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SALVADOR

CORREIO flagra morte de homem eletrocutado

Gerador explode e ambulante que estava próximo corre, mas tropeça na corda da própria barraca e cai sobre o fio

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25/05/2012 às 9:52 • Atualizada em 27/08/2022 às 22:56 - há XX semanas
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O ambulante Nelson Santana de Souza, 41 anos, morava com a mulher, Rosimeire dos Santos, 35, e os dois filhos, no Loteamento Vila Pedrita, em Itinga, Lauro de Freitas. Ele acordava todos os dias à 1h para preparar os lanches que venderia em sua barraquinha na Estrada do Coco. Às 5h, deixava Rosimeire em frente ao Shopping Litoral Norte, onde também vendia doces e salgados. Em seguida, Nelson voltava em casa, pegava mais coxinhas, pastéis, pãezinhos, bolos e seguia para o Shopping Passeio Norte, onde às 7h fazia da moto uma barraca itinerante. Às 20h, era a hora de desmontar e ir para casa. Apesar da vida sofrida, Nelson juntava dinheiro para um objetivo: comprar um carro para facilitar o trabalho. Nelson e Rosimeire frequentavam a Igreja Universal no bairro. Ontem, em mais um dia de batente, por volta das 8h30, Nelson atendeu à ligação de Rosimeire. Como de costume, ela queria saber se ele havia chegado bem. Após trocar palavras de carinho, o casal de despediu. Rosimeire orgulhava-se da luta do marido, que conheceu há 9 anos vendendo lanches em Itinga. Natural de Elísio Medrado, a 240 km de Salvador, Nelson planejava no fim do ano ver os parentes. Para isso, além de separar o dinheiro para o carro, juntava economias de bicos. Quando havia alguma festa na região, lá estava ele e só saía do local após vender tudo.
Acidente na Estrada do Coco derruba poste e fio cai sobre gerador. Após explosão, ambulante que estava próximo corre, mas tropeça na corda da própria barraca e cai sobre o fio, recebendo descarga de 11.400 volts, e morre.
Conhecido como “Irmão”, era bem querido pelos funcionários do Shopping Passeio Norte, seus clientes. Pouco após as 9h, pediu ajuda para comprar o carro ao mototaxista Sandro dos Santos, 32, seu vizinho. “Ele pediu para tirar o carro no meu nome”, contou o amigo. Mas às 10h, os sonhos de Nelson chegaram ao fim.
À esquerda, o repórter Bruno Wendel e à direita, Evandro Veiga. Equipe do CORREIO flagrou tudo
‘Vê-lo morrer ali me matava’Bruno Wendel é repórter há 7 anos e há 6 trabalha no CORREIO. Não deseja o que viveu ontem a nenhum colega de profissão. Quinta-feira, 23 de maio. Falastrão do jeito que sou, retornava calado de Lauro de Freitas para o jornal, na Federação. No trajeto de aproximadamente 30 quilômetros, o silêncio foi quebrado pelo motorista do CORREIO Jasson Azevedo. “Você está bem?”, indaga. “Os traços do rosto daquele homem se desfazendo na minha frente, como uma vela derretida, tão cedo não sairá de minha cabeça”, respondo, cabisbaixo. Nesses sete anos de jornalismo policial, nunca tinha visto nada igual. Nada se compara aos muitos corpos fuzilados, mutilados, decompostos que já relatei. Nada foi tão chocante como o fim trágico do trabalhador Nelson Santana de Souza. Era ambulante, pai de dois filhos, religioso e casado, mas antes de tudo era um ser humano. A sensação de vê-lo morrer ali e não poder fazer nada, absolutamente nada, me matava por dentro. Foram dez minutos de aflição. Ainda assim, mesmo sabendo que não poderíamos ajudá-lo, o desejo de puxá-lo dali atormentava a minha mente e a do fotógrafo Evandro Veiga. Era uma vontade insana, porém motivada pela sensação de impotência. Quando vi o ambulante arrastar-se no chão por centímetros, para mim, apesar de remota, era um fio de esperança de um homem que agonizava sobre uma descarga elétrica de 11.400 volts. Mas, a morte era iminente. Ele levantou o rosto por três vezes, como se implorasse por ajuda. O rosto já estava desfigurado. Difícil não se emocionar com o desespero de outras pessoas que, assim como eu, torciam pela vida. Foi um homem que tentou amarrar uma corda nos pés do ambulante para retirá-lo do local, motoristas que tentaram em vão apagar as chamas do corpo com extintores dos carros. Uma mulher ajoelhou e pediu em voz alta que Deus poupasse a vida do ambulante. Ser um dos personagens desta história não é fácil. Nós, jornalistas, estamos habituados a contar situações, e não nos envolver nelas. Lembro de uma ocasião em que tive que dar a notícia a uma mãe de que a filha tinha sido assassinada. Aquilo me marcou muito e acreditava que seria minha experiência mais marcante. E aí você se questiona: como não se envolver? Imparcialidade? Nessas horas? Não se comover ao ponto de colocar sua vida em risco? ‘Eu o vi olhando para meus olhos’Evandro Veiga é repórter fotográfico há 17 anos e está no CORREIO há nove. Preferiria fotografar paisagens. Toda vez que clicava na câmera me sentia muito mal. Cada foto que fazia sentia uma dor no meu peito. Vi ele morrendo aos poucos, olhando para os meus olhos. Acho que se eu tivesse visto meus filhos de manhã teria ido pra cima dele e tentado puxá-lo de alguma maneira. Quando vi que o fio estava muito forte, parei e pensei em meus filhos. Cheguei tão perto do corpo... Tentei salvá-lo. Gritei! Gritei! Olhava para ele e gritava: “Vem, vem”. Me deu vontade de meter a mão, de puxar. Parei quando veio na minha mente a imagem dos meus filhos e refleti: ‘Posso ficar aqui e morrer junto. Ainda tenho dois filhos para criar’. Eu ia morrer como herói, mas eu quero ver meus filhos crescerem. Estava do outro lado da rua fazendo uma matéria sobre um incêndio que tinha acontecido durante a madrugada na loja Insinuante quando ouvi um barulho grande. Era um fogo azul. Parecia a cor de um céu de brigadeiro. Quando me aproximei, alguém gritou: “Cuidado que vai explodir, tem gasolina no gerador”. Atravessei a rua, vi o vulto dele correndo. Quando cheguei perto vi o homem se tremendo no chão. Parti pra cima dele. Olhei fiz a foto e comecei a gritar por Bruno para chamar o socorro. Uma das imagens mais horríveis da minha vida foi olhar para ele com o sangue caindo pela boca sem poder fazer nada. Naquele exato momento eu fui até a imagem, mas eu sabia que não podia fazer nada. Sentia a descarga forte no chão e pedia para as pessoas se afastarem. Fotografei por instinto, sem pensar. Disse: “Pai, eu vou pra cima. Vou tirar ele”. Mas teve um barulho, uma forte explosão. Me deu medo quando lembrei da imagem do sorriso de Eric, meu filho, como se ele tivesse me chamando para não ir. Recuei e continuei a fotografar. Depois pensei que espécie de ser humano sou eu de ver alguém da minha espécie morrer na minha frente sem poder fazer nada. Como fotógrafo, nos 17 anos de profissão, sempre quis fotografar uma guerra, registrar cenas fortes. Mas, nunca imaginei que poderia acontecer algo igual a isso na frente dos meus olhos. Ontem, quando sai de casa abençoei meus filhos e pedi a Deus um bom dia. Eu sei que tive um bom dia por um motivo: tentei salvá-lo, mas vi que não podia fazer nada.

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