O cheiro de esgoto do córrego que passa pela Rua Oliveira, no Retiro, não impediu moradores da região de entrar nele para conseguir alcançar a única água a que eles têm acesso há seis dias — na verdade, um vazamento que jorrava de uma tubulação rompida.
O cheiro de esgoto do córrego que passa pela Rua Oliveira, no Retiro, não impediu moradores da região de entrar nele para conseguir alcançar a única água a que eles têm acesso há seis dias — na verdade, um vazamento que jorrava de uma tubulação rompida. Veja nota da CCR sobre a falta de água na cidade De onde vem essa tubulação e se a água é potável, ninguém soube dizer. Mas é tempo de escassez na terceira maior cidade do país. “Cozinho com essa água. Para mim, a água é limpa. Não senti nenhum gosto estranho. Só fervo para poder tomar banho”, afirmou a dona de casa Maria Elza, 43 anos. Grávida de 9 meses, Alessandra Carvalho Santana, 16 anos, não pode nem pensar em ficar sem água, por isso vai ao local duas vezes por dia para lavar a roupa do enxoval. Para ela, gerou consequências. “Tomei banho com essa água e comecei a sentir coceira. Minha avó está com dores na barriga”, contou. Muitos moradores dessa região chegaram em seu limite ontem e, à tarde, fecharam a BR-324 no sentido Salvador. “Os carros-pipa não estão chegando até aqui, por isso fechamos a pista. A única forma que temos de conseguir água é pegando dessas tubulações que nem sabemos de onde vem”, reconheceu o comerciante Genivaldo Santos da Purificação, de 31 anos. Guerra A falta de abastecimento de água há seis dias na terceira maior cidade do país virou guerra. Além da batalha pela água no Retiro e do fogo na BR, o Exército esteve ontem na rua, estabelecimentos foram fechados, crianças ficaram sem aula e uma população inteira está de sentinela para ir pra cima de qualquer sinal de água. Enquanto isso, a Embasa, empresa ligada ao governo estadual, enviou nota estimando para hoje “a retomada do abastecimento, de forma gradativa”. A cidade está com o abastecimento comprometido desde quarta-feira, quando um acidente nas obras do metrô realizadas pelo Grupo CCR rompeu uma adutora na altura da Jaqueira do Carneiro. Carros-pipa Ontem pela manhã, no Uruguai, uma multidão enfileirada debaixo de um sol escaldante com baldes, tonéis, bacias e galões esperava impaciente pela chegada de carros-pipa do Exército. Além dos soldados, vinham viaturas da PM com homens da Rondesp fortemente armados. Tudo para evitar que o desespero acabasse em confusão, como aconteceu em alguns locais no fim de semana. Segundo o Comando da 6ª Região Militar, dez carros-pipa, com capacidade de 12 mil litros cada, foram usados para transportar água. A água é fornecida pelo 3ª Grupamento de Bombeiros Militar, do Iguatemi. A cozinheira Tatiane Vieira, de 36 anos, levou o que pôde. “Desde quarta-feira passada que a gente sofre e eu não tenho mais condições de comprar água. Um garrafão (de 20 litros) está custando até R$ 50”, afirma Tatiane, que mora com mais cinco pessoas. Morador da Ribeira, que também recebeu caminhões do Exército, Pedro Nascimento, representante da ONG Comissão Brasileira de Direitos Humanos (Cobradh), contou que, nos últimos três dias, gastou mais comprando água do que paga na conta no final do mês. “De sexta pra cá, já gastei R$ 50 de água. A conta geralmente dá R$ 40”, disse. Pela tarde, um tumulto na Cesta do Povo do Caminho de Areia deixou o registro de água do estabelecimento quebrado. Segundo informações da PM, a população do bairro buscava água para encher baldes no local. No Retiro, próximo ao local onde a população fechou a BR, houve quem buscasse água de uma tubulação rompida embaixo de um viaduto. Alguns levaram xampu e sabonete e tomaram banho ali mesmo. O presidente da Embasa, Rogério Cedraz, pediu que a população tenha cuidado. “A gente sabe que é muito difícil ficar sem água, mas é preciso tomar cuidado com essa água”, disse. Aulas No Cabula, a falta de água atingiu parte da Universidade do Estado da Bahia (Uneb). Dois dos quatro pavilhões ficaram sem aulas. Nos fundos do campus, que faz divisa com os bairros da Engomadeira e Saboeiro, há torneiras, onde moradores da região aproveitaram para encher recipientes e até tomar banho. A assessoria da Secretaria Municipal de Educação disse que 100 escolas foram afetadas em toda a capital pela falta de água. As unidades tiveram que ser abastecidas com carro-pipa e, por enquanto, as aulas serão mantidas. Solução De acordo com o presidente da Embasa, Rogério Cedraz, a adutora paralela que estava sendo construída seria concluída ainda na noite de ontem, quando seria iniciado o trabalho de bombeamento da água. Desde que uma adutora foi rompida, de acordo com a Embasa, 35% da população de Salvador está desabastecida. “Ainda hoje (ontem), uma parcela da cidade, principalmente aquelas em áreas mais baixas, já voltam a ter água. Ao longo da noite e no dia de amanhã (hoje), a gente vai regularizando nos demais locais”, disse. No entanto, segundo o presidente, é possível que alguns setores mais críticos ainda sofram com problema até amanhã ou quinta-feira. “Para esses, a gente vai continuar levando os caminhões-pipa”, disse. Segundo ele, há pelo menos 35 caminhões sendo utilizados para distribuir água na cidade. Eles são abastecidos nas estações da Bolandeira e de Candeias, mesmos locais que a Embasa utiliza para abastecer a cidade. O Ministério Público disse ter enviado um ofício à empresa solicitando detalhes sobre o acidente, como causas, interrupções e soluções apresentadas. Segundo Cedraz, técnicos da própria Embasa farão uma investigação sobre o acidente, depois de solucionado o problema do abastecimento. “Toda a equipe da Embasa e da CCR, nesses últimos dias, tem trabalhado quase 24 horas na resolução do problema”, declarou. Colaborou o repórter Gil Santos. Prefeito cobra solução e Embasa pede ‘desculpas’ Ontem, no sexto dia sem abastecimento de água em parte de Salvador, o prefeito da capital, ACM Neto (DEM), cobrou da Embasa e da CCR Metrô Bahia uma solução rápida para a crise, e se solidarizou com a população. Carros-pipa que prestam serviço à prefeitura foram colocados à disposição. “Fatalidades podem acontecer, mas, depois de cinco dias, é inadmissível que a CCR e a Embasa não tenham tido capacidade para produzir uma solução”, queixou-se. Segundo o prefeito, a população da cidade tem “toda razão” em estar revoltada com a falta de água. Segundo nota, a Embasa tem sido cobrada permanentemente pela prefeitura “pela baixa qualidade dos serviços prestados à cidade”. O presidente da Embasa, Rogério Cedraz, pediu desculpas à população. “Uma grande estrutura foi montada para que a gente pudesse conseguir uma solução. A gente pede desculpas à população, porque sabe que cinco dias sem água é bastante complicado, mas o problema que nós tivemos foi muito complexo, porque envolvia até riscos”, disse.
Moradores do Arraial do Retiro entram em córrego fétido para alcançar tubo com vazamento e pegar água |
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