Na semana em que o Dia do Circo é celebrado, uma polêmica gira em torno do único referencial circense presente na Bahia. Fundada em 1985, a Escola Picolino de Arte de Circo, que há 25 anos desenvolve projetos com crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social, vem enfrentando um sério problema. Após 14 anos sitiada no bairro de Pituaçu, a Picolino será transferida para um novo local. O motivo? A revitalização da orla marítima de Salvador. A escola está entre o grupo de estabelecimentos que serão desapropriados quando a reforma começar. Anselmo Serrat, fundador do espaço contou, com exclusividade, os problemas que o circo vem passando desde o ultimato da prefeitura, em 2009.
Instrutor Binho e parte da sua turma matinal, no Picolino “Em setembro do ano passado veio um carro da prefeitura aqui no circo, me levou ao gabinete de um secretário e lá eu fui informado de que eles estariam mudando o circo em um mês. Aí eu falei que ia ter guerra, né?”, relatou o fundador, que não sabe quando ocorrerá a mudança. Ainda segundo ele, o espaço onde é localizado o circo Picolino foi fruto de uma invasão que ocorreu há 14 anos. “Nós estamos enfrentando um processo de usucapião que pode sair a qualquer momento. Temos isso a nosso favor, sabemos que temos direitos”, contou. Na gestão do ex-prefeito Imbassahy, que aconteceu entre os anos de 97 a 04, a situação da Picolino foi regularizada, com a liberação de um alvará. Com cerca de 130 crianças participando diariamente de atividades e 17 instrutores, Anselmo se encontra de mãos atadas perante a situação. “De uns tempos pra cá a prefeitura cercou a gente. Nós estamos proibidos de realizar eventos, de fazer qualquer coisa aqui, a não ser funcionar como escola de circo, e apresentar espetáculo infantil”, contou o fundador, que ainda completou; “eles fazem isso porque sabem que não nos dá retorno financeiro algum”. Os espetáculos apresentados nos fins de semana eram uma das fontes de renda da escola de arte, que atende, em sua maioria, crianças de ruas. Com a falta de verba e sem previsão de transferência, o administrador não pode investir em infra-estrutura e equipamentos para o melhoramento das atividades realizadas. “A gente deixa de investir aqui porque esse investimento é coisa de quatro a cinco mil reais, que hoje não temos. Do que adianta investir esse dinheiro pra daqui a uma ou duas semanas eles transferirem”, desabafou. A futura sede do Picolino será no Parque da Cidade Joventino Silva, localizado no bairro do Itaigara e a Superintendência de Controle e Ordenamento do Uso do Solo (Sucom) é a uma das responsáveis pelo processo de mudança. “A Sucom está intermediando a mudança do circo para outro local. O responsável pelo circo está aguardando o projeto, que está sendo elaborado pela Fundação Mário Leal Ferreira”, afirmou o superintendente Cláudio Silva. A reportagem do iBahia tentou entrar em contato com Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano, Habitação e Meio Ambiente (Sedham) - responsável pela Fundação Mário Leal Ferreira, para saber o andamento do projeto, mas não obteve sucesso. Segundo a assessoria de comunicação da Sedham, o secretário Antônio Eduardo dos Santos não está se manifestando sobre esse assunto. Ainda segundo a assessora Ana Lúcia Andrade, a única informação que pode ser adiantada é que nenhum projeto está sendo elaborado para o Picolino. “A situação é a seguinte: o responsável pelo projeto, o arquiteto Antônio Brito, está em fase de estudo preliminar. Só a partir deste estudo que ele pode começar a desenvolver o projeto do novo espaço do circo”, informou.
Anselmo Serrat, fundador do Circo Picolino De acordo com a Sucom, o circo deve ser desmontado e transferido para o novo local antes do próximo verão. Segundo Anselmo, um funcionário da prefeitura entrou em contato com ele no dia 18 de março com novas informações. “Me ligaram avisando que o prefeito João Henrique havia dado um prazo a Sedham para que uma resposta definitiva fosse dada ao circo até o dia 26 de março desse ano”, relatou o fundador, que fez questão de completar: “A gente não tem intenção de criar problema. O novo espaço é nobre e muito legal. O que eles estão propondo de estrutura também tá legal, vão dar a mesma estrutura de atendimento que nós temos aqui, mas com tecnologia nova, material novo, tudo novo”, conta Anselmo, esperançoso. Mesmo com poucos recursos e sem nunca ter obtido apoio governamental, a Picolino também realiza o trabalho de alfabetizar menores carentes. “Nós temos vários ex- meninos de rua que hoje estão fazendo faculdade, dão aulas de circo. Esse é o nosso dever; levar uma criança dessa para a universidade. Essa é a nossa missão, a nossa história e o nosso papel”, contou o administrador. Sem a transferência imediata, o circo, que comemora 25 anos de existência em setembro deste ano, se sustenta apenas de esperança. “Hoje a equipe que trabalha comigo são pessoas que acreditam. Um mês podem receber salário, outro mês não. São praticamente voluntários”, finalizou Anselmo.