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Estádio de Pituaçu, em Salvador, é o primeiro da AL dotado de energia solar Foto: Manu Dias/Secom-BA |
A adoção de práticas consideradas sustentáveis é uma das condições da Fifa (Federação Internacional de Futebol) para que um determinado país venha a sediar uma Copa do Mundo. Como o Mundial de 2014 é no Brasil, as 12 cidades-sede do país precisam entrar nesse jogo, e uma das alternativas nesse sentido é adotar a energia solar nos estádios que abrigarão as partidas. O projeto que mais se destaca atualmente atende pelo nome de Estádios Solares, iniciativa idealizada pelo Instituto Ideal, sediado em Florianópolis (SC), com apoio da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e Cooperação Alemã para o Desenvolvimento (GIZ no Brasil e KfW). “Neste ano, em que o Brasil sedia a conferência Rio+20 com a grande tônica da sustentabilidade, esta tecnologia limpa e renovável de geração abre novas possibilidades para as edificações, especialmente nos estádios de futebol, a grande paixão dos brasileiros”, comemorou Mauro Passos, presidente do Instituto Ideal. Atualmente, dois estádios-sede já confirmaram adesão ao projeto Estádios Solares: Mineirão e Maracanã. Enquanto as obras dessas duas construções seguem em andamento (a arena de Minas deve estar pronta em dezembro e a do Rio até o primeiro semestre de 2013), ele já é realidade no estádio Roberto Santos (Metropolitano de Pituaçu), em Salvador (BA), primeiro da América Latina a aderir à energia solar como fonte energética. O Pituaçu será utilizado para treinos de seleções durante a Copa.
Pituaçu Solar A inauguração do sistema solar no estádio de Pituaçu foi feita no dia 10 de abril. Com a utilização dessa energia alternativa, o governo do Estado da Bahia estima economizar cerca de R$120 mil/ano. A energia solar gerada e interligada à rede de distribuição será equivalente a 630 MW/h ao ano, capaz de abastecer 525 residências. O projeto custou mais de R$ 5,5 milhões, dos quais R$ 3,8 milhões aplicados pela Coelba (concessionária local), por meio de financiamento da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e R$ 1,75 milhão pelo governo estadual. “Quando ocorreu a tragédia da Fonte Nova [em 2007, parte da arquibancada desabou e sete pessoas morreram] nós sabíamos que não haveria mais jogos lá por um bom tempo, e que as partidas seriam levadas para o estádio de Pituaçu. Como precisávamos de um projeto modelo para os jogos da Copa, conseguimos, com a ajuda da Coelba e do governo estadual implantá-lo”, explicou Passos.
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Mauro Passos, presidente do Instituto Ideal, destacou a importância da energia solar Foto: Divulgação |
Segundo ele, que é engenheiro especializado em planejamento energético, o projeto Estádios Solares nasceu junto com o próprio Instituto Ideal, em 2007, mas só passou a ganhar forma depois da definição das 12 cidades-sede. “Com todos os estudos já realizados, encaminhamos o projeto para o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o apresentamos na Comissão da Copa no Congresso”, relembrou. Visitas à Alemanha e à Áustria também foram feitas para conhecimento da realidade dos estádios solares europeus. No caso do estádio de Pituaçu, uma das novidades é que o excedente de energia gerado através da geração solar (270 MW/h) será utilizado no prédio da Secretaria Estadual de Trabalho Emprego e Renda (Setre), situado no Centro Administrativo da Bahia, próximo ao equipamento esportivo - o consumo médio anual do estádio é de 360 MW/h. Isso é possível porque os sistemas fotovoltaicos estarão conectados à rede elétrica de distribuição. “Além de ser o primeiro estádio da América Latina a usar energia solar, Pituaçu também é a primeira unidade consumidora a participar do sistema de compensação, que inclui disponibilizar na rede de abastecimento toda a eletricidade excedente”, observou Daniel Sarmento, engenheiro eletricista que coordenou o projeto da Coelba, que pertence ao Grupo Neoenergia. De acordo com ele, a Aneel concedeu uma autorização especial para que a usina fotovoltaica do estádio de Pituaçu fosse inserida no sistema de compensação, pois ela já estava instalada em meados de abril, quando a agência aprovou a resolução que regulamenta o tema para empreendimentos de energia limpa de pequeno porte.
Mineirão Solar A Cemig (empresa de energia), o Governo de Minas e a concessionária Minas Arena assinaram em março o convênio para instalação do projeto de energia solar no estádio do Mineirão. A usina contará com uma potência instalada de 1,5 MW/h de potência, com produção estimada de 2.200 MW/ano de energia, o que equivale ao consumo médio de 2.000 residências. “O Mineirão é o primeiro estádio sede da Copa do Mundo 2014 a implementar esse tipo de projeto no país”, destacou Alexandre Heringer Lisboa, gestor de projetos de energias renováveis da Cemig. Ao aproveitar o espaço da cobertura do estádio para instalar os módulos fotovoltaicos de silício, a empresa de energia poderá gerar, entregar e comercializar a energia elétrica pela rede de distribuição da companhia e, parte dessa energia, poderá ser utilizada pelo consumo do estádio.
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Projeto de reforma do Mineirão, em Belo Horizonte - cobertura de concreto terá placas solares feitas de silício Foto: Divulgação |
Serão 7.000 placas de silício ocupando toda a cobertura de concreto: 10 mil metros quadrados. Estima-se que o Mineirão produzirá cerca de 80% de toda a energia elétrica que vai consumir. A expectativa é que entre 300 e 600 toneladas de dióxido de carbono (CO2) sejam reduzidas por ano, segundo estudo de viabilidade técnica e econômica, financiado pelo Banco de Fomento Alemão KfW.
Maracanã Solar Palco da grande final da Copa do Mundo, o Maracanã “não poderia ficar de fora da utilização da energia solar”, opinou Eduardo Lana, gerente de planejamento da Light. As obras feitas no estádio incluem a instalação de placas fotovoltaicas em toda a superfície que cobre as arquibancadas. Além da Light, que coordena a produção e distribuição de energia no Rio de Janeiro, o projeto também será financiado pela EDF (Eletricité de France). Juntas, elas instalarão placas sobre uma superfície de 2,5 mil metros quadrados, que serão capazes de gerar 670 mil kW/h por ano. A produção seria suficiente para abastecer 25% da energia necessária para o funcionamento do Maracanã. No entanto, como o investimento é fruto de uma parceria entre as duas empresas e o governo do Estado, elas terão direito a comercializar a energia produzida nos cinco primeiros anos, a fim de compensar os R$ 6 milhões gastos com a implantação da tecnologia.
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Palco da final da Copa, Maracanã deve ajudar a deixar a energia solar ainda mais em evidência Foto: Divulgação |
Passados os cinco anos, a eletricidade oriunda do Maracanã será propriedade do governo, mas mesmo assim pode não ser usada diretamente no estádio. “Os projetos não acabam no Maracanã. A Light ainda pretende gastar R$ 15 milhões para implantar células fotovoltaicas em outros centros esportivos do Rio de Janeiro, como o Parque Aquático Júlio de Lamare, o Maracanãzinho e o Estádio de Atletismo Célio de Barros”, pontuou Lana.
E os outros estádios? Mas se a energia solar é renovável, por que os demais estádios da Copa do Mundo ainda não decidiram adotá-la? Segundo Mauro Passos, do Instituto Ideal, todas as cidades-sede do Brasil têm potencial para instalar energia solar nos estádios, mas nem todas o farão, por diversas razões. “Tem estádio que é público, outro que é do clube ou do município, e necessariamente tem de haver uma relação de proximidade com a empresa de energia do local. Trata-se de uma pequena usina dentro da cidade, o que requer cuidados com a questão elétrica do sistema. Até porque, depois da Copa, haverá uma usina para administrar, distribuir e comercializar aquela energia”, justificou Passos.
A energia solar deverá ter um custo competitivo e passará a integrar a matriz energética brasileira em, no máximo, cinco anos, segundo projeção feita em abril pela secretaria nacional de Planejamento e Desenvolvimento Energético. De acordo com o engenheiro, tem sido mais fácil implantar o projeto por meio de governos dos Estados, porque muitas vezes eles são donos das empresas de energia ou então a concessão das mesmas é deles. “O caso do Mineirão foi o mais fácil de todos, por exemplo, porque a Cemig é do Estado e o Mineirão também. A Cemig tem o interesse de que o estádio seja ‘solarizado’, inclusive fazendo da usina um laboratório de pesquisa.”
Pernambuco, Brasília e Bahia Além do estádio de Pituaçu, Mineirão e Maracanã, também já há a informação de que a Arena Pernambuco e o Mané Garrinha (DF) terão usinas solares. No equipamento esportivo pernambucano construído pela Odebrecht e cuja concessionária de energia é o Grupo Neoenergia (que também atua na Bahia), o projeto prevê investimento de R$ 13 milhões e deve entrar em funcionamento até junho de 2013. A capacidade de geração é de 1 MW. No caso do Mané Garrincha, a cobertura do estádio poderá produzir 2,5 MW com os painéis solares. Segundo o arquiteto Vicente de Castro Mello, coautor do projeto da arena, a energia gerada pelos painéis fotovoltaicos será suficiente para atender a 50% da demanda do estádio durante os jogos e horários de pico. No restante do tempo, vai superar o consumo local e enviar a energia excedente para a rede.
Como funciona o sistema de compensaçãoOs estádios consomem mais energia solar a noite, quando é realizada boa parte dos jogos. Assim, durante o dia, a eletricidade gerada fica disponível na rede e pode ser utilizada por outros prédios. Previsto para ser concluído em dezembro de 2012, o Mané Garrincha pretende conquistar a certificação Leed Platinum, selo máximo da construção sustentável concedido pelo instituto norte-americano U.S. Green Building Council (GBC). “A energia solar vai contribuir bastante para o processo de certificação”, ressaltou Mello. O estádio de Brasília está previsto para ser concluído em dezembro de 2012. Ao ser perguntado sobre a possibilidade de a Arena Fonte Nova, em Salvador, também aderir à energia solar, Mauro Passos afirmou que acredita na viabilidade do projeto. “Eu acho que no avançar da obra da Arena Fonte Nova isso vai passar a ser discutido, porque seria esquisito Pituaçu ter e a Fonte Nova não ter”, comparou. O consórcio da Arena Fonte Nova, formado pelas construtoras Odebrecht e OAS, informou ao EcoD no dia 25 de abril que estuda atualmente a viabilidade de instalação de energia solar no empreendimento, cujo andamento da obra já se aproxima de 60% (deverá estar concluída em dezembro de 2012). O Grupo Neoenergia, já responsável pela usina fotovoltaica do estádio de Pituaçu, também administraria a parte operacional das placas solares da sede de jogos de Salvador, caso haja um acordo nesse sentido.