O bem-estar e o florescimento da vida humana e não-humana na Terra têm valor em si mesmos
Foto: Dirk Mathesius/visitBerlin/Flickr/(cc)
Por Marcus Eduardo de Oliveira*
A constatação de que a busca pelo bem-estar humano - quando envidada pelo bom uso dos fundamentos macroeconômicos - é antagônica e ameaçadora à própria ideia de sustentabilidade, pode ser claramente percebida pela “tensão” provocada pela atividade econômica sobre o mundo natural, principalmente a partir das condições impostas para se alcançar mais crescimento econômico.
Por sua vez, isso reafirma e expõe, a olhos nus, a fragilidade da relação existente entre a ecologia e a economia, clamando por um novo tipo de atividade econômica voltada ao equilíbrio do meio ambiente, e não somente aos “caprichos” mercadológicos.
De igual modo, percebe-se essa fragilidade quando nos damos conta de que qualquer ação humana ocorre no âmbito dos limites do Planeta. Daí a importância conferida a um novo tipo de economia – urgente e necessária - que seja capaz de combinar moderada produção com rigoroso respeito aos limites biofísicos.
A utilidade – termo caro aos economistas – do mundo não pode estar acima da preocupação maior que é salvaguardar as condições de equilíbrio da Terra. Por isso um dos mais importantes princípios elementares do Movimento Ecologia Profunda é justamente o de que o bem-estar e o florescimento da vida humana e não-humana na Terra têm valor em si mesmos (valor intrínseco, valor inerente), sendo que esses valores são independentes da utilidade do mundo não-humano aos propósitos humanos.
Todavia, não há como escapar de determinadas assertivas: o modo de crescimento das economias, principalmente na era do industrialismo, tem sido a causa mais relevante de distúrbios ao meio ambiente.
Assim, o ônus ambiental ora presenciado em diversas frentes é sintomaticamente gerado pelo crescimento econômico. Acrescido a isso, duas outras constatações contribuem, sobremaneira, para o acirramento das atuais condições doentias do Planeta: a dimensão quantitativa populacional, com estimativas de que, em 2050, 9,5 bilhões de pessoas estarão habitando um único Planeta e o não menos doentio modo consumista da humanidade, em que os 20% mais ricos “abocanham” quase 80% de toda a produção material do planeta.
Tomando o modo american way of life como paradigma, outra assertiva, dentro dessa perspectiva, não pode ser desconsiderada: se toda a humanidade, excetuando obviamente os 4,5% da população de norte-americanos, tivesse o mesmo padrão de vida e consumo médio desse contingente populacional, a existência de três outros planetas Terras ainda não seria suficiente para o atendimento do consumo humano.
Logo, para se chegar à fórmula ideal que combine bem-estar, associando isso à qualidade de vida, com equilíbrio das condições climáticas, notadamente a partir da prática da sustentabilidade, é preciso que todos, sem exceção, aprendamos a lidar com desafios inerentes ao processo que sejam capazes de enfrentar dilemas como:
•A contradição entre expansionismo produtivista e sustentabilidade;
•Atenuação dos conflitos e emergências sociais legitimamente reclamada pelos menos favorecidos com os imperativos da conservação/preservação ambiental;
•Conscientização de que todos estamos e participamos da mesma espaçonave Terra, numa alusão direta à ideia metafórica defendida por Kenneth Boulding.
O pano de fundo disso tudo, ademais, está na imprescindível necessidade de troca do “crescimento” (quantidade) por “desenvolvimento” (qualidade), deixando bem clara a noção existente de incompatibilidade entre a expansão física das economias com a preservação ambiental.
Junto a isso, também se faz necessário resgatar a noção de que o bem-estar está amparado no âmbito do desenvolvimento econômico, e não no do crescimento, assim como a própria sustentabilidade, analogamente, não combina com o expansionismo econômico, com a aceleração do ciclo de negócios ou ainda com a capacidade de produção industrial sem limites que, conjuntamente, levam à apropriação desmesurada dos recursos da natureza, acarretando menos, e não mais bem-estar às populações.
Concernente a isso, é oportuno não perder de vista que a ocorrência de qualquer tipo de crescimento – especialmente da economia, da população, do consumo – tende mais a retirar qualidade de vida dos povos, exatamente porque, nesse caso, limites serão inexoravelmente transpostos.
O outro nome adequado para explicar a condição de “limites transpostos” é “destruição de recursos”. Para ilustrar isso, cabe mencionar o discurso do presidente Roosevelt feito em 1909 no Senado dos EUA: “com o crescimento constante da população e o aumento ainda mais rápido do consumo, nosso povo teria necessidade de maiores quantidades de recursos naturais [...]. Se nós, desta geração, destruirmos os recursos que são necessários a nossos filhos, se nós reduzimos a capacidade de nossa terra de manter uma população, nós diminuiremos o nível de vida e nós retiraremos até o direito à vida das gerações futuras neste continente”.
Por essas e outras, não há como negar a evidência de que o modelo de crescimento econômico praticado pelas nações após a Segunda Guerra Mundial se converteu numa espécie de agente de quebra do equilíbrio ecológico, acarretando, em termos econômicos, péssima distribuição dos recursos, e, em termos sociais, esfacelamento do bem-estar aos menos favorecidos.
*Marcus Eduardo de Oliveira é economista e ativista ambiental. [email protected]
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