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[Artigo] Abundância material não produz bem estar

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28/10/2014 às 10:17 • Atualizada em 01/09/2022 às 20:40 - há XX semanas
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Por Marcus Eduardo de Oliveira (*)

A abundância material das sociedades contemporâneas nem de longe produz o bem-estar que dela se poderia esperar. É também por isso que há uma ideia convincente, defendida pelas mais elevadas vozes da Economia Ecológica, em torno de que países que chegaram a certo nível de prosperidade e bem-estar devem renunciar de maneira explícita as políticas de crescimento.

A ideia de crescimento incessante da produção e do consumo choca-se contra os limites que os ecossistemas impõem à expansão do aparato produtivo, assevera Ricardo Abramavoy, em “Muito Além da Economia Verde”. Portanto, querer assegurar melhoria da qualidade de vida aos mais necessitados, a partir da expansão material, consubstanciada em elevadas taxas de crescimento da economia, é incorrer em grave erro.

É oportuno destacar, nesse pormenor, que o crescimento econômico não é uma fórmula universal para se chegar ao bem-estar. O crescimento deve, assim, ser visto como um meio, não como uma finalidade. Isso é facilmente identificado como um dos erros mais comuns cometidos ainda hoje pela miopia da política econômica do crescimento que, a qualquer custo, deseja associar, em especial, a elevação da renda à obtenção automática daquilo que se convenciona chamar de “bem-estar”.

Não raro, pensam alguns que, basta promover a elevação da renda per capita, para que o bem-estar então seja rapidamente alcançado, e, com isso, se atinja a tal almejada felicidade. É a conquista do “paraíso”, por esse prisma, sendo facilitada para quem tem mais condições financeiras e mais possibilidades de consumo, abarcando uma quantidade maior de bens materiais.

Qualidade de vida, como o próprio termo sugere não se refere à quantidade, mas, sim, a qualidade.

Que a elevação da renda é benéfica, disso pouca gente deve duvidar; porém, esse “benefício” vai só até certo ponto; até o ponto exato em que se consegue assegurar a conquista das necessidades básicas.

Passado esse ponto, crescer (economicamente) causa sintomaticamente à sociedade mais “custos” (ecológicos) que “benefícios” (socioeconômicos). Dizem os mais antigos, em associação a isso, que o molho acaba saindo bem mais caro que o peixe.
Ora, toda vez em que há exagerado crescimento econômico, pouco tempo depois cresce também, por consequência, a necessidade por parte do poder público em “eliminar” (ou atenuar) os focos (na verdade, os malefícios) causados por esse crescimento expansivo.

Talvez o excesso de trânsito, tão comum nas grandes cidades mundiais (no mundo, hoje, circulam mais de um bilhão de veículos leves e pesados, sem incluir as motocicletas) e os mais terríveis focos de poluição (um milhão e meio de pessoas perdem suas vidas, todos os anos, ao redor do mundo, em decorrência da poluição) sejam, de perto, os exemplos mais ilustrativos e as faces mais dramáticas desse episódio.

Ademais, não há como negar uma evidência: mais crescimento econômico significa mais dissabores sociais, gerando, na ponta final, menos (e não mais) bem-estar. Dito de outra forma: mais economia (produção e consumo) leva a menos meio ambiente (exaustão acentuada de recursos naturais) ocasionando mais poluição (resíduo do processo produtivo, degradação entrópica) que, por sua vez, resulta em menos vidas preservadas.

É perfeitamente possível alcançar bem-estar sem se empaturrar na abundância material.

Em “Os Limites do Possível”, André Lara Resende aponta que “mais renda nem sempre significa mais bem-estar”. Mais renda e mais crescimento econômico “deságuam”, conjuntamente, numa situação incômoda de não se conseguir, por exemplo, ajustar esse excesso de “mais mercadorias” num mundo que vem dando claros sinais, por anos a fio, que está excessivamente entulhado de todo e qualquer tipo de mercadorias.

Por isso Lara Resende vaticina com bastante propriedade que “há um efeito deletério do crescimento econômico sobre a qualidade de vida”.

Qualidade de vida, como o próprio termo sugere não se refere à quantidade, mas, sim, a qualidade. Há uma diferença acintosa entre quantidade e qualidade, assim como há diferenças conceituais entre crescimento (quantidade) e desenvolvimento (qualidade). E, para obter qualidade, não é preciso aumentar o rendimento mensal.

Logo, qualidade de vida (dito, desenvolvimento econômico) não passa pela condição financeira e nem pela expansão da atividade econômica (crescimento). É perfeitamente possível fazer com que uma economia se desenvolva sem necessariamente passar pelo crescimento econômico. É perfeitamente possível se chegar à qualidade de vida sem crescimento da atividade econômica. É perfeitamente possível alcançar bem-estar sem se empaturrar na abundância material.

(*) Economista e professor de economia da FAC-FITO e do UNIFIEO (São Paulo). Especialista em Política Internacional pela (FESP) e mestre pela (USP).

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