Por Marcus Eduardo de Oliveira*
O processo de industrialização da economia mundial, que cresceu de forma exponencial nos últimos 70 anos, acompanhado do crescimento populacional, permitiu um aumento substancial no consumo de produtos, exigindo, como contrapartida, uso intensivo de recursos da natureza, desencadeando, na ponta final, geração de lixo e poluição.
Os números que realçam esse crescimento são ilustrativos: em 1950, a economia mundial ostentava um PIB global de US$ 4,5 trilhões, com 2,7 bilhões de habitantes; hoje, o PIB mundial atinge US$ 75 trilhões, e a população mundial bate na marca dos 7,2 bilhões de pessoas. Se houvesse uma divisão igual da riqueza global, cada habitante do planeta teria direito a US$ 10,5 mil.
O destaque dessa ostentação do crescimento do produto interno bruto (PIB) mundial fica por conta da China que, com uma população de 1,4 bilhão de habitantes – 19,5% dos habitantes do planeta, 14 milhões de nascimentos a cada ano - deverá “fechar” o ano de 2014 com US$ 17,6 trilhões de PIB, tornando-se a maior economia do mundo, mensurado pelo critério da paridade do poder de compra (PPP, na sigla em inglês), levando-se em conta a estrutura relativa de preços e custos de cada país.
Esses dados permitem uma rápida discussão em torno da problemática do consumo excessivo em relação ao meio ambiente. Inseridos numa sociedade de consumo, tipicamente consumista (16% dos mais ricos da população mundial consomem 78% de toda a produção global), onde se produz e se compra de tudo, não raras vezes deixamos de atentar ao fato de que a produção de mercadorias requer tempo, energia e recursos naturais, além de gerar de poluição.
Não por acaso, todo esse crescimento econômico chinês – nos últimos 30 anos a média de crescimento foi de 9% ao ano - vem acompanhado da maior concentração de poluição que o planeta já presenciou, o que reflete nos dados divulgados pela Organização Mundial de Saúde (OMS), apontando que das vinte cidades mais poluídas do planeta, dezesseis delas são chinesas.
O crescimento econômico chinês “convive” de perto com um drama: mais de 750 000 pessoas morrem por ano em decorrência da água e do ar pútridos no país. As fábricas movidas a carvão criaram vilarejos doentes, nos quais a taxa de tumores malignos é altíssima.
Por tudo isso, é importante realçar aquilo que não se pode perder de vista: quanto mais se aumenta a escala de produção econômica, mais o meio ambiente é agredido pelo uso excessivo de recursos naturais; quanto maior a economia, menor fica o meio ambiente em termos de capacidade de reposição de recursos.
Em outras palavras, quando a atividade econômica se apropria da natureza, entrega como produto final a insustentabilidade do planeta (desequilíbrio climático, poluição, aquecimento global), afinal, todo e qualquer processo produtivo requer uso das bases e dos serviços da natureza.
A poluição e o descarte de produtos são, por consequência, os efeitos da ponta final do excessivo processo produtivo. A atividade econômica necessita de recursos, matéria e energia. É a natureza, portanto, quem “alimenta” a atividade econômica.
É dessa relação desequilibrada e conflituosa que emerge a crise ambiental, visto que o uso dos recursos naturais ultrapassa (estamos usando 30% a mais do limite suportável do planeta) a capacidade que o planeta tem de provê-los.
Entre 1950 e 2005, por exemplo, a produção de metais cresceu seis vezes, a de petróleo, oito, e o consumo de gás natural, 14 vezes. Hoje, são extraídas 60 bilhões de toneladas de recursos anualmente – cerca de 50% a mais do que há apenas 30 anos. Na média, o europeu usa 43 quilos de recursos diariamente, e o estadunidense, 88 quilos. Atualmente, o mundo extrai de recursos naturais o equivalente a 112 edifícios Empire State (102 andares, 381 metros) da Terra a cada dia.
Especialmente o consumo de automóveis tem sido, com ligeira queda, a marca principal do consumo mundial. Somente em 2013, a China vendeu mais de 19 milhões de carros, seguido pelos EUA, com 15,5 milhões; Japão, com 5 milhões e o Brasil, quarto maior vendedor, com 3,5 milhões de unidades.
A relação produção de mercadorias e uso de água, por exemplo, é alarmante: para cada automóvel fabricado, usam-se 400 mil litros de água; um único hambúrguer de 100 gramas exige 2.400 litros de água; uma pizza, 1.216 litros, uma simples xícara de café requer 140 litros; um par de sapatos, 8.547 litros. Não se deve perder de vista que água e energia se relacionam. Consumir energia implica também em consumir água.
Para cada calça jeans que compramos, além dos 11 mil litros de água necessários à fabricação, usa-se de 10 a 20 metros quadrados de cultivo de algodão. Para o cultivo desse algodão, foi preciso o uso de uma grande quantidade de fertilizantes químicos e pesticidas, o que levou à contaminação de solo, água e ar.
O que a história nos evidencia é que o último século de produção econômica foi marcado por uma economia de acumulação que, como bem disse Dominique Voynet, ex-ministra do Meio Ambiente francês no governo de Lionel Jospin, “não se baseia no capital do planeta, mas em seu estoque”.
O resultado disso é que somos constantemente “engolidos” pelo consumo. Victor Hugo, célebre escritor francês, vislumbrou muito bem isso: “Por força de querer possuir, nós nos tornamos possuídos”.
* Marcus Eduardo de Oliveira é economista e professor de economia da FAC-Fito e do Unifieo, em São Paulo.
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