vou fugir”, desabafou. O restante da vila, no entanto, vive dias de medo: além das ações da polícia, ouviram dizer que traficantes da Mata Escura planejam invadir e dominar o tráfico no local.
Parentes das vítimas no enterro realizado no Cemitério Quinta dos Lázaros, no dia 8 de fevereiro |
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