Toda semana, os leitores desta coluna leem matérias que discutem questões relacionadas ao mercado de trabalho. Quase sempre, neste espaço, são apresentadas informações importantes sobre alguns aspectos que dão a feição desse mercado na atualidade, sem que, contudo, sejam explorados determinados elementos que permitiriam que o caro leitor tivesse um melhor entendimento sobre o que de fato venha a ser tal mercado. Diante da identificação dessa lacuna temática, objetiva-se, nesta semana, iniciar uma série de discussões com o intuito de abordar certas nuances do mercado de trabalho, de modo a esclarecer o seu real significado. Para começar a dar vazão a essa tarefa, é preciso começar dizendo que quando se olha para a economia de qualquer país nota-se a existência, em termos simplificados, de dois mercados: o de bens e serviços e o de trabalho. No primeiro, os demandantes podem adquirir na mão dos ofertantes os produtos/serviços que consideram indispensáveis, desde que “combinem” um preço que satisfaça a ambos. Já no segundo, ofertantes e demandantes transacionam uma mercadoria muito especial chamada força de trabalho, e para tanto tem que “acordar” entre si o salário que vai ser recebido/pago, respectivamente, pelos trabalhadores e empregadores. Com essa brevíssima exposição, já é possível deixar de cometer certos deslizes muito comuns quando, por exemplo, em uma roda de amigos alguém puxa uma conversa sobre a participação de um deles no mercado de trabalho. Nessas oportunidades, muito frequentemente, alguém, que é trabalhador, diz que está desempregado e que, portanto, está procurando/demandando trabalho. Em verdade, conceitualmente, uma colocação dessa natureza é um completo absurdo, pois quem tem a prerrogativa de demandar trabalho são os empregadores. Isso porque, são esses últimos que precisam contratar trabalhadores para que operem máquinas e equipamentos, de modo a produzir os bens e serviços que suas empresas colocam à disposição do mercado consumidor. Nessa perspectiva, há o entendimento, absolutamente correto, de que são os trabalhadores os detentores dessa mercadoria especialíssima conhecida como força de trabalho e de que são eles que, em função de terem que garantir as suas sobrevivências, veem-se compulsoriamente obrigados a ofertarem a aludida força de trabalho aos empregadores.
Quando essas ofertas se realizam, ou seja, encontram demandas que a correspondem, os trabalhadores passam à condição de ocupados/empregados e por conta disso auferirem um rendimento/salário. De posse dessa renda, esses trabalhadores vão às compras e adquirem os bens e serviços que são produzidos pelas empresas. Esclarecidos esses pontos, cabe também dizer que à semelhança do que se verifica no mercado de bens e serviços, se observa no mercado de trabalho o estabelecimento de uma relação de competição interna à oferta e à demanda de força de trabalho. Isso significa que ofertantes e demandantes de força de trabalho competem com outros ofertantes e demandantes de força de trabalho. Nesse contexto de competição, é importante que os indivíduos que fazem parte desses dois grupos busquem, cada um ao seu modo, a melhor forma para se tornarem exitosos. O estabelecimento dessa relação concorrencial implica a adoção de determinadas estratégias que condicionam a atuação tanto daqueles que ofertam quanto daqueles que demandam força de trabalho. Do lado da oferta, constata-se que, no mais das vezes, elas encaminham-se na tentativa de influenciar o seu tipo, volume, local e momento o mais próximo possível à demanda, e adequar o preço exigido (salário) à disposição de pagamento pelo lado da demanda. Contrariamente, como seria de esperar, uma vez que há uma relação de oposição entre os interesses da oferta e da demanda de força de trabalho, as estratégias que são levadas a cabo pelos indivíduos que compõe o lado da demanda visam, sobretudo, minimizar as expectativas especiais sobre o tipo e volume da força de trabalho demandada; e em alguns casos especiais, se for preciso, elevar o preço oferecido (salário) na tentativa que a demanda individual possa ser atendida pela oferta disponível. Nesse ponto é importante destacar que ofertantes e demandantes de força de trabalho adotam estratégias similares. Isso acontece, por exemplo, quando tentam tornar as estratégias tomadas em um lado independentes das estratégias que são assumidas pelo outro lado, procurando fontes alternativas para satisfação de suas necessidades. Do ponto de vista da oferta de força de trabalho, isso pode ser conseguido lançando-se mão de formas de trabalho autônomas. Já do lado da demanda de força de trabalho isso pode ser alcançado através da racionalização do processo produtivo. Embora exista um leque de estratégias que podem ser perseguidas tanto pela oferta quanto pela demanda de força de trabalho, a princípio tão simétrico, a observação cautelosa do mercado de trabalho revela que, na realidade, há certa tendência de prevalência das estratégias lançadas pela demanda vis a vis às da oferta de força de trabalho. Em outras palavras, o que ocorre é que no processo de oposição das estratégias da oferta e da demanda no mercado de trabalho, esta última, por razões que serão vistas em outra oportunidade, consegue se colocar em melhores condições de esgotar e realizar suas opções estratégicas. Laumar Neves de SouzaDoutor em Ciências Sociais e mestre em Economia pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Coordenador de Programa de Pós-graduação e Consultor da ValoRH. E-mail: [email protected]
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