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ANIVERSÁRIO DE SALVADOR

Gírias soteropolitanas: como o dicionário do baiano evoluiu

Muitas expressões catalogadas em livros já caíram no desuso; outras, estão surgindo graças à internet

Redação iBahia • 29/03/2022 às 6:00 • Atualizada em 26/08/2022 às 21:28 - há XX semanas

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'A Gíria Baiana', de 1973, e 'Dicionário de Baianês', de 1992 / Foto: Reprodução

Se no primeiro parágrafo desse texto algumas palavras fossem substituídas por gírias soteropolitanas, talvez nem todos conseguissem entender. Em um país quase continental como o Brasil, o regionalismo faz com que moradores de cada estado tenham diferentes sotaques e gírias. E em Salvador, o vocabulário é uma característica marcante do povo.

O assunto é tão importante que já virou tema de livro – e não apenas uma vez. Lançado em 1973, o ‘Gíria Baiana’, editado no Rio de Janeiro pela São José, é um percursor em discorrer sobre o vocabulário dos baianos. O livro de Alexandre Passos foi publicado 18 anos antes daquele que se tornou um best-seller e quase que presente obrigatório aos turistas que visitam Salvador: o “Dicionário de Baianês”.

Muitas das expressões citadas por Passos no seu livro caíram em desuso ou mudaram de significado. Por exemplo, uma resenha do livro encontrada na internet indica que a obra apresenta a palavra “candango” como apelido dos passageiros do trem que fazia a travessia entre Salvador, Belo Horizonte e Rio de Janeiro.

Azular, naquela época, significava queria dizer "desaparecer de uma hora para outra", ou seja, sumir. Atualmente, no dicionário de gírias soteropolitanas, poderia ser substituído por simplesmente “dar um zig”. Outra pérola trazida pelo livro é a gíria “das arábias”, que significa terrível.A mudança das gírias é um fenômeno completamente natural, da mesma forma que a língua portuguesa sofreu modificações ao longo da história, como explica o professor de português e mestre em Letras Rodrigo Lima.

“A compreensão de que as línguas mudam ou de que há variações linguísticas não é uma constatação particular dos cientistas, como os sociolinguistas. O próprio povo confessa, dia a dia, que ‘antigamente se dizia assim’, ‘em São Paulo, a gíria é outra’, ‘hoje os adolescentes dizem...’. Os estudos variacionistas da língua nos ensinam que o tempo, a localidade, o meio social e o contexto são alguns dos fatores que potencializam as mudanças”, diz.

Em 1992, o fluminense Nivaldo Liariú lançou o clássico “Dicionário de Baianês”. De lá para cá, ele já precisou atualizar a obra para deixar as gírias mais atuais, especialmente do Recôncavo baiano. À coluna Baianidades, do Correio, o escritor afirmou que segue anotando as novidades que ouve e as dicas que os amigos o enviam.

No entanto, o trabalho para deixar tudo em dia pode ser árduo, uma vez que agentes externos, como televisão, a internet e os espaços sociais são os principais potencializadores das gírias em nosso país, o que faz a moda da linguagem viver em constante mudança.

“Nos anos 90, por exemplo, em Salvador, uma gíria comum para um elogio era ‘boca de zero nove’, para demonstrar tranquilidade ‘cabeça de gelo’, para confirmar a compreensão ‘tá ligado(a)?’, para chamar um amigo ‘brother’, para a dúvida, o tradicional ‘talvez’ e para demonstrar que algo não promoveu riso ‘sem graça’, exemplifica o professor.

“Em 2022, usar essas expressões tentando ser jovial é ser ‘cringe’ para a geração Z. Para conceituar ‘cringe’, inclusive, preciso retomar palavras cringes como ‘brega’ e ‘cafona’. Hoje, já se ouve na gíria dos mais novos ‘barril’ para um elogio, “suave” para dizer que está tudo tranquilo, ‘sacou?’ para confirmar a compreensão, ‘cria’ como vocativo para um amigo, ‘cipá’ como sinônimo de ‘talvez’ e para algo sem graça se diz ‘paia’. Um adolescente bem ‘descolado’ - expressão que indica que eu sou da geração Y [risos] - poderia alertar um amigo: ‘Cria, cipá, aquela galera paia vai pra festa amanhã, sacou?’ E ele responderia “Suave, esquenta não, vai ser barril assim mesmo’”, completa.

Das antigas

No entanto, apesar dessa evolução, tem quem se esforce para gírias antigas não serem esquecidas. É o caso do servidor público Raphael Gouveia, que usa seu perfil no Instagram, que conta com mais de 10 mil seguidores, para divulgar – e relembrar - gírias soteropolitanas, entre outras expressões da nossa cultura.

As inspirações, segundo Raphael, vêm “das ruas, de andar por Salvador e escutar a cidade”. Em vídeos intitulados de “Rapidinha de Quinta”, o criador de conteúdo relembra gírias antigas sempre trazendo contexto e bom humor. A ideia surgiu quando ele morava em São Paulo e alguns amigos da cidade não entendiam o “baianês”.

“Eu precisava ficar explicando o que significava ‘barril, se pique, brocou, canguinhagem, gastar, xelp, pãozinho delícia’” entre tantas outras que já foram tema de meus vídeos”, contou.

Em um dos vídeos, ele explica o conceito de “gastar”, que, caso você seja adolescente e não saiba, não tem nada a ver com a origem do verbo e sim com o conceito de “perturbar” ou “chatear” alguém.

Por causa dos conteúdos, Raphael percebe que as gírias estão em constante evolução. “A galera “pós bug do milênio” tem um vocabulário bem diferente do meu que nasci nos anos 80, por exemplo. mas além dos comentários de quem não sabe o que significa (e nos meus vídeos eu já falo da gíria explicando e exemplificando) é muita massa ver os comentários da galera que ainda usa uma gíria antiga e se sente representada ou que não usava mais, mas diz que vai voltar a falar”, comentou.

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